Sobre a concepção de Deus em Aristóteles, o livro deste «Sobre o mundo» é esclarecedor: Deus não é o demiurgo, o construtor do mundo material, mas o arquitecto imóvel que idealiza as formas ou essências eternas como árvore, imanentes ao mundo material e anteriores a este.
«Deus, com efeito, é em verdade o conservador e o gerador de todas as coisas que, de certo modo, se constituem no nosso cosmos; mas não tomando a fadiga de um ser vivo que trabalha com as próprias mãos e está sujeito ao cansaço mas fazendo uso de uma força indefectível mediante a qual domina também as coisas que parecem estar mais afastadas.»
«Ele teve o primeiro e mais alto posto e, por este motivo, é chamado o altíssimo, tendo ocupado o seu assento, para dizê-lo com o poeta, "no mais alto cume" de tudo quanto há no céu. Do seu poder beneficia em grau supremo o corpo que está mais perto dele, depois o corpo que está mais perto daquele, e assim seguidamente até aos lugares em que nos encontramos. Por isso a terra e as coisas que estão na terra, ao encontrarem-se a maior distância do socorro que vem de Deus, parecem ser débeis, incoerentes, e cheias de grande confusão; sem embargo, na medida em que o divino tem, por sua natureza, a capacidade de penetrar em todas as coisas, as coisas que sucedem entre nós sucedem de maneira semelhante às que estão por cima de nós as quais, conforme estão mais próximas ou mais afastadas de Deus, participam em maior ou menor medida do seu socorro.»
«É melhor admitir - e isto é sem dúvida conveniente e perfeitamente concordante com Deus - que o poder está assente no céu, inclusive para as coisas que estão mais afastadas, e, em uma palavra, para todas as coisas quantas há, seja a causa da sua conservação, antes do que admitir que, penetrando e girando em redor dos lugares nos que não é belo nem decoroso, ela mesma se ocupe das coisas que dizem respeito à terra.»
(Aristóteles, Sobre el mundo, Ediciones Sigueme SAU, 2014, pp. 78-79; o destaque a negrito é posto por nós).
Em Aristóteles, Deus, situado no alto dos céus, já fora do cosmos mas a sua força ordenadora manifesta-se no interior do cosmos:
«Deus pois é para nós uma lei perfeitamente equilibrada, que não admite correção alguma, nem mudança; melhor, ainda, é mais sólida que as leis inscritas em tábuas.
«Sob a sua guia, imóvel e harmoniosa, toda a ordem do céu e da terra está regulada, repartida por todas as naturezas, baseada nas sementes que lhes são próprias, em plantas e animais e segundo os géneros e as espécies de estas. » (ibid 97-99).
Estes textos permitem desmascarar a interpretação de Lenine e outros discípulos de Marx segundo a qual Aristóteles se inclinaria no sentido do materialismo e Platão professaria o «idealismo» (leia-se: o espiritualismo ou existência de deuses transcendentes ao plano físico). Como se depreende do texto, há um socorro de Deus aos humanos pelo que tanto Platão como Aristóteles professariam o teísmo. A diferença está em que Platão sustentava a teoria da reencarnação e Aristóteles não. Para este último, o intelecto paciente ou passivo, que individualiza cada pessoa, extinguir-se-ia com a morte desta, sobrevivendo apenas o intelecto agente, o Logos, que é uma força impessoal, característico da espécie e que esta empresta ao indivíduo enquanto este vive.
Aliás para Aristóteles há um Deus imóvel, autor da ordem cósmica e lei cósmica e há os deuses que habitam na região superior do cosmos:
«A região superior do cosmos, contida completamente nos seus limites, morada dos deuses, é chamada céu. Estando todo cheio de corpos divinos, que costumamos chamar astros, o céu, movendo-se com um movimento eterno, com um único movimento de rotação de órbita circular se move harmoniosamente sem fim por toda a eternidade.» (ibid pág 31).
