Quarta-feira, 22 de Fevereiro de 2017
Teste de filosofia do 11º ano (14 de Fevereiro de 2017)

 

 

Eis um teste de filosofia do 2º período lectivo no ensino secundário em Portugal.

 

Agrupamento de Escolas nº1 de Beja

Escola Secundária Diogo de Gouveia , Beja

TESTE DE FILOSOFIA, 11º ANO TURMA A

14 de Fevereiro de 2017 Professor: Francisco Queiroz

I

“.Em Bachelard, o racionalismo dialético adequa-se à lei do salto de qualidade pois supera os obstáculos epistemológicos para alcançar o ultra-objecto. As quatro fases do método hipotético-dedutivo estão fora do âmbito da razão mas não do entendimento, segundo Kant.”

 

1) Explique estes pensamentos.

 

2) Explique, como, segundo a gnosiologia de Kant, se formam o fenómeno OLIVEIRA, o conceito empírico de OLIVEIRA e o juízo a priori «A soma dos três ângulos internos de um triângulo é 180º».

      

3) Relacione, justificando:

A) As sete relações filosóficas em David Hume e as formas a priori da sensibilidade e do entendimento na teoria de Kant.

 

B) Os três tipos de conhecimento em Bertrand Russel e três tipos de res em Descartes.

 

C) Princípio da falsificabilidade em Popper, conjectura, corroboração.

 

D) Idealismo, teoria da tábua rasa e ideias de «eu», «alma» e «substância» em David Hume.

 

CORREÇÃO DO TESTE COTADO MAXIMAMENTE PARA 20 VALORES

 

1) Segundo o filósofo francês Gaston Bachelard, a opinião, isto é, o senso comum, não pensa, isto é, traduz necessidades em conhecimentos, fabrica a explicação que mais lhe convém. Exemplo: a maioria das pessoas que sentem frequentes dores de cabeça não perdem tempo a investigar a causa dessas dores, tomam um comprimido de farmácia que faz desaparecer o sintoma mas não a causa que lhe está subjacente. Na ciência nada é dado porque tudo ou quase tudo é construção racional. Exemplo: a teoria do espaço-tempo de Einstein, que diz que o espaço encurva na proximidade de grandes massas não nos é dada pelos orgãos dos sentidos, é pensada na razão. O racionalismo é a doutrina segundo a qual a razão é a fonte principal ou única de conhecimento desprezando as percepções empíricas. É pelo raciocínio (racionalismo) que o facto bruto é transformado em facto científico, isto é , num facto racional ou empírico-racional cuja essência é o ultra-objecto: a cor do céu diurno não é azul, o azul existe apenas no interior da nossa mente; o mármore não é frio, é bom condutor de calor e rouba calor à mão que nele pousamos, etc. O obstáculo epistemológico em Bachelard é todo o entrave ao conhecimento científico: a primeira impressão, a experiência inicial,  o realismo natural ( o mundo exterior como parece ser: o céu é azul, o mármore é frio, etc, o preconceito do senso comum, a falta de tecnologia apropriada (exemplo: a falta de telescópios, microscópios, reagentes químicos, máscaras antigás, fatos de amianto, bússolas, aparelhos de refrigeração, etc.) o preconceito racial ou religioso, etc. Pode dizer-se que o racionalismo enfrenta o obstáculo epistemológico segundo a lei do salto de qualidade: a acumulação lenta, em quantidade, de um factor num fenómeno conduz, em dado instante, a um salto brusco de qualidade. Esta lei aplica-se à descoberta do ultra-objecto, isto é, um objecto invisível, no todo ou em parte, como por exemplo, os quarks up e down, constituintes supostos do protão.(VALE QUATRO VALORES).O método hipotético-dedutivo baseia-se na indução amplificante, inferência que Popper não aceita como válida, e tem quatro fases: observação ou ocorrência do problema, hipótese, dedução matemática da hipótese e verificação experimental com confirmação ou não da hipótese. Na doutrina de Kant, a razão é a faculdade de pensar a metafísica, os númenos, e está totalmente desligada dos fenómenos físicos que são objecto do método hipotético-dedutivo. Na mesma doutrina, o entendimento é a faculdade que pensa os fenómenos (as esferas, as roldanas, os planos inclinados, os tubos de ensaio com reagentes, etc) e portanto é ele que concebe o método experimental. (VALE TRÊS VALORES)

 

2) O númeno ou objecto metafísico, geralmente fora do espírito humano, afecta de alguma maneira a sensibilidade fazendo nascer nesta um caos empírico de matéria indeterminada e as formas a priori de espaço (figuras, extensão) e tempo (duração, simultaneidade, sucessão) moldam essa matéria transformando-a no fenómeno oliveira, que é o objecto visível ou coisa para nós. As imagens do fenómeno, isto é, de centenas de oliveiras, são levadas pela imaginação às categorias de unidade, pluralidade, realidade e outras do entendimento ou intelecto ligado ao mundo empírico e aí são reduzidas à unidade, a um conceito único de oliveira. Na forma a priori do tempo, na sensibilidade existem os números (90, 180, etc), na forma a priori espaço da sensibilidade existe a intuição pura de triângulo, estas intuições são elevadas ao entendimento, às categorias de unidade, pluralidade, totalidade, necessidade e estas categorias com a ajuda da tábua de juízos puros, em particular do juízo apodíctico, produzem o juízo a priori «A soma dos três ângulos internos de um triângulo é 180º » (VALE TRÊS VALORES).

