Eis mais um teste de filosofia para o 10º ano de Filosofia em Portugal. Estou entre os professores que não cedem à vaga simplista das perguntas de escolha múltipla que os adeptos da intelectualmente pobre filosofia analítica, lobby poderoso junto do Ministério da Educação e das Editoras, conseguiram impor no modelo de exames nacionais. Ensinamos conceitos, conteúdos aos alunos e não apenas regras da lógica, ossos sem carne a revesti-los. Produzimos, suscitamos a relacionação dos conceitos, sem os complexos de «ensinar hstória da filosofia» que minam a impensante maioria dos professores de filosofia actuais.
Escola Secundária Diogo de Gouveia com 3º Ciclo, Beja
TESTE DE FILOSOFIA, 11º ANO TURMA A
30 de Novembro de 2012. Professor: Francisco Queiroz
I
«O ethos, o pathos e o logos são ingredientes do discurso retórico. A falácia ad hominem e a falácia do homem de palha não parecem recorrer à ideia da indução amplificante como o faz a falácia depois de por causa de. A tese relativista de que «o homem é a medida de todas as coisas», de Protágoras, não conduz necessariamente ao cepticismo.»
1) Explique, concretamente, este texto.
2) Relacione, justificando:
A) As quatro formas de Estado na história, segundo Hegel, e tese de que «o finito deve ser superado», em Hegel.
B) A astúcia da razão, em Hegel, e a lei dos dois aspectos da contradição.
C) Princípio do terceiro excluído e silogismo disjuntivo..
3) Disserte livremente sobre o seguinte tema:
«As diferenças entre o ser de Parménides, o ser em Hegel, e a substância, essência e acidente em Aristóteles.»
CORREÇÃO DO TESTE COTADO PARA 20 VALORES
1) O discurso retórico é uma construção linguística de bem falar mas nem sempre de bem pensar: por isso, importa distinguir entre a retórica falaciosa, enganosa, como Platão a entendia, e a retórica correcta,não falaciosa. O ethos é o carácter do orador (exemplo: «Toda a minha vida defendi a ecologia, denunciei as fábricas poluentes»), o pathos é o sentimento de paixão posto no discurso (exemplo: «Lutai! Não deixeis que vos tirem o que é vosso), o logos é a razão, o conteúdo racional do discurso (exemplo:«Em toda a coisa, está presente o uno e o múltiplo») (NOTA: ESTA FRASE VALE TRÊS VALORES). A falácia ad hominem é o erro de raciocínio que consiste em atacar pessoalmente o interlocutor em vez de atacar as suas ideias (exemplo: «Quando era jovem ele era militante da extrema-esquerda, fanático...»), a falácia do homem de palha é o vício de argumentação que consiste ao atribuir ao interlocutor posições que ele não defende (exemplo a respeito de um teórico que quer introduzir a acupunctura e a naturopatia nos hospitais públicos: «Ele quer acabar com os hospitais e a classe médica que receita químicos e faz cirurgias»). Nenhuma delas recorre à indução amplificante que é a generalização, em lei infalível, de alguns exemplos empíricos (exemplo: «Aplicamos a cura de beber água destilada em 1000 pessoas e todas melhoraram, logo beber um litro e meio ou dois de água destilada por dia melhora a saúde de todos os seres humanos»). Mas esta ideia é manejada na falácia depois de por causa de, que transforma dois fenómenos vizinhos por acidente numa «lei de causa-efeito necessária» (exemplo: «No domingo vi um gato preto e perdi 50 euros, hoje vi um gato preto e parti um farol da moto, logo ver gatos pretos dá azar». (NOTA: ESTA FRASE VALE TRÊS VALORES). O relativismo diz que a verdade e os valores variam de acordo com os homens de cada classe social, de cada sociedade, etnia, época mas isso não leva obrigatoriamente ao cepticismo, corrente que duvida de tudo ou de quase tudo (as percepções empíricas fornecem alguma verdade, no cepticismo antigo). (NOTA : ESTA FRASE VALE DOIS VALORES).
