Eis um teste de filosofia do 1º período que se insere nas linhas abertas do programa de filosofia do 10º ano de escolaridade em Portugal.
Agrupamento de Escolas nº1 de Beja
Escola Secundária Diogo de Gouveia, Beja
TESTE DE FILOSOFIA, 10º ANO TURMA C
18 de Outubro de 2016. Professor: Francisco Queiroz
I
“Heráclito era panteísta mas Platão defendia um teísmo. A filosofia comporta metafísica, ética, estética e epistemologia. A racionalidade dos filósofos reduz a uma unidade ou a uma dualidade a multiplicidade das aparências empíricas.”
1)Explique, concretamente este texto.
2) Relacione, justificando:
A) Yang, Yin e Tao no taoísmo.
B) Epithymia em Platão e corpo como cárcere da alma.
C) Demiurgo, Arquétipo e teoria da participação, em Platão.
D) Subjectivismo e ideologia.
CORREÇÃO DO TESTE COTADO PARA 20 VALORES
1) Heráclito era panteísta, isto é, defendia que os deuses não existem acima e fora da natureza biofísica mas fundem-se com esta,estão dentro desta. Declarou: «Deus é a abundância e a fome, o dia e a a noite, o Inverno e o Verão; embora assuma múltiplas formas, à semelhança do fogo que, aspergido por aromas, toma o nome dos perfumes que exala». Platão era teísta, isto é, sustentava que Deus ou arquétipo do Bem estava fora da natureza física, num mundo inteligível, acima do céu visível e que um deus inferior, o demiurgo, desceu à matéria moldando nesta cópias das formas dos arquétipos de Árvore, Cavalo, Montanha, Homem, etc, criando assim o Mundo Sensível (Kósmos Asthetos) (VALE TRÊS VALORES). A filosofia ou arte de pensar racionalmente e especulativamente a vida, o mundo, o homem e as divindades comporta metafísica, isto é, especulação sobre o suprafísico e o infrafísico, o mundo incognoscível do «além» ou da psique humana, ética, isto é, doutrina do bem e do mal, do justo e do injusto na ação humana, estética, isto é, doutrina do belo e do feio, epistemologia, isto é, interrogação e reflexão sobre as ciências (ex: será que as vacinas previnem as doenças ou infectam o corpo?) (VALE TRÊS VALORES). A racionalidade, isto é, o pensamento lógico dos filósofos reduz a uma unidade, a uma só essência, as muitas aparências das coisas, os milhões de objectos físicos - é o caso da filosofia de Tales que diz que a água, uma única essência, é o constituinte de tudo, árvores, pedras, terra, animais, etc - ou a uma dualidade,isto é, a dois princípios opostos - é o caso da ontologia de Platão em que a dualidade engloba os arquétipos do Mundo Inteligível e a matéria caótica do Sensível (VALE TRÊS VALORES).
2) A) O Tao é a mãe do universo, algo de obscuro e silencioso que circula por toda a parte e é o modelo do céu e divide-se em duas ondas formando uma sinusoidal: o Yang (alto, calor, dilatação, verão, som, sol, vermelho, movimento, exterior) e o Yin (baixo, frio, contração, inverno, silêncio, lua, azul, imobilidade, interior). A sucessão dos dias e das noites, do trabalho e do repouso das sementeiras e colheitas, representa o ritmo yang-yin, faz parte do Tao do universo. (VALE TRÊS VALORES)
2)B) Epithymia ou concupiscência é, segundo Platão, a parte inferior da alma que contém os prazeres da carne (comer, beber, possuir propriedades agrícolas, ouro e prata) e acaba por prender o Nous ou parte superior da alma que aspira a subir ao Inteligível. Assim o corpo, a epithymia, com o peso das suas paixões materiais aprisiona a alma espiritual (VALE TRÊS VALORES).
2)C) Arquétipo é um modelo de perfeição - há os arquétipos de Bem, Belo, Justo, Número Um, Número Dois, Triângulo, Cubo, Cone, Esfera, Homem, Mulher, Árvore, etc- imóvel, espiritual e eterno, num mundo acima do céu, que serve de modelo ao deus operário ou demiurgo na construção do mundo Sensível inferior. Este desce à matéria caótica e molda nela formas semelhantes às de cada arquétipo. Assim os cavalos físicos, as montanhas físicas participam ou imitam os arquétipos de cavalos e montanhas. (VALE TRÊS VALORES).
