O livro «O segredo» de Rhonda Byrne alcançou há poucos anos um sucesso internacional ao definir a lei da atração (o semelhante atrai o semelhante, o pensamento atrai o objecto ou o ambiente pensado e imaginado) como modeladora do destino individual de cada um. Se pensarmos de modo pessimista ou desejarmos mal a alguém, o fracasso e o mal vêm ter connosco. Se pensarmos de modo otimista e desejarmos o bem, atrairemos este. O interessante que é que esta apologia da psicotrónica, que admite o valor da oração a Deus, colide com a grande maioria das religiões na medida em que estas pensam sistematicamente o pecado e tornam a vida cinzenta com prescrições legalistas - ora pensar o pecado e o complementar remorso é atraí-los à nossa vida. Na boa prática da lei da atração não há que pensar no mal nem em agravos do passado mas pedir, agir e estar grato ao universo ou a Deus. Escreve Rhonda:
«PONTOS CHAVE DO PROCESSO CRIATIVO
«Para a lei da atração nada é impossível e tudo é possível».
«Aquilo em que mais pensar é aquilo que mais vai atrair para a sua vida».
«Peça, Acredite, Receba - apenas três passos simples para criar aquilo que quer.»
«O primeiro passo do Processo Criativo é pedir.»
«Pode ser tão específico quanto desejar».
«Assim que tiver pedido, saiba que aquilo que quer já é seu.»
«O segundo passo do Processo Criativo é Acreditar. Aja, fale e pense como se já tivesse recebido aquilo que deseja».
«Como é que o Universo lhe vai trazer aquilo que deseja não é nem preocupação nem tarefa sua».
«Quando você acredita, o Universo tem de mover todas as forças por forma a que receba.»
«Teste o poder de O Segredo pedindo algo pequeno».
«O terceiro passo do Processo Criativo é receber. Quando se sente bem, está na frequência de receber e as coisas que deseja vão chegar até si.»
« Peça uma vez, acredite que já recebeu e tudo o que precisa para receber é sentir-se bem».
«Mude os seus pensamentos agora e vai mudar a sua vida».
(Rhonda Byrne, Como o Segredo Mudou Minha Vida, Lua de papel, pp. 48-49).
ESQUECER O PASSADO NEGATIVO, NÃO O RECAPITULAR
Há quem diga que é impossível esquecer o passado. Mas as imagens e emoções negativas do passado devem ser deixadas em repouso, pois reavivá-las é projectar remoinhos de cólera ou inquietação sobre o momento presente, o único verdadeiramente vivo. Escreve Rhonda:
«ABRA MÃO DO PASSADO- Se está constantemente a passar a sua vida em revista e a focar-se nas dificuldades do passado, só está a trazer mais dificuldades para a sua vida actual. Quando pensa no passado, abra mão de todas as coisas de que não gosta na sua infância e mantenha apenas as que gosta. Abra mão das coisas de que não gosta na sua adolescência e na vida adulta e mantenha apenas as boas. Quando o fizer, vai descobrir que se começa a sentir cada vez mais feliz. Quanto mais pensamentos positivos tiver, mais repara nas coisas que adora e que o fazem sentir-se bem, e mais feliz se torna.»
«Atraímos aquilo que somos e, quando estamos felizes, atraímos pessoas felizes, circunstâncias felizes e acontecimentos felizes para as nossas vidas.»
(Rhonda Byrne, Como o segredo mudou a minha vida, Lua de Papel, pág. 56).
