A função de verdade dita condicional ou implicação na lógica proposicional simboliza-se S →P. Por exemplo, «Se chover»(proposição S) «então levarei guarda-chuva» (proposição P).
Escreve um manual do 11º ano de filosofia da Santilhana:
«A implicação material é uma operação intelectual que relaciona condicionalmente os valores lógicos de duas proposições simples.
«Por exemplo: P→Q «Se tirar a carta, então vou comprar carro»
«Qual é a regra da implicação?
«Regra da implicação: A implicação só é falsa se o antecedente for verdadeiro e o consequente falso. Nos outros casos é sempre verdadeira».
«Qual é a tabela de verdade da implicação?
«A tabela de verdade da implicação é a seguinte:
P Q P→Q
V V V
V F F
F V V
F F V
(Amândio Fontoura, Mafalda Afonso e Maria de Fátima Vasconcelos, Essencial Filosofia 11º, Santillana, pág 73).
É fácil verificar a falsidade desta tabela de verdade aplicando-a a exemplos concretos (lógica material).
Consideremos a proposição complexa «Se há pegadas de dinossauro na Serra de Aire e Candeeiros (P), então a Lua completa em 27,3 dias a sua órbita em torno da Terra (Q)».
Ambas as proposições simples são verdadeiras e, segundo a tabela de «verdade», a implicação será verdadeira. Mas não é, porque a relação entre pegadas de dinossauro na serra X e mês sideral da Lua é meramente acidental, não existe sequer: quer haja ou não pegadas de dinossauro a Lua leva sempre 27,3 dias na sua órbita em torno da Terra.
Consideremos as proposições simples "Os átomos existem" (P) e "As moléculas existem" (Q). Construamos a proposição complexa «Se os átomos não existem ( ¬ P) então (→ )as moléculas existem (Q)». Segundo a tabela de verdade acima, sendo ¬ P falsa (porque os átomos existem) e Q verdadeira (as moléculas existem) a implicação será verdadeira. Ora não é isso que sucede: não havendo átomos implica não haver moléculas porque estas são agregados de átomos, logo a proposição «Se os átomos não existem (¬ P) então as moléculas existem (Q)» é uma implicação falsa.
Não basta considerar o valor de verdade de cada uma das proposições simples é necessário centrar-se no tipo de implicação: se é necessária, fundada na causalidade ou no sincronismo, ou contingente, fundada na ficção, no imaginário... Mas sobre isto a lógica proposicional nada diz. Não está bem construída, não foi bem pensada.
O que fazem os arautos da lógica proposicional em Portugal na universidade e no ensino secundário- João Branquinho, Ricardo Santos, Guido Imaguirre, João Sàágua, Domingos Faria, Aires Almeida, Rolando Almeida, Luís Veríssimo, Pedro Galvão e outros - senão ensinar estas erróneas teses e asim contribuir para estupidificar os alunos de filosofia?
Tenham a coragem de fazer autocrítica e condenar a lógica proposicional! Os vossos mestrados e doutoramentos não impedem que lavreis no erro. Não servem para nada, senão para transmitir conhecimentos fragmentados, mistos de verdade e erro. Extingam-se as cátedras de filosofia na universidade, ocupadas por incompetentes que se cooptam entre si, acabe-se com o autoritarismo sectário e pseudo-científico da filosofia analítica e outras: as cátedras são tão prejudiciais ao saber quanto o Tribunal da Santa Inquisição o foi para a descoberta de Deus e o livre pensamento.
© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
Vários equívocos integram o livro do professor Filosofia 11º ano, de Adília Maia Gaspar e António Manzarra, tendo como consultor científico o Professor Doutor João Sàágua, da Raíz Editora.
OMISSÃO DA TEORIA DAS QUALIDADES SECUNDÁRIAS E PRIMÁRIAS EM DESCARTES
Uma das pedras de toque que distingue os autores que sabem e os que não sabem ontognosiologia é a explanação que fazem do racionalismo de Descartes, da sua teoria do conhecimento, do percurso desde a dúvida hiperbólica até à demonstração do mundo exterior de matéria. Ora esse percurso não é explanado devidamente neste manual, com os pormenores essenciais:
«Admitida a existência de Deus, Descartes aceita a existência do mundo material e a possibilidade de o conhecer, uma vez que Ele, sendo perfeito, não iria querer que o pensamento estivesse enganado em relação à ideia da existência do mundo. Mas acautela para as exigências metodológicas a que o espírito se deve submeter:
Partir de princípios evidentes -ideias claras e distintas, apreendidas por intuição racional.