2 - A) As quatro formas de Estado, na fase do ser para si ou Deus incarnado em humanidade são, na teoria de Hegel: mundo oriental, em que só um homem é livre, o imperador, e todos são seus súbditos; mundo grego, em que só alguns homens são livres e há uma multidão de pequenos Estados com leis próprias; mundo romano, em que só alguns homens são livres e há uma lei única sobre um vasto império; mundo cristão reformado, em que todos os homens são livres, o que principiou com a revolta do monge Lutero em 1517 proclamando o direito de qualquer homem interpretar livremente a bíblia e culminou com a revolução francesa de 1789-1799 que instaurou a liberdade, a igualdade e a fraternidade. A tese de Hegel de que «o finito deve ser superado», isto é, ultrapassado, exprime-se no facto de os Estados serem finitos e se sucederem uns aos outros: o Estado Oriental despótico cessou, vieram as democracias esclavagistas gregas, etc. (VALE TRÊS VALORES).
2- B) A astúcia da razão é a manipulação das paixões e dos raciocínios dos homens de Estado feita pela razão universal (Deus) para levar a cabo o seu plano. Exemplo: como a revolução francesa de 1789 imergia no caos, a razão universal escolheu um general ambicioso, Napoleão Bonaparte, para golpear as direitas monárquicas e as esquerdas republicanas e levar a França a invadir o resto da Europa espalhando os princípios do liberalismo. A lei dos dois aspectos diz que numa contradição (em rigor: numa contrariedade) há dois aspectos, em regra desiguais, o dominante e o dominado, que podem trocar de posição. Neste caso, o aspecto dominante é a Razão Universal e o dominado os homens de estado como Napoleão ou outros mas a Razão será sempre o polo dominante (VALE TRÊS VALORES).
2- C) O princípio do terceiro excluído diz que uma qualidade ou um ente ou pertence ao grupo A ou ao grupo não A, excluindo terceira hipótese . O silogismo disjuntivo possui também uma disjunção que, em regra, não é a do terceiro excluído mas outra. Exemplo:
«Ou és filósofo de profissão ou és músico.
És músico.
Logo,não és filósofo». (VALE DOIS VALORES)
3) O ser de Parménides é uma essência una, eterna, imutável, homogénea, contínua, limitada, incriada, invisível, - simbolizada na esfera. O nascimento e a morte, as cores, o devir, são ilusões.«O ser é e o não ser não é» afirmou Parménides, rejeitando a dialética de Heráclito. «Ser e pensar são um e o mesmo» -dizia Parménides. Neste ponto, coincide com Hegel. Este, ao contrário de Parménides, apresentou o Ser em movimento formando uma tríade: tese, Ser em si ou Deus antes de criar o mundo; antítese, Ser fora de si ou Deus alienado em natureza biofísica (reinos vegetal, animal); síntese, Ser para si, ou Deus encarnado em humanidade e progredindo, através da moral, do direito, do Estado, da filosofia, em direção à liberdade de espírito, fim da . Em Aristóteles, o ser, isto é, o existir, o pertencer a algo, participa nas essências ou formas eternas - que não estão no inexistente mundo inteligível de Platão mas sim nos objectos materiais, nas substâncias, que são um composto formado da forma da espécie (eidos) e da matéria-prima universal (hyle). A substância é a essência individualizada, isto é, a essência mais os acidentes, isto é, aspectos acessórios e transitórios das coisas (exemplo: Rir e chorar são acidentes na essência do rosto humano que, em regra, se mantém sério). Logo, só em Hegel o ser sai fora de si. (A RESPOSTA VALE QUATRO VALORES: HÁ OUTRAS RESPOSTAS VÁLIDAS POSSÍVEIS).
© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
Eis um teste de filosofia para o 11º ano de escolaridade em Portugal, dado a meio do primeiro período lectivo.