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No seu livro «Nova Filosofia», publicado em 1990, José Reis, um catedrático de filosofia da universidade de Coimbra, propõe uma «nova concepção do tempo», que fica bastante aquém do que Aristóteles escreveu sobre o tempo na «Física». Escreveu José Reis:
«O tempo é, como já acontece sempre que olhamos para a sucessão das coisas sem qualquer concepção meta-física, essa simples sucessão. »
«Mas,é claro, não basta abstrair - quando efectivamente já abstraímos - das concepções meta-físicas: é preciso destruí-las, vendo por dentro toda a questão. E aqui, no que toca à causalidade, tudo começou pela espacialização do tempo. Porque o imediato é conceber o futuro - o momento temporal que antes de mais nos interessa para a causalidade - como aquilo que ele é no presente, ou seja, como nada, é então esse nada que, na articulação que fazemos entre os momentos temporais, passa ao presente. O presente, porém, é o ser; como se transforma tal nada em ser? Eis que os fenómenos privilegiados da força e do movimento nos trazem a potência; sendo por definição o ser em forma de nada, ela serve-nos à maravilha: as coisas vêm dessa potência. Só que acontece que essa potência é mesmo nada; e admitindo que fosse alguma coisa, nunca seria suficiente para as coisas. E apenas há as coisas. As coisas, no seu tempo próprio e só nele. As coisas que - não derivando da potência de que eram dotadas as coisas anteriores, potência que por sua vez derivava (bem como as primeiríssimas coisas) duma Potência eterna - são o absoluto. (José Reis, Nova Filosofia, pag 77, Edições Afrontamento, Porto; o destaque a negrito é posto por mim).
Comecemos por questionar a definição de tempo como «simples sucessão das coisas». Há a sucessão espacial das coisas - por exemplo, uma fila de peças de dominó encadeadas umas nas outras, em sucessão, mas que eu fotografo no mesmo instante - e a sucessão temporal, em que os momentos se eliminam uns aos outros - por exemplo, as modificações que o meu corpo experimenta dia a dia, mês a mês. José Reis não faz esta distinção, com clareza.
«O ser é o presente» - eis um erro de José Reis, baseado na confusão entre ser-existência (o presente) e ser-essência (o passado, o presente e o futuro de determinada forma ou essência). Quando dizemos, por exemplo, que «o ser na doutrina de Nietzsche é a vontade de poder, movendo-se no círculo do eterno retorno» estamos a perspectivar o ser como passado-presente-futuro, não podemos reduzi-lo apenas ao acto presente.
Se não investigássemos o passado e prevíssemos o futuro, se não possuissemos a visão holística e histórica do que foi e previsivelmente será (por indução), não poderíamos saber o que é o ser. José Reis é um actualista (só o momento actual é real): o seu combate ao essencialismo, à permanência das essências, assemelha-se ao de David Hume, o pai da moderna filosofia analítica, e ao de Wittgenstein. A pretensão de «destruir a meta-física para ver as coisas por dentro» é uma tarefa inglória: o futuro associa-se sempre a uma certa dose de metafísica e ninguém, em bom juízo, se dissocia de pensar o futuro, a potência da sua vida e das vidas de outros.
O passado e o futuro fazem parte da essência do tempo, de qualquer tempo de qualquer ente. A essência do tempo não coincide, pois, com a existência: engloba esta como o momento actual mas engloba também o sido e o porvir, a potência. A essência é o sido, o momento presente, e a potência (o futuro em esboço). Ora o ser é essência: passado, presente, futuro, ainda que destes três momentos só um seja acto (o presente) e outro tenha sido acto (o passado).
Quanto à espacialização do tempo que José Reis aponta como um erro do pensar filosófico, gerador da ideia da causalidade, ela é inevitável e não constitui um erro. Einstein falava do espaço-tempo, não do tempo separado do espaço. O tempo não é, na minha óptica, o espaço globalmente considerado mas as mudanças contínuas de posição (kinésis, em grego) ou de forma (aloiósis, em grego: alteração) dos corpos e figuras que ocupam o vasto espaço. Divergindo da minha conceptualização do tempo, Aristóteles não define o tempo como um movimento mas como um acidente intrínseco ao movimento, o número que marca este :
«É então evidente que não há tempo sem movimento nem mudança. Logo é evidente que o tempo não é um movimento, mas não há tempo sem movimento.» (Aristóteles, Metafísica, Livro IV, 218 b, 25-30)
«Assim pois, quando percebemos o agora como uma unidade, e não como anterior e posterior no movimento, ou como ele mesmo relativamente ao anterior e ao posterior, então não parece que tenha transcorrido algum tempo, já que não houve nenhum movimento. Mas quando percebemos um antes e um depois, então falamos de tempo. Porque o tempo é justamente isto: número do movimento segundo o antes e o depois».(Aristóteles, Metafísica, Livro IV, 219 b, 1-5; o destaque a negrito é da minha autoria).
