Eis um teste de filosofia de final de 1º período lectivo, em Beja, Portugal, onde a filosofia atingiu, no plano mundial, o mais alto grau, ao conceber por leis histórico-astronómicas a presdestinação de todas as coisas - um teste sem perguntas de escolha múltipla que, habitualmente, espelham a pobreza do pensamento de uma grande parte dos docentes e dos autores dos manuais escolares.
Agrupamento de Escolas nº1 de Beja
Escola Secundária Diogo de Gouveia com 3º Ciclo, Beja
TESTE DE FILOSOFIA, 11º ANO TURMA A
12 de Dezembro de 2014. Professor: Francisco Queiroz
I
“Algum idealismo é realismo crítico”.
“A falácia do falso dilema é realismo crítico”.
“ O idealismo não é falácia do falso dilema”.
1-A) Indique, concretamente, três regras do silogismo formalmente válido que foram infringidas na construção deste silogismo.
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1-B) Com base nas definições respectivas, mostre como ambas as premissas deste silogismo estão erradas no seu conteúdo, isto é, estão materialmente erradas.
2) Exponha os quatro passos gnoseológicos que celebrizaram Descartes a partir da dúvida hiperbólica, defina e aplique a lei da contradição principal a este conjunto.
3 ) Relacione, justificando:
A) Res cogitans em Descartes e ideia de “eu” em David Hume.
B) Ciências empírico-formais, ciências hermenêuticas, retórica e ideologia.
4) Interprete o seguinte texto e mostre dois sentidos possíveis para o termo “ser”:
« Existem miríades de sinais demonstrativos de que o Ser é, incriado, imperceptível, perfeito, imóvel e eterno, não sendo lícito afirmar que o Ser foi ou que será…. Ser e pensar é um e o mesmo.» (PARMÉNIDES).
CORRECÇÂO DO TESTE COTADO PARA UM MÁXIMO DE VINTE VALORES
1-A) Eis três regras do silogismo formalmente válido que foram violadas: o termo médio (neste caso: realismo crítico) tem de ser tomado pelo menos uma vez, universalmente; nenhum termo pode ter na conclusão maior extensão do que nas premissas, ora o termo idealismo é universal na conclusão e particular na primeira premissa (algum idealismo); de duas premissas afirmativas não se pode extrair uma conclusão negativa. (VALE DOIS VALORES).
1-B) O idealismo ontológico é a doutrina segundo a qual o mundo de matéria é um conjunto de ideias ou sensações a flutuar na mente de um ou vários sujeitos e por isso não se inclui no realismo, doutrina que diz que o mundo de matéria é real em si mesmo e exterior às mentes humanas. O realismo crítico defende que o mundo de matéria exterior é real em si mesmo mas não o percepcionamos sem deformação (exemplo: vemos uma rosa vermelha, mas o vermelho só está na nossa mente não na rosa). (VALE DOIS VALORES). O idealismo, corrente ontognoseológica, não é a falácia do falso dilema porque esta é uma disjunção lógica entre dois termos um dos quais está contido no outro, ora o ontológico não deve confundir-se com o lógico-formal ( exemplo da falácia do falso dilema: "Ou és ser humano ou és homem alentejano") (VALE DOIS VALORES).
2) Os quatro passos do raciocínio de Descartes são pautados pelo racionalismo, doutrina que afirma que a verdade procede do raciocínio, das ideias da razão e não dos sentidos:
1º Dúvida hiperbólica ou Cepticismo Absoluto( «Uma vez que quando sonho tudo me parece real, como se estivesse acordado, e afinal os sentidos me enganam, duvido da existência do mundo, das verdades da ciência, de Deus e até de mim mesmo »).
2º Idealismo solipsista («No meio deste oceano de dúvidas, atinjo uma certeza fundamental: «Penso, logo existo» como mente, ainda que o meu corpo e todo o resto do mundo sejam falsos»).
3º Idealismo não solipsista («Se penso tem de haver alguém mais perfeito que eu que me deu a perfeição do pensar, logo Deus existe).