Escola Secundária Diogo de Gouveia com 3º Ciclo, Beja
TESTE DE FILOSOFIA, 11º ANO TURMA A
30 de Outubro de 2012. Professor: Francisco Queiroz
I
1) Considere o seguinte silogismo:
«Alguns homens são filósofos.»
«Alguns filósofos são pensadores.»
«Os homens são pensadores.»
A) Indique, concretamente, três regras da construção formalmente válida do silogismo que foram infringidas no silogismo acima.
B) Indique o modo e a figura do silogismo. Justifique.
2) Construa o quadrado lógico das oposições à proposição «As mulheres de Moura são independentes».
3) Aplique, justificando, o princípio do terceiro excluído à tríade realismo-idealismo-fenomenologia.
4)Construa um silogismo modus ponens e um silogismo modus tollens a partir da seguinte premissa: «Se filosofar, ultrapassarei o senso comum.»
5) Distinga lógica formal de lógica informal.
6) Disserte livremente sobre o seguinte tema:
«A metafísica e a ontologia: baseiam-se em percepções empíricas, em conceitos empíricos, em raciocínios ou em intuições noéticas? Usam mais a dedução, a indução (amplificante necessitarista, probabilística) ou a analogia? Justifique.»
« CORREÇÃO DO TESTE (COTAÇÃO MÁXIMA DE 20 VALORES)»
1) A) Três regras da validade formal de um silogismo regular infringidas no silogismo são: de duas permissas particulares («Alguns») nada se pode concluir; o termo médio tem de estar tomado universalmente ao menos uma vez nas premissas( ora, o termo médio «filósofos» é sempre particular, «alguns filósofos», em ambas as premissas); a conclusão não pode ter maior extensão que as premissas ( «Todos os homens» na conclusão é um termo universal e as premissas são particulares). (NOTA: A RESPOSTA VALE TRÊS VALORES).
1) B) O modo do silogismo é a sua classificação mediante três letras (A,E, I, O), espelhando o tipo de proposição de cada premissa e da conclusão. Neste caso o modo é IIA (premissas particulares afirmativas, proposição tipo I, conclusão universal afirmativa, A). (NOTA: ESTA PARTE DA RESPOSTA VALE UM VALOR) . A figura do silogismo é a sua classificação consoante a posição do termo médio nas premissas. Há 4 figuras possíveis e a deste silogismo é PS ( Predicado, Sujeito), isto é, a quarta figura, em que o termo médio ("filósofos") é predicado na primeira premissa e sujeito na segunda. (NOTA: ESTA PARTE DA RESPOSTA VALE UM VALOR).
2) A E
I O
O quadrado lógico tem no vértice superior esquerdo a proposição «As mulheres de Moura são independentes», proposição tipo A, universal afirmativa, e no vértice superior direito a proposição «Todas as mulheres de Moura não são independentes», proposição tipo E, universal negativa. A relação entre A e E é: contrárias. No vértice inferior esquerdo está a proposição «Algumas mulheres de Moura são independentes», proposição de tipo I, particular afirmativa. No vértice inferior direito figura a proposição «Algumas mulheres de Moura não são independentes», proposição de tipo O, particular negativa. A relação entre as proposições I e O é subcontrárias. As relações de diagonal entre as proposições A e O, por um lado, e E e I, por outro lado, são (imperfeitamente) designadas por contraditórias. A proposição I é subalterna à proposição de tipo A, a proposição de tipo O é subalterna à proposição de tipo E. (NOTA: A RESPOSTA VALE DOIS VALORES)
3) O realismo ontológico, enquanto doutrina da existência de um mundo real de matéria separado das consciências humanas, opõe-se ao idealismo ontológico, enquanto doutrina de que o mundo de matéria não é mais que ideias e imagens a flutuar fora do corpo do sujeito. A fenomenologia, enquanto ontologia heideggeriana, é céptica: não apoia o realismo nem o idealismo. O princípio do terceiro excluído diz que em cada tema só há dois campos. Neste caso, a gnosiologia (por alguns chamada epistemologia) ou é realismo ou não é realismo (idealismo + fenomenologia), não havendo a terceira hipótese. (NOTA: ESTA RESPOSTA VALE QUATRO VALORES)
4) Silogismo condicional tipo modus ponens:
«Se filosofar, ultrapassarei o senso comum.»
