É sabido que a Árvore da Vida, da Cabala Judaica, é composta de 10 Sefirotes (Esferas) cada uma delas representando um atributo de Deus ou da sua criação. Em cima tem um triângulo com Kether (Coroa) no vértice superior e Hokmah, a sabedoria masculina, no cimo da coluna da direita, e Binah, a inteligência feminina, no cimo da coluna da esquerda. A última Sefirote, Malkut, é o Reino, composto de matéria física, do qual Deus está ausente. Deus, o Ein Sof (Nada Infinito) só intervém directamente na tríade superior da Árvore.
Kheter
Binah Hokmah
Guevurah Chesed
Thipheret
Hod Netzac
Yesod
Malkut
Philip Gardiner escreveu:
«Os amuletos são manifestações físicas mágicas de uma crença. (...) O Olho de Hórus dos templos egípcios era um amuleto semelhante, usado em associação com a regeneração do Eu, da saúde e da prosperidade. Hórus era chamado de Hórus, aquele que governa com dois olhos, o que é uma indicação do equilíbrio que Hórus alcançou a partir dos seus olhos esquerdo (Sol) e direito (Lua). Hórus, claro, partilha muitas semelhanças com a figura do Cristo retratado na Bíblia.»
(Philip Gardiner, Gnose, Editorial Estampa, pp. 103; o destaque a negrito é posto por nós)
E sobre a Shekinan escreve ainda:
«A Shekinah é o princípio feminino, o Espírito Santo, e mais. É a rota para o conhecimento divino ou gnose e, se se reveste de roupagens, basicamente temos de aprender a despi-la, como o cântico de Salomão relata com tanta beleza. É a árvore, mais uma vez, que é usada simbolicamente para explicar como podemos tornar-nos unos com a Shekinah. A árvore produz frutos graças à água que Deus providencia. A água de Deus é chamada hokmah, que significa sabedoria. É a Sofia (ou sabedoria) que torna possível à árvore produzir o fruto, que é a alma do homem recto. A Shekinah só habita com os justos, e só através da hiero gamos ou União Sagrada dos princípios masculino e feminino isso é possível.»
(Philip Gardiner, Gnose, Editorial Estampa, pág. 107; o destaque a negrito é posto por nós)
A ideia de que o Espírito Santo é o Princípio Feminino não está visível na teologia católica que o representa na forma de uma pomba. E se a Virgem Maria concebeu do Espírito Santo, isto é, o feminino Maria concebeu Jesus a partir do princípio Feminino isto sugere a reprodução biológica sem a intervenção do princípio Masculino. São José era um varão casto, que não possuiu Maria.
© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
Orlando Braga (20 de Fevereiro de 1958, ao início da madrugada), um intelectual monárquico e católico do Porto, um polemista temível, autor de blogs com críticas inteligentes e desassombradas à ideologia da globalização dos Bilderberg e da Trilateral e ao fascismo bonapartista dos mundialistas, à «apostasia do papa Francisco», e a muitos aspectos da vida política e cultural portuguesa, publicou em 6 de Outubro de 2014 o post «Erros do taoísmo» no seu blog espectivas.worldpress.com. Aí escreveu:
«.Depois de estudar as religiões (ou as “filosofias místicas orientais”, como está na moda dizer-se em vez de “religiões”) do Oriente, cheguei à conclusão de que o catolicismo é a forma religiosa mais evoluída. Temos, por exemplo, o Taoísmo que está na moda nos meios culturais de certas “elites”. Os conceitos de Yang e Yin partem do princípio de que “os opostos se complementam”, por um lado, e por outro lado de que “os opostos se anulam no Tao”. » (Orlando Braga)
Crítica minha: os opostos anulam-se no Tao? Não é verdade. O Tao não se divide em opostos enquanto origem, unidade primordial, princípio metafísico: mas, enquanto movimento «sinusoidal» da natureza divide-se em dois contrários, está composto de oscilações permanentes, de Yang (dilatação, calor, subir, fluxo, espírito) e de Yin (contração, frio, descer, refluxo, matéria), verão (Yang)- inverno (Yin), dia (Yang)-noite (Yin), diástole (Yang)- sístole (Yin), fluxo da onda (Yang)-refluxo da onda (Yin). Os opostos não se anulam, antes geram-se mutuamente no Tao, o que coincide com as doutrinas de Heráclito e Hegel do perpétuo devir como luta de contrários.