4º Realismo crítico («Se Deus existe, não consentirá que eu me engane em tudo o que vejo, sinto e ouço, logo o mundo de matéria, feito só de qualidades primárias, objetivas, isto é, de figuras, tamanhos, números, movimentos, existe fora de mim»). Realismo crítico é a teoria gnosiológica segundo a qual há um mundo de matéria exterior ao espírito humano e este não capta esse mundo como é. Descartes, realista crítico, sustentava que as qualidades secundárias, subjectivas, isto é, as cores, os cheiros, os sons, sabores, o quente e o frio só existem no interior da mente, do organismo do sujeito, pois resultam de movimentos vibratórios exteriores e que o mundo exterior é apenas composto de formas, movimentos e tamanhos e uma matéria indeterminada.
A lei da contradição principal estabelece que um sistema de múltiplas contradições se pode reduzir a uma só grande contradição, constituída por dois grandes blocos ou pólos e deixando, às vezes, uma zona neutra na fonteira entre ambos os pólos. Neste caso, a contradição principal pode ser concebida de várias maneiras: num pólo, a dúvida absoluta (1º passo) e no outro polo o conjunto idealismo solipsista/ idealismo não solipsista/ realismo crítico que possuem certo grau de certeza em comum; em um polo os dois idealismos (2º e 3º passos) e no outro polo o realismo crítico (4º passo) ficando o cepticismo absoluto na zona intermédia ou neutra; em um polo o realismo crítico, no polo oposto o conjunto cepticismo absoluto/idealismos (VALE CINCO VALORES).
3-A) A res cogitans, em Descartes, é o pensamento humano, é uma realidade (a filosofia, as ciências, o senso comum) ao passo que o "eu" em David Hume não é uma realidade, mas uma ideia ilusória uma vez que somos apenas uma corrente de percepções empíricas a que a memória e a imaginação atribuem um núcleo invariável chamado «eu». (VALE TRÊS VALORES).
3-B) Ciências empírico-formais são aquelas que se baseiam em factos da experiência desvendando as leis necessárias, infalíveis, que os ligam e atravessam. Exemplo: a física com a lei da gravidade, a química com a relação ácido-base, a biologia, a geologia, etc. Habitualmente, supõe-se que estas ciências são neutras, estão isentas de ideologia, isto é, interpretações do mundo intersubjectivas, próprias de certas classes sociais e grupos étnicos (exemplo: cristianismo, budismo, liberalismo, comunismo, europeísmo, pan-arabismo, filosofias da igualdade de direitos universais ou do domínio da aristocracia sobre a plebe são ideologias). Ciências hermenêuticas são aquelas que se baseiam em factos empíricos interpretando-os segundo princípios e intuições subjectivas, cheios de simbolismos, sem leis infalíveis (exemplo: a psicanálise e o complexo de Édipo, a filosofia, a história e o papel dos grandes homens, a sociologia, a antropologia, etc). Sendo retórica a arte de argumentar ou demonstrar certas ideias ou teses, a retórica está presente em ambos aqueles tipos de ciência, em especial nas hermenêuticas que são marcadamente ideológicas - por exemplo, a teoria marxista da histórica que postula que as sociedades caminham todas em direcção ao comunismo, ou sociedade igualitária sem Estados, é muito mais ideológica do que a teoria da evolução das espécies de Darwin na biologia ou do que o cálculo integral em matemática, este último isento de ideologia (VALE QUATRO VALORES).
4) Há um número infinitamente grande (miríades) de sinais que demonstram que o Ser - essência esférica do universo - não foi criado por ninguém, não foi nem será porque é eternamente o mesmo, sem alterações. É perfeito e invisível, inaudível, por isso só pode ser apreendido pelo pensanento racional - daí que ser e pensar sejam um e o mesmo. O ser pode ser ideia ou pode ser algo material, o texto não é esclarecedor. Dois sentidos do Ser são: existência infinita no tempo; essência ou forma geral do universo. (VALE DOIS VALORES).