Os astros são, pois, corpos divinos - e será o mesmo que dizer «são deuses»? Sabe-se que o cosmos é eterno e que Deus foi a sua causa formal, o gerador das formas, mas quem foi a causa eficiente, isto é, quem plasmou essas formas na matéria e no éter celeste? Um demiurgo ou deus-operário?
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Osho ou Bhagwan Shree Rajneesh (Kuchwada, Índia 11 de Dezembro de 1931- Puna, Índia, 19 de Janeiro de 1990) filósofo e místico indiano, defende que Deus nunca existiu, que a reencarnação é lei geral da existência, que a sexualidade é a energia libertadora mais poderosa e que o homem que se apercebe disso e medita racionalmente atinge o estado de um Buda ou iluminado:
«É absolutamente necessário que Deus esteja morto. Mas eu quero que compreenda o meu ponto de vista. Foi bom Friederich Nietzsche ter declarado que Deus estava morto. Eu declaro que ele nunca nasceu. É uma ficção criada, uma invenção, não uma descoberta (..)
«Eu quero destruir todos os sistemas de crenças, todas as teologias, todas as religiões. (…) A verdadeira medicina não é um sistema de crenças; a verdadeira medicina é a meditação (Osho, A conspiração de Deus, Editora Pergaminho, pp. 50-51).
E acrescenta:
«O padre sabe perfeitamente que Deus não existe. Ele é a única pessoa que o sabe perfeitamente. Mas é a sua profissão; ele vive de explorar as pessoas. Por isso, persiste em afirmar que Deus existe. Deus é o seu negócio. E quando é uma questão de negócio, é uma questão de subsistência. »
«E há milhões de padres, pertencentes a diferentes religiões. Há diferentes tipos de padres em cada país, mas todos eles exploram as pessoas a oferecer-lhes consolo. "Este casamento vai ser ótimo." E todos os casamentos são uma tragédia. Eu nunca vi um casamento que fosse uma comédia. »
«As pessoas só podem ser felizes se não forem casadas- Assim têm uma certa liberdade. É a partir desta liberdade que decidem permanecer juntas, não a partir de um contrato ou negócio qualquer, ou por serem forçadas pela sociedade. Não por causa de nenhuma lei - mas por causa de amor. - estão juntas apenas por amor e quando o amor falha...»
«E tudo falha, lembre-se. É ficção dos poetas que o amor é eterno. Não, o amor que você conhece não é eterno, e o amor que os poetas conhecem não é eterno; desvanece-se. Mantém-se se os amantes não se encontrarem.»
(Osho, A conspiração de Deus, Editora Pergaminho, pp. 276-277; o negrito é posto por nós).
O CASAMENTO ABERTO OU O FIM DA MONOGAMIA
Osho ataca todas as religiões na medida em que pregam a repressão sexual («Não cometas adultério», «Não penses em outras mulheres ou homens mas apenas no teu cônjugue», «Não vestirá o homem de mulher nem a mulher de homem») fechando as pessoas no casamento monogâmico que traz o sentimento de posse, o ciúme, a raiva no seio do casal.
«Se a sociedade fosse governada por gente inteligente - e não por gente que apenas deseja explorar - que procurasse satisfazera sua natureza até ao limite possível, o ciúme não existiria. A esposa compreenderia que, de vez em quando, o seu marido precisasse de outra mulher, "exatamente como eu também preciso de outro homem", E isso é perfeitamente natural. Somos todos seres humanos.»
«Onde está o mal de mudarmos de parceiro de ténis todos os dias? Há motivos para ciúmes? Claro que não.» (...)
«Quando não há ciúme não há raiva (...) Não acha que isso permitirá que a amizade cresça entre duas pessoas?» Um homem que conceda liberdade à sua esposa, uma esposa que conceda liberdade ao seu marido, isso implica a existência de uma grande amizade, de uma grande intimidade.»
«A mulher pode dizer ao marido como era o outro homem. O marido pode descrever à mulher como eram as coisas com a outra mulher. Não precisam de esconder. A amizade torna possível este tipo de proximidade e intimidade. Porém as sociedades do passado nunca quiseram que isso acontecesse. Queriam que as pessoas vivessem na rotina: unir uma mulher e um homem para sempre é iniciar uma peregrinação em direção ao tédio consumado. Estas pessoas entediadas, sofredoras não podem revoltar-se. Não podem atingir o clímax da inteligência: o tédio não pára de destruir qualquer espécie de possibilidade.» (OSHO, O livro do sexo, Pergaminho, pp. 208-209).