2)D) Subjectivismo é a teoria que afirma que a verdade varia de pessoa a pessoa, é íntima, subjectiva. Ideologia é uma doutrina, um conjunto de ideias e valores, característicos de uma dada classe ou grupo social - exemplos: o liberalismo, o fascismo, o comunismo, o judaísmo, o islamismo - que, podendo ser objectivos, isto é, professados por milhões de pessoas, implicam escolhas subjectivas (VALE DOIS VALORES).
© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
Eis um teste de filosofia . Evitamos as perguntas de escolha múltipla que, por vezes, enfermam de um deformado espírito de «minúcia» frequentemente manchado por falácias disjuntivas.
Agrupamento de Escolas nº1 de Beja
Escola Secundária Diogo de Gouveia , Beja
TESTE DE FILOSOFIA, 10º ANO TURMA C
29 de Outubro de 2014. Professor: Francisco Queiroz
I
“Em Tales de Mileto, como em Heráclito, as múltiplas aparências empíricas ocultam uma só essência. As essências em Platão são transcendentes e em Aristóteles são imanentes. A filosofia combina, em diferentes proporções, cepticismo, dogmatismo e relativismo. A teoria hilemórfica de Aristóteles sustenta que a proté ousía brota de dois princípios opostos, um dos quais existe originariamente em potência».
II
2. Relacione, justificando;
A) Filosofia, racionalidade, especulação e empiricidade.
B) Esfera dos valores vitais e sentimentais e esfera dos valores espirituais, na teoria de Max Scheler
C) Demiurgo, doutrina da participação e reminiscência em Platão.
D) O tó tí, o tó on, o ser (einai) e a espécie (eidos) na teoria de Aristóteles.
CORRECÇÃO DO TESTE COTADO PARA UM TOTAL DE 20 VALORES
1-) Em Tales de Mileto, as múltiplas aparências empíricas - exemplo: as montanhas, os céus, os rios, os animais, as árvores - são feitas de uma mesma essência que é a água, o arquê ou princípio material do universo. Deus, inteligência que não criou a água, moldou a partir desta o cosmos. Em Heráclito, as múltiplas aparências empíricas ou seja os muitps objectos que aparecem aos orgãos sensoriais são uma só coisa, isto é, fogo transformado, arrefecido de diversos modos. (VALE TRÊS VALORES). As essências são as formas eternas e imutáveis tanto em Platão como em Aristóteles. Em Platão, elas são arquétipos de Bem, Belo, Justo, Número Um, Número Dois, Triângulo, Homem, etc, existentes no mundo Inteligível acima do céu visível, por isso são transcendentes, estão além (trans) do universo físico. Em Aristóteles, as essências são formas eternas e imóveis inerentes ou imanentes aos objectos físicos - exemplo: a essência sobreiro está em todos os sobreiros reais, físicos, porque não há mundo inteligível (VALE DOIS VALORES). A filosofia, ou interpretação autónoma do mundo e da vida, implica cepticismo, doutrina que diz ser impossível chegar à verdade, conhecer a estrutura oculta das coisas e os seus fins, dogmatismo, doutrina que afirma certezas diversas, relativismo, doutrina que afirma que a verdade e os valores variam de época a época, de povo a povo, de classe a classe social e até de pessoa a pessoa (VALE TRÊS VALORES). A teoria hilemórfica (hyle é matéria-prima universal; morfos é forma) de Aristóteles sustenta que cada coisa individual ou primeira substância (proté ousía) como, por exemplo, este cavalo cinzento, se forma da união entre a forma eterna de cavalo que existe algures e a hylé ou matéria-prima universal, indiferenciada, que não é água nem fogo nem ar, nem terra mas que estava em potência, isto é não existia a não ser virtualmente mas passa a existir em acto ao juntar-se à forma (VALE DOIS VALORES).
2-A) A filosofia, ou interpretação livre do mundo e da vida, comporta racionalidade, isto é, lógica, especulação, isto é, formulação de teses mais ou menos indemonstráveis através da experiência - como por exemplo: o mundo é um fogo eterno que ora se acende ora se extingue; Deus está rodeado de nove coros de anjos; não há vida espiritual após a morte corporal - e empiricidade, isto é, uma apreciável quantidade de dados empíricos - as manchas de petróleo nos mares são coisas empíricas que entram na filosofia ecologista; os campos cultivados por cooperativas agrícolas são factos da experiência que entram nas filosofias socialista e comunista. (VALE TRÊS VALORES).