Raciocinar dedutivamente. »
(Adília Maia Gaspar e António Manzarra, Filosofia 11º ano, consultor científico Professor Doutor João Sàágua, Raíz Editora, pág. 159).
Falta explicar a transição, em concreto, da existência simultanea e única de Deus e do cogito humano ao mundo exterior e a constituição ontológica deste. O raciocínio de Descartes, que o manual ignora, é do seguinte teor:
4º PASSO (da Existência de Deus e do eu pensante à existência do mundo material)
«Se Deus existe e é verdadeiro nos seus actos, não consentirá que eu me engane em tudo o que vejo, sinto e ouço, logo existe o mundo de matéria, feito só de qualidades primárias, objetivas, isto é, forma, tamanho, número, movimento. As cores, os cheiros, os sons, sabores, o quente e o frio só existem no interior da minha mente, do organismo do sujeito, pois resultam de movimentos vibratórios exteriores já que o mundo exterior é apenas composto de formas, movimentos e tamanhos. .Assim, a rosa não é vermelha, é apenas forma e tamanho. O ramo de rosas é apenas formas, tamanho e um certo número de unidades, não tem cor, nem cheiro, nem peso. O mármore não é frio nem duro, o céu não tem cor.»
Nada isto é explicado no manual. É a habitual vagueza da filosofia analítica na ontognosiologia, excepção feita a Johnathan Dancy que, no entanto, comete erros notáveis.
Realismo crítico é a teoria gnosiológica segundo a qual há um mundo de matéria exterior ao espírito humano e este não capta esse mundo como é, mas distorcido por alguma percepção empírica.
A RACIONALIDADE FILOSÓFICA NÃO É DEMONSTRATIVA? LIMITA-SE A SER ARGUMENTATIVA?
O manual sustenta que «a filosofia não pode demonstrar nada mas apenas pode argumentar críticamente»:
«Por outro lado, a própria filosofia, através dos tempos, mostrou bem pouca estabilidade, apresentando uma sucessão de sistemas filosóficos não só diferentes, como, por vezes, contraditórios.»
«Por tudo isto, hoje considera-se que a filosofia pode tão-somente aspirar a ser razoavelmente persuasiva, socorrendo-se de processos retórico-argumentativos para defender as suas teses». (...)
« O facto de a racionalidade filosófica ser argumentativa não retira valor à filosofia. Continua a caber-lhe um importante papel na elucidação de conceitos e de problemas e reveste-se de inegável valor para a humanidade».
(Adília Maia Gaspar e António Manzarra, Filosofia 11º ano, consultor científico Professor Doutor João Sàágua, Raíz Editora, pág. 128; o destaque a negrito é de minha autoria).
A filosofia é apenas argumentativa e a ciência é demonstrativa? Este é o erróneo ponto de vista do positivismo lógico que não descobre a filosofia subjacente a teses científicas. É falsa a dicotomia : «a filosofia argumenta, a ciência demonstra.» Aliás, segundo Popper, tanto a filosofia como as ciências empíricas argumentam, corroboram, não demonstram. Enganou-se, em parte.
O meu ponto de vista é outro. A filosofia de Hegel demonstra, por exemplo, que o processo dialético, inerente a todas as coisas, se caracteriza pela tríade tese-antítese- síntese através de numerosos exemplos: à contra-revolução dominante (tese) segue-se um período revolucionário em que a radicalização aumenta até outro extremo (antítese) e depois há uma oscilação para o centro, estado de conciliação de extremos (síntese). A lógica triádica exposta por Hegel pode demonstrar-se e não apemas argumentar-se. E isto é mais demonstrativo do que a tese de o universo se ter originado no Big Bang ou de haver «quarks up» e «quarks down» ou de «se adquirir imunidade às doenças através da vacinação».
Também o princípio do terceiro excluído - uma coisa ou pertence a uma classe A ou pertence às classes não A, excluindo-se a terceira hipótese - é um princípio lógico, filosófico, que se pode demonstrar sem refutação possível.
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Vários manuais de lógica e de filosofia definem argumento válido de forma incompleta ou mesmo tautológica.
João Sàágua define assim argumento válido:
«Def 3. Argumento válido. Um argumento é válido se o conjunto das suas premissas tem como consequência a conclusão.»
«Tendo em consideração as explicações dadas acima sobre a verdade das frases e consequência, temos que um argumento pode ser válido com premissas e conclusão verdadeiras, com premissas falsas e conclusão verdadeira, e com premissas e conclusão falsas.»