Sobre a «refutação da causalidade necessária» realizada por Hume e reafirmada por José Reis, basta dizer que as leis da natureza, as leis da física e da astrofísica demonstram que a causalidade existe. Ninguém, de bom senso, se atreveria a beber amoníaco ou a atirar-se de um avião em voo sem páraquedas porque sabe que tais actos seriam causa de morte ou de gravíssimos danos no seu corpo.
A ABOLIÇÃO DO SER ETERNO: PODE PROVAR-SE?
No seu ver anti-metafísico, José Reis sustenta que o absoluto não existe como eternidade mas é apenas o ser temporal, finito. Decreta, pois a abolição do ser eterno. Mas como pode José Reis garantir, com fundamento, que não há um ser-essência eterno? O seu ver anti metafísico é muito limitado. É um empirismo rasteiro, de visão curta. Escreve Reis:
«O ser temporal é, pois, porque só se pode pensar, durante o tempo em que ele existe, como ser e não como nada, tão absoluto como o ser eterno.»
«E mais: ele não é só tão absoluto como o ser eterno, ele é mesmo o único absoluto. Não havendo causalidade, como agora sabemos, e sendo esse ser eterno exigido apenas como causa do ser temporal, este, longe de ser si mesmo um nada sempre à espera da esmola do ser eterno, é que é até o único absoluto. Por muito que custe aos nossos hábitos, é ele agora a medida de tudo. Há só esse ser temporal, tal como ele é na sua temporalidade, isto é, na sua sucessão - o ser temporal, repitamo-lo, não é temporal porque seja de si mesmo o nada mas só porque é uma sucessão - e é tudo.» (José Reis, Nova Filosofia, páginas 78-79, Edições Afrontamento; o destaque a negrito é posto por mim).
O ser temporal é temporal porque é uma sucessão, diz José Reis . Mas o movimento da esfera celeste que acompanha o tempo e de que Aristóteles fala na «Física» é eterno e é sucessão posicional. Eterno não significa necessariamente imóvel, sem sucessão. Por conseguinte, definir o temporal pela sucessão é insuficiente. Há um movimento eterno, intemporal, e movimento é sucessão posicional.
Dizer que o ser temporal - com início e fim no tempo - é tão absoluto como o ser eterno é dizer que o finito é tão absoluto quanto o infinito. É certo que o infinito não existe, em acto, segundo Aristóteles. Há um limite em todas as coisas, até no imenso universo. Mas enquanto essências o eterno é o absoluto e o temporal não é o absoluto mas o relativo. Como existência, o presente é o absoluto, como essência o «agora» não é absoluto porque se relaciona com o sido e o porvir.
Aristóteles distinguiu bem o ser, do tempo, com clareza superior à de Heidegger e de José Reis:
«Todas as coisas se geram e se destroem no tempo. Por isso, enquanto alguns diziam que o tempo era o mais sábio, o pitagórico Paron chamou-o, com clareza, de "o mais néscio", porque no tempo esquecemos. É claro, então, que o tempo tomado em si mesmo é mais precisamente causa de destruição do que de geração, como já se disse antes, porque a mudança é em si mesma, um sair fora de si, e o tempo só indirectamente é causa de geração e de ser. Um indício suficiente disso está no facto de que nada se gera se não se move e actua, enquanto que algo pode ser destruido sem que se mova, e é, sobretudo, de esta destruição que se diz ser obra do tempo. Mas o tempo não é a causa disto, mas dá-se o caso de que a mudança se produz no tempo» .
