No «Compêndio em linha de Problemas de Filosofia Analítica», gerado no Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, sob a supervisão de Pedro Galvão e Ricardo Santos, lê-se como definição de fiabilismo:
«A tese central do fiabilismo é que uma crença verdadeira é conhecimento apenas se foi produzida por um mecanismo que tende a gerar crenças verdadeiras. Como tanto o processo que gera uma dada crença quanto sua propensão a produzir crenças verdadeiras podem não ser apreendidos pelo sujeito a quem se atribui o conhecimento, o fiabilismo é uma teoria externista. A principal fonte de críticas ao fiabilismo reside precisamente na desvinculação entre o que torna crenças meramente verdadeiras conhecimento e a perspectiva do sujeito. As diferentes versões do fiabilismo são diferentes respostas a esta crítica, quer pela aproximação com as ciências cognitivas e como projeto naturalista, quer pela proposição de uma epistemologia da virtude.» (Ernesto Perini-Santos).
Fiabilismo é uma definição muito vaga neste Compêndio. A definição dada acima por Ernesto Perini-Santos é uma tautologia: é crença verdadeira aquilo que resulta de um mecanismo gerador de crença verdadeira... O intuicionismo de Descartes expresso em «Eu penso logo existo» é fiabilismo? É. O fenomenismo de David Hume que reduz o conhecimento a impressões de sensação e de reflexão e a ideias é fiabilismo? É. O falibilismo de Wittgenstein ao admitir a hipótese de amanhã poder acordar não no seu quarto mas no planeta Marte é fiabilismo? É. A teoria da reencarnação e a teoria cristã de uma única vida terrena seguida de Paraíso ou Inferno como estadas da alma imortal são fiabilismo? São.
Fiabilismo é toda a concepção que comporta um certo grau de lógica e conduz a uma verdade provável ou indiscutível. E não é necessariamente externista, não precisa sempre de comprovação na realidade exterior à mente do sujeito. A metafísica é fiabilista e quase nunca precisa de provas plasmadas na realidade exterior. E, segundo Kant, a matemática, ciência assente no fiabilismo, é a priori, internista.
Fiabilismo não é uma corrente substantiva como realismo, idealismo ou fenomenologia. É uma qualidade abstracta inerente a toda a procura da verdade.
A argumentação de Ernesto Perini-Santos baseia-se em raciocínios abstractos falaciosos, formulados por Alvin Goldman, como este:
«2. Uma crença p de um sujeito S é conhecimento se foi obtida por método M tal que, através de M, (i) se p não for verdadeira, S provavelmente não acredita que p e (ii) se p for verdadeira, S provavelmente não acredita que p.»
O termo «provavelmente» retira consistência à definição de crença como conhecimento, porque tanto pode dar para um lado como para o seu contrário. As variáveis p, S, M servem apenas para dar uma aparência científica àquilo que não passa de confusas inferências típicas dos novos sofistas - os filósofos analíticos da lógica proposicional.
Vejamos com um exemplo concreto o absurdo daquela definição:
«Uma crença de Ernesto (S) de que o átomo existe (p) é conhecimento se foi obtida através do método observação pelo microscópio electrónico (M) de tal modo que através deste método de observação
1) Se a existência do átomo não for verdadeira Ernesto provavelmente não acredita nela e
2) Se a existência do átomo for verdadeira Ernesto provavelmente não acredita nela.»
Isto é um jogo de palavras sem sentido. A crença é conhecimento e em ambos os casos Ernesto provavelmente não acredita nela? Pseudo raciocínios de Alvin Goldman e dos académicos do centro de filosofia da universidade de Lisboa que o subscrevem...
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A revista Crítica (www.criticanarede.com), a propósito da Dissertação de Mestrado "Essencialismo Naturalizado, de Desidério Murcho sob a Supervisão de João Branquinho, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa,no ano 2000, de 97 páginas, insere a seguinte definição de essencialismo:
.«O essencialismo é a doutrina que defende que certos particulares, como Sócrates, têm certas
propriedades essencialmente, ao passo que têm outras propriedades apenas acidentalmente. Assim, uma doutrina essencialista poderá afirmar que Sócrates é essencialmente um ser humano, ao passo que só acidentalmente vivia em Atenas. Isto significa que Sócrates não poderia não ter sido um ser humano, ao passo que poderia não ter vivido em Atenas.» (o negrito é nosso).
Esta definição de essencialismo é, no fundo, uma tautologia. Na verdade, todos os seres ou fenómenos são dotados de uma essência ou estrutura fundamental e,assim sendo, todas as ciências e todas as filosofias seriam essencialismos a partir do momento em que postulam propriedades fundamentais inerentes a qualquer ser ou ente (a alma ou a forma física como essência do homem, o átomo como essência da matéria, a célula como essência da vida, etc). Definir desta maneira essencialismo equivale a definir racionalismo como «doutrina que sustenta que todo o homem é dotado de razão».
Ora, também os empiristas sustentam que o homem é dotado de razão...
Creio que a definição de essencialismo não pode cingir-se a uma tautologia onde cabem todas as correntes filosóficas. A história da Filosofia, tão menosprezada por alguns revisionistas do ensino filosófico hoje, coloca-nos uma distinção entre existencialismo e essencialismo.
Ora a definição de essencialismo expressa na «Crítica» e no Dicionário Oxford de Filosofia de Simon Blackburn, presumivelmente defendida por Desidério Murcho, levaria a classificar a doutrina de Sartre, expressa em «O ser e o nada», como um essencialismo: é que Sartre, que se considerava um existencialista oposto ao essencialismo, sustentava que a essência do homem é a liberdade, a existência pura. Sartre não seria, portanto, existencialista mas sim essencialista, o que levanta uma nuvem de imprecisão conceptual..
A definição por excelência de essencialismo não é a tautologia pobre expressa na «Crítica» de que há coisas com propriedades inerentes ou essenciais. Não. A definição mais rica de essencialismo remonta à coluna vertebral da história da filosofia - Platão, Aristóteles, Ockham, Tomás de Aquino, Hegel - e inscreve-se na problemática do ser enquanto essência na sua relação com a existência material e de movimento.
(Direitos de autor reservados para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
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