«Filosofo.»
«Logo, ultrapasso o senso comum» . (NOTA: VALE UM VALOR)
Silogismo condicional tipo modus tollens:
«Se filosofar, ultrapassarei o senso comum»
«Não ultrapassei o senso comum.»
«Logo, não filosofei.» (NOTA: VALE UM VALOR)
5) A lógica formal é a ciência das regras abstractas do pensamento, do «esqueleto» do pensar. Usa três princípios: identidade, não contradição, terceiro excluído. A lógica informal é a ordenação do pensamento com base em percepções empíricas e conceitos empíricos ou metafísicos, isto é, o conteúdo concreto do pensamento empírico e racional, a «carne do pensar». Exemplos: «Os deuses criaram o universo», «O universo é incriado e eterno», «O Alentejo tem paisagens lindíssimas de sobreiros e azinheiras». A lógica informal engloba a lógica formal mas adiciona-lhe o alógico das intuições empíricas ou inteligíveis. (NOTA: VALE DOIS VALORES).
6) Metafísica é a região invisível e impalpável que (supostamente) está além do mundo físico, visível, audível e palpável. Ontologia é a teoria do ser, do ente (ón, em grego). Se tomarmos ontologia no sentido geral, esta é a teoria de tudo o que existe, na matéria, no raciocínio ou na imaginação, e então a metafísica, do mesmo modo que as teorias científicas, os mitos e os próprios objectos físicos se incluem na ontologia. A ontologia geral, enquanto base das ciências e do senso comum, baseia-se em percepções empíricas (Visão, audição, tacto de algo) e forma juízos (frases declarativas simples, ligando dois ou mais conceitos; exemplo: «o átomo de hidrogéneo é o mais abundante no universo») e também raciocínios (articulação lógica e inferencial de dois ou mais juízos), sendo muitos desses juízos induções amplificantes necessitaristas que generalizam a partir de alguns casos ( exemplo, da Astrologia Histórica que investigo e elaboro: em 23 de Janeiro de 1909, quando Vénus deslizou em 8º-9º do signo de Capricórnio, um sismo em Fars, no Irão, matou 7000 pessoas, em 22 de Fevereiro de 2005, com Marte a transitar os graus 10º-11º do signo de Capricórnio, um sismo abalou Kerman, no Irão, fazendo 602 mortos, em 20 de Dezembro de 2010, quando Marte transitava 8º-9º do signo de Capricórnio, eclodiu um sismo em Bam, no Irão, matando 11 pessoas, portanto, induzo que o trânsito de um planeta na área 7º-10º de Capricórnio é factor gerador de sismos no Irão e infiro que, de 26 de Novembro a 1 de Dezembro de 2012, quando Marte transitar a área 7º-10º de Capricórnio eclodirá um novo sismo no Irão).
Há também a indução probabilística, mais incerta que a necessitarista (exemplo: o dono de um restaurante serviu 35 refeições num sábado, 45 no sábado seguinte, 39 no terceiro sábado e induz poder vir a servir cerca de 40 refeições no próximo sábado). A metafísica pode usar a percepção empírica como ponto de partida (exemplo: olhar as abóbadas góticas de uma catedral é uma percepção empírica que pode levar a intuir noeticamente, isto é, através da idealização metafísica, da captação intelectual de uma essência invisível, o que será Deus ou se há deuses no alto) mas constrói raciocínios de analogia, que estabelecem semelhanças entre objectos bastante diferentes entre si ( exemplo: Deus construiu o mundo como um relojoeiro constrói um relógio) e raciocínios dedutivos, inferências que partem do geral para o particular (exemplo: «Deus ama todos os homens, logo também ama os bejenses e a mim»). (NOTA: VALE CINCO VALORES).
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