( Aristóteles, Física, Livro IV, 222 b, 15-20; o destaque a negrito é posto por mim).
O PASSADO SÓ EXISTE ENQUANTO O PENSO AGORA?
José Reis sustenta que o passado só existe enquanto o pensamos agora. Na linha descontinuísta de David Hume, que combateu as noções de necessidade/ causalidade infalível e de continuidade das coisas em todo o tempo, Reis postula os momentos do tempo como desligados entre si de modo que um nunca é causa do outro. Dando o exemplo de olharmos sucessivamente as seis faces de uma caixa - e cada vez que vemos uma é o ver imediato - escreveu:
«Uma vez que só agora o penso, esse passado só agora existe. Supor que a face, porque ela durante esse tempo não foi vista e,uma vez que estava ocupado em ver as outras faces, nem sequer foi pensada, existiu lá em absoluto desligada do pensamento é precisamente esquecer que ela só existiu lá, e existiu sem ser vista nem pensada, porque agora a penso lá dessa maneira; sem isso pura e simplesmente não haveria lá nada . Por muito que custe aos nossos hábitos, esse passado da face só agora existe, durante o tempo em que o penso. (...) O agora, digamo-lo assim, é só esse passado; mas, se tirarmos o agora, esse passado, seja ele uma duração de segundos ou de milénios, pura e simplesmente desaparece. - É irremediável. Se houvesse causalidade e Deus criasse o mundo, Ele não criaria as coisas que nós depois veríamos de tempos a tempos mas criaria as coisas vistas e vistas durante o tempo e segundo o modo como se vêem: criaria o agora em que a face se vê pela primeira vez, criaria o agora em que ela se vê pela segunda vez e criaria o agora em que ela se pensa no intervalo. Só isso existe.» (José Reis, Nova Filosofia, página 129-130, Edições Afrontamento; o destaque a negrito é posto por mim). )
Refutar estas teses idealistas não é difícil: o passado não existe no agora, nem sequer existe, porque já passou; no agora existem apenas a lembrança ou a idealização ou vestígios físicos do passado, isto é, de uma imensidão de agoras ab-rogados.
José Reis é um exemplo de junção entre filosofia analítica e fenomenologia, ambas nascidas do idealismo de David Hume.
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O existencialismo de Sartre, exaltando a vontade individual e o livre-arbítrio, menospreza o carácter inevitável da fisiologia ou condições de nascimento e vivência de cada um, a necessidade corporal e material, planetária (os planetas são enormes massas de matéria que telecomandam a massa corporal e encefálica de cada um de nós), que governa o homem a cada instante. Sartre escreveu:
« Nascimento, passado, contingência, necessidade de um ponto de vista, condição de facto de toda a acção possível sobre o mundo: tal é o corpo, tal é ele para mim. Logo, ele não é de forma alguma uma adição contingente à minha alma, mas, pelo contrário, uma estrutura permanente do meu ser e a condição permanente de possibilidade da minha consciência como consciência do mundo e como projecto transcendente em relação ao meu futuro. Desse ponto de vista, devemos reconhecer que é de todo em todo contingente e absurdo que eu seja enfermo, filho de funcionário ou de operário, irrascível e preguiçoso, e que é não obstante necessário que eu seja isso ou outra coisa, francês ou alemão ou inglês, etc, proletário ou burguês ou aristocrata, etc, enfermo e enfezado ou vigoroso, irascível ou de carácter conciliador, precisamente porque não posso sobrevoar o mundo sem que o mundo se desvaneça (...) O meu nascimento.(.. )a minha raça (...) a minha classe (...) a minha nacionalidade (...) a minha estrutura fisiológica (...) o meu carácter, o meu passado, enquanto tudo o que eu vivi é indicado como ponto de vista sobre o mundo pelo próprio mundo: tudo isso, enquanto o supero na unidade sintética do meu ser-no-mundo, é o meu corpo, como condição necessária da existência de um mundo e como realização contingente dessa condição. Entendemos agora em toda a sua clareza a definição do corpo no seu ser-para-nós: o corpo é a forma contingente tomada pela necessidade da minha contingência.» (Jean Paul Sartre, O ser e o nada, pag. 335-336, Círculo de Leitores, 1993; o destaque a negrito é posto por mim).