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Baseado no carácter anfibólico do termo «idealismo» Josué Pinharanda Gomes, filósofo e historiador da filosofia portuguesa, nascido a 16 de Julho de 1939, na aldeia de Quadrazais (Sabugal), estabeleceu uma confusa distinção entre ideísmo e idealismo. Escreveu:
«IDEALISMO- Nó górdio da teoria do conhecimento e da gnosiologia, ainda está por definir se isso que se designa de idealismo não devia ser designado por ideísmo. A teoria racionalista, mais insistente a partir da filosofia cartesiana, sobre a origem e a natureza do conhecimento, que propõe no princípio «noções primitivas», ideias inatas ou formas apriorísticas independentes da realidade (e portanto distinção racional entre res cogitans e res extensa) é um ideísmo como em Platão. Substantivo, ideísmo implica o próprio da ideia. Adjectivo, idealismo indica algo que se desprende da ideia, que nesta se funda, mas não é somente ideia (...) A ideia está para o ideal em movimento de progresso, e o ideal está para a ideia em movimento de regresso, e a teoria habitualmente denominada idealismo (por influência da nomenclatura gernânica) deveria nominar-se ideísmo. Nem todo o idealismo é um ideísmo, havendo idealismo que equivale a realismo gnosiológico, e por virtude deste, elabora paradigmas e enteléquias para as quais o espírito tende mas que são ideais e não ideias propriamente ditas. O ideísmo é ideísta, o idealismo pode ser realista.» (Pinharanda Gomes, Dicionário de Filosofia Portuguesa, 2ª edição, páginas 171-172, Dom Quixote; o destaque a negrito é posto por mim).
Pinharanda Gomes não consegue definir com clareza o que é o ideísmo. Aponta a teoria de Platão como exemplo de ideísmo e opõe esta definição à de realismo gnosiológico. No entanto, Pinharanda Gomes parece ignorar que a teoria de Platão é um realismo gnosiológico, pois nela a matéria é anterior à humanidade e à consciência humana e, oviamente, exterior a esta. Sustento que a teoria racionalista não é obrigatoriamente um ideísmo. O marxismo-leninismo é uma teoria racionalista - ou empiro-racionalista - e não é ideísmo nenhum. É um realismo: não reduz a realidade exterior física, à ideia, pelo contrário.
Ao referir que a teoria racionalista defende a existência «de ideias inatas ou formas apriorísticas independentes da realidade (e portanto distinção racional entre res cogitans e res extensa)» Pinharanda Gomes comete três imprecisões: em primeiro lugar, as ideias inatas não são independentes da realidade, elas são reais, são, sim, independentes da realidade empírica, da experiência; em segundo lugar, as ideias inatas não são o único motor necesssário da distinção entre res cogitans (pensamento) e res extensa (extensão, isto é, o comprimento, a largura e a altura das coisas materiais), pois há pensadores empiristas, da tábua rasa, que dizem não haver ideias inatas mas distinguem res cogitans de res extensa; em terceiro lugar, há racionalismo que rejeita a teoria das ideias inatas (inatismo).
Como a generalidade dos catedráticos de filosofia, Pinharanda Gomes não distingue com clareza o ideísmo (idealismo) de Kant do de Hegel. Não basta distinguir ideísmo de idealismo (ético ou telelógico) e Pinharanda não conseguiu fazê-lo: ao dizer «o ideísmo é ideísmo» pronuncia uma tautologia... Há três planos em torno deste tema ideia e não dois, como supunha este autor.
Portugal é um país de pensadores de curto alcance, não dialéticos. E a universidade mundial, em geral, idem. Não sabem hierarquizar os conceitos em géneros e espécies e mostrar como se intersectam circularmente entre si, lateralmente ou de forma descendente. Nada disto a fenomenologia ou a filosofia analítica souberam aprofundar. Os catedráticos, os professores do secundário não têm uma clara noção disto.
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