O TAOÍSMO NEGA A TRANSCENDÊNCIA?
Escreve ainda Orlando:
«Jesus Cristo não negou a existência dos opostos; pelo contrário, chamou-nos à atenção para eles. Mas Ele apelou para a transcendência, para além da imanência: os opostos eram por Ele considerados meios (para algo transcendente) e não fins em si mesmos (como acontece no Taoísmo). » (Orlando Braga)
Crítica minha: é um pouco confuso dizer que o taoísmo considera os opostos como fins em si mesmos e que não apela para a transcendência. O taoísmo não nega a transcendência: convida a contemplá-la como zona de obscuridade que é. E neste campo coincide com os cabalistas judaicos que falam do Ein-Sof (o Nada incognoscível) que é a divindade além do Deus revelado (Iavé, Eloim, etc) e com os místicos alemães que falam de Deus e da deidade como mestre Eckhart. No taoísmo, definido como um quietismo místico individualista («dominar o sopro vital pelo espírito é ser forte», escreveu Lao Tse) a alma sobe em direcção ao Tao, a Mãe do universo.
Lao Tse (601-517 a.C), filósofo do taoísmo escreveu:
«O Tao que se procura alcançar não é o próprio Tao;
o nome que se lhe quer dar não é o seu nome adequado.»
«Sem nome, representa a origem do universo;
com um nome, torna-se a mãe de todos os seres.
Pelo não-ser, atinjamos o seu segredo;
pelo ser, abordemos o seu acesso.
Não-Ser e Ser saindo de um fundo único só se diferenciam pelos seus nomes.
Esse fundo único chama-se Obscuridade.
Obscurecer esta obscuridade, eis a porta de toda a maravilha.» (Lao Tse, Tao Te King, Editorial Estampa, pag 13)
Sem os ritos do confucionismo chinês, religião de Estado, o taoísmo preconiza uma ascese que não é pura imanência mas a contemplação metafísica da natureza e o abandono do estudo livresco e da carreira política, a meditação («Aquele que fala não sabe/ aquele que sabe não fala. Cerra a tua abertura/fecha a tua porta/ cega o teu gume/ desata todos os nós/ funde numa só luz todas as luzes - diz Lao Tse) de tal modo que o santo poderia atingir uma "ilha dos bem aventurados" - do mesmo tipo da ilha de Avalon, onde estaria o Santo Graal, na quarta dimensão, como, possivelmente, Orlando Braga acreditará. Isto não é transcendência?
A LUZ COMO ONDA NÃO SE OPÕE À LUZ COMO FEIXE DE PARTÍCULAS? OS CONTRÁRIOS NÃO SE COMPLEMENTAM?
Escreve ainda Orlando Braga:
«Por outro lado, segundo o Cristianismo original, “aquilo que se opõe não se complementa”: dizer que “duas coisas que se opõem se complementam”, é uma contradição em termos. Só se complementam duas coisas que têm afinidades entre si, embora diferentes entre si. “Complementaridade” significa “diferença”, mas não propriamente “oposição”.
Por exemplo, a complementaridade onda / partícula, na física quântica, não significa que a onda se “oponha” à partícula: significa, em vez disso, que são estados diferentes de existência que encontram, na complementaridade, uma forma de ser. E se a existência se resumisse aos opostos (como defende o Taoísmo e Heraclito), não faria sentido a existência dos neutrões do átomo, que não se opõem a nada. » (Orlando Braga, «Erros do taoísmo», espectivas.worldpress.com; o destaque a negrito é posto por mim).