(João Sàágua, Lógica para as Humanidades, Universidade Nova de Lisboa, Edições Colibri, 2001, pag 3).
Sem embargo de Sàágua ser um especialista em lógica proposicional parece-me bastante vaga esta definição de «argumento válido». Que significa «ter como consequência»? Há a consequência acidental, que chega por conexão fortuita, e a consequência apodítica, por conexão essencial...
João Sàágua dá a seguinte definição:
«Def 2 Consequência (1ª versão) Um conjunto de frases tem como consequência uma frase se e só se, não é possível que as frases desse conjunto sejam todas simultaneamente verdadeiras e que a frase em questão seja falsa.» (J. Sàágua, ibid, pag 2).
Dou um exemplo com o seguinte argumento, no sentido de demonstrar que há consequências que não são dedutivamente válidas nem inválidas e, portanto, a consequência em geral não é condição imprescindível da validade de um argumento:
«Fui ao Algarve. Passei na A22.
«Cheguei a Armação de Pera.
«Logo, fui à praia, vi o mar azul».
Ir à praia é uma consequência necessária de ir a Armação de Pera? Ou uma consequência fortuita? É uma consequência fortuita. Posso ir a Armação de Pera e ficar à entrada da vila, junto à EN125, sem sequer ver a praia e o mar.
Este argumento é dedutivamente válido? Não me parece, ainda que a sua estrutura, feita de conjunções de proposições, não acarrete necessariamente invalidez. Sem dúvida, é um argumento indutivamente válido. Dedutivamente, é neutro, de validade indecisa - não é válido em acto.
A minha definição de argumento válido é: aquele em que a conclusão está contida de forma actual nas premissas consideradas de forma abstracta (argumento dedutivamente válido) ou em que a conclusão está contida potencialmente nas premissas consideradas de forma concreta, substancial ou empírico-ideal (argumento indutivamente válido).
Exemplo de argumento dedutivamente válido (mas material ou indutivamente inválido):
«As batatas são girassóis.»
«Os elefantes são batatas»
«Os elefantes são girassóis».
O esqueleto (validade formal) do argumento está correcto. É dedutivamente válido.
Exemplo de argumento indutivamente válido (mas dedutivamente inválido):
«Até hoje, biliões de seres humanos morreram sem completar 200 anos de idade.»
«No futuro, nenhum ser humano conseguirá completar 200 anos de vida».
O carácter dedutivo de um argumento implica sempre uma apoditicidade ou necessidade, real ou aparentemente real, lógica ou suposta por indução. Desidério Murcho, por exemplo, equivoca-se ao defender o seguinte:
«Também há argumentos dedutivos cuja validade não depende inteiramente da sua forma lógica. Os seguintes argumentos, por exemplo, são dedutivamente válidos:
A neve é branca.
A neve tem cor.
Kant era solteiro.
Logo, não era casado.
Contudo a validade destes argumentos não pode ser estabelecida recorrendo unicamente à forma lógica...» (Desidério Murcho, Pensar outra vez, filosofia, valor, verdade, Edições Quasi, V.N.Famalicão, 2006, pag 115-116).
É óbvio que o primeiro exemplo é válido recorrendo apenas à sua forma lógica, ao contrário do que sustenta Desidério Murcho. De facto, trazendo à luz a premissa maior, oculta, temos o seguinte silogismo:
O branco/a é uma côr.
A neve é branca.
A neve tem cor.
A validade deste argumento demonstra-se só pela sua estrutura formal:
A pertence a B.
C pertence a A.
Logo C pertence a B. (A=branco; B=côr; C=neve)
O conceito de válido não pode dissociar-se completamente do conceito de verdadeiro: válido, no plano dedutivo, significa abstractamente ou formalmente verdadeiro ainda que, em muitos casos, se ligue a conteúdos empírico-ideais materialmente ou idealmente falsos.
O erro do texto de João Sáàgua, transcrito no início deste artigo, radica em não distinguir dois tipos de validade: formal-dedutiva e material-indutiva.
Nota: Na 5ª feira, 4 de Outubro de 2007, das 18.15 às 19.15 horas, haverá leitura e comentário (debate) de excertos de textos de Ludwig Wittgenstein, no anfiteatro da Escola Secundária Diogo de Gouveia, em Beja, organizado pelo grupo de professores de filosofia dessa escola. A entrada é livre.
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