Neste texto, Sartre erra ao dizer que «o corpo é a forma contingente tomada pela necessidade da minha contingência». O corpo é uma forma necessária, é o suporte das leis infalíveis da natureza que operam em nós. Decerto, está sujeito às contingências da vida - engorda ou adoece mediante uma errónea alimentação assente em vida economicamente desafogada, modifica-se mediante uma cirurgia plástica, envelhece, etc. Mas a contingência do corpo assenta na sua estrutura psicofisiológica feita de necessidade (ADN, estrutura óssea, etc): a inteligência é inata, necessária, mas pode exercitar-se e «crescer» mediante exercícios. Para Sartre a contingência é necessária - com o que estou de acordo - mas ele ilude a necessidade biofisiológica que é, ontologicamente, prévia à contingência.
Nascemos um corpo dotado de certas linhas de desenvolvimento futuro e não podemos fugir a isso. Sartre está muito preso à filosofia estóica de Marco Aurélio no aspecto de exaltar o livre-arbítrio racional que anularia as dores e as necessidades corporais.
Por outro lado, Sartre evidencia a sua posição fenomenológica de que «o mundo não existe sem mim, sujeito cognoscente», ao escrever: «enquanto o supero na unidade sintética do meu ser-no-mundo, é o meu corpo, como condição necessária da existência de um mundo». Ainda aqui Sartre é muito cartesiano: substitui o «Cogito» de Descartes pelo «Sinto, corporalmente».
O meu corpo não é necessário à existência de um mundo, se este é uma totalidade real e objectiva, independente das consciências. Essa é a posição do realismo em geral. Sucede que Sartre interpreta o termo «mundo» de modo heideggeriano como uma totalidade de entes correlatas do ser humano e que só este capta e interpreta, uma espécie de tela onde passa um filme visível em três dimensões.
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Arthur Schopenhauer (22 de Fevereiro de 1788- 21 de Setembro de 1860) foi um representante do idealismo volitivo, uma corrente que sustenta que o mundo material é meramente mental, é projeção da vontade (volição) associada à mente e é imanência a esta. Foi um dos raros filósofos que compreenderam integralmente a doutrina de Kant - ao contrário de Russell, Sartre, Heidegger e a generalidade dos académicos de hoje - e foi um crítico implacável de Hegel.
Porém, na análise psicológica dos sexos e do amor, adotou uma teoria similar à da astúcia da razão engendrada por Hegel (os estadistas e outros atores da história como regicidas, generais, etc, executam nas ações que levam a cabo por impulso ou «livre-arbítrio», sem se darem conta, a vontade da razão universal) ao teorizar o génio da espécie. Este é a força do instinto de Eros, impessoal, que domina e manipula os indivíduos como marionetas. Antes de tudo, como um pilar da sua antropologia, Schopenhauer sustentou que o amor do homem é, por natureza, polígamo e o da mulher, por natureza, monógamo:
«Em primeiro lugar, deve notar-se que o homem é, por temperamento, propenso à inconstância no amor e a mulher à fidelidade. O amor de um homem declina de um modo sensível, a partir do instante em que foi satisfeito; parece que todas as mulheres têm mais atrativos do que a possui; aspira à mudança. O amor da mulher, pelo contrário, aumenta a partir desse momento. É essa uma consequência do fim da natureza, dirigido para a conservação e, por conseguinte, para o aumento, o mais considerável possível, da espécie. O homem, de facto, pode facilmente gerar mais de cem filhos num ano, se tiver outras tantas mulheres à disposição; a mulher, pelo contrário, ainda que tivesse o mesmo número de maridos não podia dar à luz mais do que um filho por ano, excetuando os gémeos. Por isso, o homem anda sempre à procura de outras mulheres, enquanto a mulher se conserva fielmente dedicada a um só homem, porque a natureza a impele instintivamente e sem reflexão a conservar junto de si aquele que deve alimentar e proteger a pequena família futura. Daí resulta que a fidelidade no casamento é artificial para o homem e natural na mulher, e portanto o adultério da mulher por virtude das consequências que acarreta, e por ser contra a natureza, é muito mais imperdoável que o do homem.»(Schopenhauer, Metafísica do amor, páginas 38-39, Inquérito; o negrito é posto por mim. )
Esta concepção, que é a da tradição esotérica - o homem é Yang, movimento, luz, exterioridade, dilatação, fogo e ar; a mulher é Yin, repouso, sombra, interioridade, contração, água e terra - é rejeitada pelos movimentos feministas e pelo igualitarismo sexual hoje dominante no mundo.