Osho critica não só o casamento por interesse material, difundido na Índia, como o sexo animal puro fácil que impera no Ocidente do «amor ivre»:
«O amor confia sempre ou então chega à conclusão de que a confiança não é possível e parte de uma maneira agradável; sem lutas nem conflitos. O sexo cria o ciúme; encontre, descubra o amor. Não faça do sexo a questão principal - porque não o é.»
«A Índia perdeu esssa possibilidade com os casamentos de conveniência; o Ocidente está a perdê-la devido ao "amor livre". »
«A Índia perdeu a capacidade de amar, porque os pais eram muito calculistas e menipuladores. Não permitiam que os seus filhos conhecessem o amor: isso é perigoso, ninguém sabe no que vai resultar. Foram muito espertos e, devido a essa esperteza, a Índia desperdiçou a sua possibilidade de amar.»«No Ocidente, as pessoas estão todas muito revoltadas, são demasiado jovens; não são espertas - são demasiado jovens e acriançadas. Tornaram o sexo uma coisa livre, disponível em todos os cantos e esquinas; não há necessidade de ir muito longe para descobrir o amor, basta gozá-lo e terminar num instante seguinte.»
«Através do sexo, o Ocidente está a perder-se; através do casamento, perdeu-se o Oriente. Mas, se estiver alerta, não precisa de ser oriental nem ocidental.» (OSHO, O livro do sexo, pp 236-237; o negrito é colocado por nós)
A NATUREZA BISSEXUAL DE TODOS OS SERES HUMANOS
Osho proclamou a bissexualidade psíquica como natureza de todos os seres humanos. Portanto, há que aceitar a diversidade dos comportamentos sexuais, com toda a liberdade, e rejeitar todas as religiões e os respectivos deuses na medida em que estas reprimem ou condicionam a sexualidade livre e espontânea e castram psiquicamente homens e mulheres.
«O Tantra diz que todos os homens e mulheres são bissexuais. Um homem não é simplesmente um homem. Á sua maneira, é também uma mulher. O mesmo se aplica à mulher. No seu íntimo, esconde-se um homem. Donde, todo o indivíduo, homem ou mulher, é bissexual. O oposto está escondido na camada mais profunda.»
«Na meditação profunda, dá-se um orgasmo sexual - não com alguém exterior a si, mas com o seu pólo interior oposto. É ali que se encontram: o seu lado feminino e o seu lado masculino. Esse encontro é espiritual e não físico. O yin e o yang interpenetram-se» (Osho, O livro do sexo, pág. 213).
A CONSCIÊNCIA INDIVIDUAL É IMORTAL, DEUS NÃO EXISTE
Mas o ateísmo de Osho pressupõe a imortalidade da consciência humana:
«A morte não destrói nada. Os cinco elementos do corpo são reabsorvidos de volta para a sua origem, e quanto à consciência há duas hipóteses: se não conheceu meditação, irá passar para outro ventre; se conheceu a meditação, se conheceu a sua eternidade, passará para o cosmos e desaparecerá na vastidão da existência. E esse desaparecimento é o momento alto da vida, em que se unifica com a sua origem, em que regressa e desaparece nela. »
«A religião autêntica não precisa de nenhum Deus, não precisa de nenhum padre. Não se esqueça: basta que explore o seu mundo interior.
«Essa exploração é o que eu chamo Zen. Em sânscrito chama-se dhyran; em chinês chama-se ch´an; em japonês chama-se zen. Mas é a mesma palavra. Dirigir-se ao seu interior, alcançar o ponto a partir do qual pode olhar, uma porta que se abre para o cosmos divino. Nesse ponto, você é um buda» (Osho, A conspiração de Deus, Pergaminho, pp. 279-280, o negrito é adicionado por nós).
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