 

3) A) As sete relações filosóficas são, segundo David Hume: identidade, semelhança, relações de tempo e de lugar, proporção de quantidade ou número, graus de qualidade, contrariedade e causação. É discutível saber se são noções a posteriori, ou seja, que surgem na experiência sensorial e não antes desta, ou se são formas a priori, isto é, estruturas vazias que estão antes da primeira experiência. As formas a priori da sensibilidade, em Kant, são: o espaço, cujo conteúdo é extensão e figuras geométricas, e o tempo, cujas determinações são duração, sucessão, simultaneidade e números.

É fácil detectar correspondências entre Hume e Kant: as relações de tempo e de lugar, em Hume, correspondem ao espaço e tempo à priori em Kant; a proporção de quantidade ou número, em Hume, equivale aos números contidos no tempo, em Kant.

 

As categorias, em Kant,  são formas a priori do entendinento, isto é, mecanismos inatos do pensamento, anteriores a toda a experiência sensorial, como por exemplo, unidade, pluralidade e totalidade (categorias da quantidade). São 12 e constituem a seguinte tábua:

«TÁBUA DAS CATEGORIAS»

I

Da quantidade:

Unidade

 Pluralidade

   Totalidade

           2                                                                                   3

Da Qualidade                                                              Da relação

Realidade                                                                    Inerência e subsistência

Negação                                                                      ( substancia et accidens)

Limitação                                                                    Causalidade e dependência

                                                                                                     (causa e efeito)

.....................................................................................Comunidade

                                                                                    (acção recíproca entre

                                                                                     o agente e o paciente)

                                                                         4

Da Modalidade:

Possibilidade-Impossibilidade

Existência-Não-existência

Necessidade-Contingência

 

 

Podemos fazer corresponder a relação filosófica de causação (determinismo), em Hume, à categoria de necessidade (lei infalível de causa-efeito)  em Kant. Também podemos estabelecer correspondência entre a relação filosófica de identidade e a categoria de inerência e subsistência (substância e acidente). As formas a priori do entendimento incluem as categorias e os juízos puros (afirmativos, negativos, assertóricos, apodícticos, etc) que são doze (VALE TRÊS VALORES).

 

3-B)As três res ou substâncias primordiais em Descartes são: a res divina, Deus, espírito criador do universo, fonte das outras duas; a res cogitans ou pensamento humano sobre ciências, filosofia, senso comum, etc; a res extensa, isto é, a matéria, abstracta e indeterminada, constituída por comprimento, largura e altura dos corpos, destituída de cor, som, cheiro. Os três tipos de conhecimento segundo Bertrand Russell são: o saber-fazer, que é um conhecimento empírico-técnico, como andar de bicicleta, nadar, jogar futebol; o conhecimento por contacto, isto é, empírico directo, como ver uma planície alentejana, ouvir uma música dos «Discípulos», saborear gaspacho e opinar «O gaspacho é uma sopa fria de tomate agradável ao paladar»; o conhecimento proposicional, isto é, racional ou empírico-racional, como por exemplo, «O quark up tem carga eléctrica positiva 2/3 ao passo que o quark down tem carga negativa 1/3», «Portugal entrou na Comunidade Económica Europeia em 1 de Janeiro de 1986». contrariando muitas vezes as percepções empíricas. Podemos fazer corresponder a res cogitans ao conhecimento proposicional porque são pensamento(VALE TRÊS VALORES).

 

3-C) 3) B) Conjectura é uma suposição, uma hipótese. O conjecturalismo é a teoria de Popper segundo a qual as teorias das ciências empíricas, as leis induzidas, não passam de suposições, de hipóteses falíveis, pois é impossível verificar todos os casos concretos correspondentes a dada lei ou tese. Assim, por exemplo, a tese de que o átomo de enxofre tem 16 electrões é uma mera hipótese e não uma verdade indiscutível. A indução (amplificante) é a generalização de alguns exemplos empíricos similares de modo a construir uma lei universal e necessária. Popper rejeita este raciocínio indutivo dizendo que só seria legítimo se fosse possível a verificação de todos os casos correspondentes a essa lei induzida, mas só é possível a corroboração, isto é, a confirmação de alguns casos. O princípio da falsificabilidade  é a teoria de Popper segundo a qual uma teoria «científica» deve ser falsificada, posta em questão, através de testes experimentais rigorosos e de discussão racional, e ser aceite provisoriamente enquanto resistir a esses testes.. (VALE DOIS  VALORES).

 

3) D) O idealismo, isto é, a doutrina que diz que o mundo material exterior à mente humana não existe, é ilusório, é base da teoria de Hume. Por exemplo, o"eu" em David Hume não é uma realidade, mas uma ideia ilusória, uma vez que somos apenas uma corrente de percepções empíricas a que a memória e a imaginação atribuem um núcleo invariável chamado «eu». Do mesmo modo, a   substância (exemplos: as substâncias cadeira ou nuvem) é uma ideia fabricada pela nossa imaginação servindo-se das sete relações filosóficas que são disposições sensório-intelectuais a priori da mente humana: semelhança, identidade, relações de tempo e lugar, proporção de quantidade ou número, graus de qualidade, contrariedade e causação. A ideia de permanência, de continuidade entre as percepções empíricas forja as ideias de eu e de substância. As relações de tempo e lugar não estão em objectos materiais fora de nós mas são um modo de ver e pensar inerente à nossa mente - e isto é idealismo. David Hume é empirista  porque sustenta que as nossas impressões de sensação ou percepções empíricas (exemplo: a visão de um gato, o sabor da açorda alentejana) são a fonte das nossas ideias. Sustenta a teoria da tábua rasa que diz que ao nascer a mente humana vem vazia de conhecimentos. (VALE DOIS VALORES).

 

www.filosofar.blogs.sapo.pt

f.limpo.queiroz@sapo.pt

 

© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)

 



publicado por Francisco Limpo Queiroz às 19:18
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