A FINALIDADE DA ATRAÇÃO ERÓTICA E DO CASAMENTO É A PROCRIAÇÃO
É o instinto genésico, instinto da espécie que atravessa o indivíduo, o guia na atração sexual, diz Schopenhauer. E por isso as mulheres preferem os homens de 30 a 35 anos aos rapazes de 20:
«Não podemos naturalmente enumerar com tanta exatidão as considerações inconscientes às quais se liga a inclinação das mulheres. Eis o que se pode afirmar de um modo geral. É a idade dos 30 aos 35 anos que elas preferem a qualquer outra, mesmo à dos jovens, que contudo representam a flor da beleza feminina. A causa é serem dirigidas não pelo gosto, mas pelo instinto, que reconhece nesses anos o apogeu da força geradora. Em geral, dão pouca importância à beleza, principalmente à do rosto; como se elas se encarregassem, por si sós, de a transmitirem à criança. É acima de tudo a coragem e a força do homem que lhes conquista o coração, porque estas qualidades são penhor duma geração de crianças robustas, e parecem assegurar-lhes, no futuro, um protetor corajoso.»
««A estupidez não prejudica os homens junto das mulheres; o espírito superior, ou mesmo o génio, pela sua desproporção, têm muitas vezes um efeito desfavorável. Vê-se frequentemente um homem feio, estúpido e grosseiro suplantar junto das mulheres um outro bem feito, espirituoso, delicado. Vêem-se igualmente casamentos de inclinação entre pessoas tão diferentes quanto é possível no ponto de vista do espírito: ele por exemplo, brutal, robusto e estúpido; ela, meiga, impressionável, pensando delicadamente, instruída, requintada, etc; ou, então, ele muito sábio, cheio de talento, e ela, uma pateta (...)» «A razão disso é que as considerações que predominam aqui nada têm de intelectual e dizem respeito ao instinto. No casamento, o que se tem em vista não é um colóquio cheio de espírito, é a criação dos filhos; o casamento é um laço dos corações e não das cabeças. Quando uma mulher afirma que está enamorada do espírito de um homem, é uma pretensão vã e ridícula, ou a exaltação de um ser degenerado. Os homens, por sua vez, no amor instintivo, não são determinados pelas qualidades de caráter da mulher.» (Schopenhauer, páginas 41-44, ibid; o negrito é acentuado por mim).
Assim, a procriação é a finalidade inconsciente da união erótica entre homem e mulher e do casamento. O instinto da espécie é uma inteligência animal que perpassa em todos os exemplares do género humano.
AMAR AQUILO QUE FALTA, POR ORDEM DO GÉNIO DA ESPÉCIE
A visão de Schopenhauer é dialética, baseada no mais alto grau da contradição - que não é a colatarealidade, nem a relatividade posicional mas a contrariedade.