2-B) A esfera dos valores vitais e sentimentais é a dos valores anímicos situada entre o prazer e a dor puros, vegetativos, e os valores intelectuais. Comporta os seguintes valores: nobre e vulgar, sentimentos de vitória ou de derrota, de juventude e de doença, de ciúme ou de tranquilidade afectiva, de coragem ou de cobardia, de paixão amorosa e ódio, etc. A esfera dos valores espirituais, em Max Scheler, engloba os valores éticos (bem, mal; justo-injusto), estéticos (belo-feio), filosóficos (verdadeiro-falso) e os valores anexos de referência do direito (legal-ilegal) e das ciências empíricas (verdadeiro utilitário- falso utilitário), sendo uma esfera mais intelectual do que a dos valores vitais. (VALE DOIS VALORES).
2-C) O demiurgo é o deus operário que desceu do mundo inteligível e com a ajuda dos deuses do Olimpo imprimiu na matéria no caos as formas dos arquétipos de árvore, de leão, de homem, de montanha, etc, gerando assim o mundo sensível do devir ou mundo do outro. A esta imitação dos arquétipos na matéria chama-se doutrina da participação. A reminiscência é a lembrança vaga que cada alma (Nous) guarda do mundo dos arquétipos onde esteve antes de encarnar (exemplo: tenho a reminiscência de triângulo e é dela que extraio o saber de que a soma dos seus 3 ângulos internos é 180º) e é também um aspecto da doutrina da participação, visto que liga o mundo superior ao mundo inferior (VALE DOIS VALORES).
2-D) O tó tí é o quê-é ou seja a forma, essencial ou acidental, de algo. Exemplo: o tó tí da espiga de trigo é a forma desta e distingue-se do tó tí da espiga de milha e do tó tí do rosto humano. O tó ón é o ente, o que é, o existente, qualidade que é comum aos diferentes tó tís: o tó ón da espiga de trigo não se distingue do da espiga de milho. O ser ou einai é para Aristóteles o existir, um predicado geral: os homens são, as árvores são, os números são, etc. A espécie (eidos) é a forma comum a vários indivíduos e, por isso, cada espécie tem um tó tí próprio. (VALE TRÊS VALORES).
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© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
Na Historia de la Filosofia escrita por Guillerme Fraile afirma-se, de forma surpreendente, que Platão não tinha poder de abstracção para extrair de uma multiplicidade de casos particulares uma essência universal:
«Platón no asciende de lo particular a lo universal, sino de los particular (seres ontológicos individuales del mundo sensible) a lo particular (seres ontológicos individuales del mundo suprasensible), de lo móvil a lo inmutable, de lo visible a lo invisible, de lo sensible a lo inteligible. No hay abstracción en sentido psicológico, sino solamente un intento de ascensión, de elevación, de trascendencia, del mundo sensible al suprasensible de las ideas.» (Guillermo Fraile, Historia de la Filosofía, II, 1º, Biblioteca de Autores Cristianos, Madrid, Pág. 357; a letra a negrito é nossa).
A leitura do magnífico diálogo «Parménides ou das Ideias» de Platão desmente esta apreciação obtusa de Guillhermo Fraile:
«- Que é que se opõe, Parménides, a que a ideia entre integralmente em cada um dos múltiplos objectos? - volveu Sócrates.
- Desse modo a ideia, una e idêntica, encontrar-se-ia em toda a integridade e simultaneamente, numa multidão de objectos separados uns dos outros; por consequência ficaria separada de si mesma.
- Não - respondeu Sócrates; - assim como o dia, embora seja uno e idêntico, existe simultaneamente em muitos lugares diferentes, sem se separar de si mesmo, também cada ideia estaria ao mesmo tempo em muitas coisas, sem deixar, por isso, de ser uma só e mesma ideia.» (Platão, Parménides ou das Ideias, Editorial Inquérito, Pág 25).
Este texto revela que Platão possuía plena capacidade de abstracção especultativa ao dizer que cada ideia una se dá na multiplicidade das coisas que lhe correspondem.
Se Platão singularizou cada ideia do mundo inteligível, não é por falta de poder de abstracção, mas justamente o oposto: é pela singularização que o aristocrata, o depositário do valor superior em qualquer área - na pintura, na filosofia, na astrofísica, na biologia, etc - se distingue da multidão. Ora as ideias de Belo, Justo, Bom teriam de ser paradigmas únicos, em si mesmas, que no entanto se oferecem à multiplicidade dos seres no mundo do Outro pela participação.
© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
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