René Guénon distinguiu dois polos da existência: o polo essencial, superior, das formas puras, e o polo substancial, da matéria-prima indeterminada. Segundo Guénon, o mundo da Tradição (até ao final da Idade Média) situava-se no polo essencial ao passo que o mundo Moderno, iniciado com o Renascimento, e prosseguido com a Idade Moderna de Descartes, o Século das Luzes e os últimos dois séculos de industrialismo, materialismo e individualismo, centra-se no polo substancial.
Guénon opõe como contrários a qualidade (essência) à quantidade (substância) - numa antinomia que não é perfilhada por escolásticos de ascendência aristotélica como São Tomás de Aquino que incluía a substância dentro da essência. O próprio Aristóteles sustentava a posição de que a substância é um composto de essência (forma comum) e de matéria-prima, informe, o que não coincide com a posição de Guénon. Escreveu este:
«É necessário fazer uma distinção nítida entre dois pontos de vista que estão ligados respectivamente aos dois polos da existência: se se diz que o mundo foi formado a partir do "caos", é porque se encara unicamente sob o ponto de vista substancial, e então é preciso considerar este começo como intemporal, porque, evidentemente, o tempo não existe no "caos", mas só no "cosmos". Se quisermos, pois, referir-nos à ordem de desenvolvimento da manifestação que, no domínio da existência corporal e pelas condições que a definem, se traduz por uma ordem de sucessão temporal, não é deste lado que devemos partir, mas pelo contrário, do lado do polo essencial, cuja manifestação, de acordo com as leis cíclicas, se afasta constantemente para descer até ao polo substancial. A "criação", enquanto "resolução" do caos, é, de certo modo, "instantânea", e é propriamente o Fiat Lux bíblico; mas o que está verdadeiramente na origem do "cosmos", é a própria Luz primordial, isto é, o "espírito puro" no qual estão as essências de todas as coisas; e, a partir daí, o mundo manifestado só pode efectivamente baixando cada vez mais até à "materialidade".»
(René Guénon, O Reino da Quantidade e os Sinais dos Tempos, Publicações Dom Quixote, pag 80).
O ponto de vista de Guenón é, obviamente, o de Sócrates e Platão, segundo os quais o Espírito é a causa do mundo, opondo-se às filosofias de Tales de Mileto, Anaxímenes, Anaximandro, Heráclito, Anaxágoras e outros que afirmam um ou vários princípios materiais (água, ar, fogo, terra, etc) como causa do universo.
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