«Todos amam precisamente o que lhes falta. (..) É assim que o homem mais viril procurará a mulher mais feminina, e vice-versa. (..) Há casos excecionais em que um homem se pode apaixonar por uma mulher decididamente feia: de acordo com a lei da concordância dos sexos, isto dá-se quando o conjunto dos defeitos e das irregularidades físicas da mulher são, justamente, a antítese e, por conseguinte, o corretivo dos do homem. Neste caso, a paixão atinge geralmente um grau extraordinário.»
«O indivíduo obedece em tudo isto, sem que o perceba, a uma ordem superior, à da espécie: daí a importância que liga a certas coisas que, como indivíduo, poderiam e deveriam ser-lhe indiferentes. » (Schopenhauer, Metafísica do Amor, páginas 44-49; o negrito é posto por mim)
Schopenhauer põe em relevo a luta entre o manipulador génio da espécie, o Cupido que atinge solteiros e casados e faz e desfaz relações amorosas e sociais, e o génio protetor de cada indivíduo:
«O génio da espécie está sempre em guerra com os génios protetores os indivíduos, é o seu perseguidor e inimigo, sempre pronto a destruir sem piedade a felicidade pessoal, para alcançar os seus fins(...)
«Os casamentos de amor são concluídos no interesse da espécie e não em proveito do indivíduo. Os indivíduos imaginam, é certo, que trabalham para a própria felicidade; mas o verdadeiro fim é-lhes estranho, visto que não é outro senão a procriação dum ser que só é possível por meio deles. Obedecendo ambos ao mesmo impulso, devem naturalmente procurar entender-se o melhor possível.» (Schopenhauer, Ibid, pág. 62)
A VONTADE DE VIVER
A vontade de viver, imortalmente no seio da espécie, vontade comum a religiosos, agnósticos e ateus, é, segundo Schopenhauer, a chave do comportamento humano, em particular no campo do amor sexual e do casamento. Não é apenas uma vontade de viver num mundo que nos é dado de fora: essa vontade é a criadora do mundo, mundo este que é um conjunto de representações e ilusões. As árvores só existem porque nós as projetamos e não são independentes de nós, a beleza daquela mulher ou a fealdade de outra é criação da vontade de viver que anima o nosso ser.
«O homem prova assim que a espécie lhe importa mais do que o indivíduo, e que vive mais diretamente naquela do que neste. Porque é então que o enamorado fica suspenso, num absoluto abandono, dos olhos daquela a quem escolheu? Porque está pronto a fazer por ela todos os sacrifícios? - Porque é a parte imortal do seu ser que suspira por ela, enquanto todos os seus outros desejos só se referem ao ser fugidio e mortal. Esta aspiração viva, fervorosa, dirigida para uma certa mulher, é pois um penhor da indestrutibilidade da essência do nosso ser e da sua continuidade na espécie». (..)
«Essa essência oculta é justamente o que está no fundo da nossa consciência e lhe forma o nódulo central, o que é mesmo mais imediato que essa consciência; e, na sua qualidade de "coisa em si", liberta do "principium individuationis", essa essência é absolutamente idêntica em todos os indivíduos, quer existam simultaneamente, quer se sucedam. É a isso que eu chamo, por outras palavras, "vontade de viver", isto é, essa aspiração premente à vida e à duração.»
(Schopenhauer, ibid, pág. 65-66).
Aparentemente muito distante de Hegel, Schopenhauer não escapa ao traço nivelador do século XIX quando admite que a essência de cada homem é, principalmente, o princípio da espécie, a vontade de viver coletiva, e não o princípio da individuação que é fonte do egoísmo pessoal.
A INTELIGÊNCIA ABSTRATA DO HOMEM E A INTELIGÊNCIA CONCRETA E IMEDIATISTA DA MULHER
O senso prático na mulher é mais intenso do que no homem, segundo Schopenhauer. Mas senso prático não significa sempre bom senso. Significa que a mulher está mais atenta aos pormenores visíveis do quotidiano - elas reparam mais nas unhas ou nos sapatos que o homem usa do que nós nos correspondentes adereços delas; e compram, certamente, géneros mais baratos e de melhor qualidade nas lojas do que se fossem os maridos a fazê-lo. A mulher é capaz de gozar mais o momento do que o homem e, por isso, de ser mais alegre.
«Quanto mais nobre e perfeita é uma coisa, tanto mais lenta e tardiamente se desenvolve. A razão e a inteligência do homem só atingem pleno desenvolvimento aos vinte e oito anos; na mulher a maturidade do espírito dá-se aos dezoito anos. Por isso, só tem uma razão de dezoito anos, estritamente medida. É esse o motivo por que as mulheres são toda a vida verdadeiras crianças. Só vêem o que têm diante dos olhos, agarram-se ao presente, tomando a aparência pela realidade e preferindo as ninharias às coisas mais importantes.»
«O que distingue o homem do animal é a razão; confinado no presente, lembra-se do passado e pensa no futuro: daí a sua prudência, os seus cuidados, as suas frequentes apreensões. A razão débil da mulher não sofre dessas vantagens nem desses inconvenientes; sofre duma miopia intelectual que lhe permite, ver de uma maneira penetrante as coisas próximas; mas o seu horizonte é limitado, escapa-se-lhe o que está distante. Daí resulta que tudo quanto não é imediato, o passado e o futuro, atuam mais fracamente na mulher do que em nós: daí também a tendência muito mais frequente para a prodigalidade, e que por vezes toca as raias da demência.»
«No seu íntimo, as mulheres entendem que os homens são feitos para ganhar dinheiro e elas para o gastar; e se o não podem fazer durante a vida do marido, desforram-se depois da morte dele.» (...)
«Em circunstâncias difíceis é preciso não desdenhar recorrer, como outrora os Germanos, aos conselhos das mulheres, porque elas têm uma maneira de conceber as coisas totalmente diferentes da nossa. ´Vão direitas ao fim, pelo caminho mais curto, porque fixam geralmente os olhares no que têm mais à mão. Nós, pelo contrário, não vemos o que nos salta aos olhos, e vamos procurar muito mais longe; precisamos que nos levem a uma maneira de ver mais simples e mais rápida. Acrescente-se ainda que as mulheres têm decididamente um espírito mais ponderado, e só vêem nas coisas o que nelas há realmente; ao passo que nós, impelidos pelas paixões excitadas, aumentamos os objetos e representamos quimeras.»
«As próprias aptidões naturais explicam a piedade, a humanidade, a simpatia que as mulheres testemunham aos desgraçados, ao passo que são inferiores aos homens no que respeita à equidade, à retidão e à escrupulosa probidade. Devido à fraqueza da sua razão, tudo o que é presente, visível e imediato, exerce sobre elas um domínio contra o qual não conseguiriam estabelecer as abstrações, nem as máximas estabelecidas, nem as resoluções enérgicas, nem consideração alguma do passado ou do futuro, do que está afastado ou ausente. Possuem da virtude as primeiras e principais qualidades, mas faltam-lhe as secundárias e acessórias...
«Assim a injustiça é o defeito capital dos temperamentos femininos. Isto resulta da falta de bom senso e de reflexão que apontamos; e o que agrava ainda este defeito, é que a natureza, recusando-lhes a força, deu-lhes a astúcia para lhes proteger a fraqueza; daí a sua instintiva velhacaria e a invencível tendência para a mentira.» (...)
«Deste defeito fundamental nascem a falsidade, a infidelidade, a traição, a ingratidão, etc.»
(Schopenhauer, Ensaio acerca das mulheres, in Metafísica do amor, páginas 74-77; o negrito é posto por mim).
Este texto de Schopenhauer, extraordinariamente interessante e polémico, faz estremecer de indignação o universo feminino libertário e demo-liberal atual que faz passar as ideias de que «as mulheres são mais inteligentes do que os homens» e de que «quase não houve mulheres filósofas consagradas nos séculos que transcorreram porque a educação literária e a escolaridade eram praticamente só reservadas aos homens.»
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