Orlando Braga não intuiu a lei dialética da unidade de contrários: em cada ente ou fenómenos há uma luta de contrários os quais, apesar de se oporem entre si, formam uma unidade (complementaridade). Aliás, na estrutura da luz, onda opõe-se a partícula: a luz não pode ser onda e partícula sob o mesmo aspecto ao mesmo tempo (princípio da não contradição). O termo opostos em Aristóteles tem uma acepção bastante mais vasta do que a que Orlando Braga lhe dá: contrário, contraditório, relativo e privativo. Aristóteles escreveu:
«E se a contradição, e a privação, e a contrariedade e os termos relativos são modos de oposição e o primeiro de eles é a contradição e se na contradição não há termo intermédio, enquanto que pode havê-lo entre os contrários, é evidente que contradição e contrariedade não são o mesmo.» (Aristóteles, Metafísica, Livro X, 1055 b, 1-5)
O neutrão é um intermédio de protão e electrão e opõe-se a ambos como semi-contrário - noção que já desenvolvi em outros posts deste blog. Há, por conseguinte, intermédios no modo de pensar dialético, o terceiro termo, a síntese existe. Convém esclarecer que um dos princípios do taoísmo é «em todo o Yang, há um pouco de Yin; em todo o Yin há um pouco de Yang» o que, traduzido em exemplos, dá fórmulas inquietantes como : em todo o homem, há um pouco de mulher; em toda a mulher, há um pouco de homem; em toda a bondade, há um pouco de maldade; em toda a maldade, há um pouco de bondade; em toda a democracia, há um pouco de totalitarismo; em todo o totalitarismo, há um pouco de democracia; em toda a monarquia há um pouco de república, em toda a república há um pouco de monarquia.
O NÃO-SER É UMA FORMA DO SER?
Afirma ainda Orlando Braga:
«Finalmente, e ao contrário do que defende o Taoísmo, os opostos não se anulam, porque se isso fosse verdade, teríamos que considerar, por exemplo, o Ser e o Não-ser em pé de igualdade de valor, isto é, teríamos que pensar que seria possível, por exemplo, a existência uma oposição entre o Ser e o Não-ser que redundasse na anulação dos dois. Ora, o Não-ser é uma forma de Ser; e por isso não pode haver uma oposição entre dois conceitos sendo que um deles está contido no outro.
O misticismo, em qualquer religião ou doutrina, só tem valor e é credível se partir de um princípio de respeito pela racionalidade e pela lógica. Foi também esse um dos legados que Jesus Cristo nos deixou através, por exemplo, das suas parábolas. » (Orlando Braga; o destaque a negrito é posto por mim).
Crítica minha: o não ser não é uma forma de ser. Já Parménides disse: «O ser é, o não ser não é...». Ser e não ser excluem-se mutuamente. O não existente não é uma forma de existente, pura e simplesmente está fora do círculo existencial. Quando o taoísmo fala em que o Tao abarca o ser e o não-ser, refere-se a ser e não-ser determinados (ser verão, não-ser verão, etc) e não a ser em abstracto. Porque ser e não ser, em abstracto, sem determinações, excluem-se em absoluto. Quanto à racionalidade e à lógica do evangelho de Cristo, que Orlando Braga enaltece, parece estar ausente em passagens do evangelho como esta:
«Eu vim trazer fogo à Terra, e que quero eu, senão que ele se acenda? Eu, pois, tenho de ser batizado num batismo, e quão grande não é a minha angústia, até que ele se cumpra? Vós cuidais que eu vim trazer paz à Terra? Não, vos digo eu, mas separação; porque de hoje em diante haverá, numa mesma casa, cinco pessoas divididas, três contra duas e duas contra três. Estarão divididas: o pai contra o filho, e o filho contra seu pai; a mãe contra a filha, e a filha contra a mãe; a sogra contra sua nora, e a nora contra sua sogra. (Lucas, XII: 49-53)
O taoísmo é místico em certa vertente, mas muito racional em outra. Se conhecesse o carácter político conservador do taoísmo de Lao Tse, que preconiza uma «ditadura sensata» sobre o povo, dando a este condições económicas dignas, talvez Orlando Braga não minimizasse esta filosofia em que, provavelmente, Salazar se inspirou. E sabe-se que Orlando alinha pela contra-revolução monárquica popular contra os excessos da esquerda e a deriva do centro para a esquerda. Eis o conselho de Lao Tse:
«Rejeita a sabedoria e o conhecimento,
Orlando Braga é prosélito do catolicismo e «de uma penada» liquida ou minimiza, sumariamente, o valor de outras religiões. Compreendo-o: também fui educado no preceito de que «ninguém se salva fora da igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo». Mas, racionalmente, há que estudar as outras religiões sem clubismo, tanto quanto possível. Do cristianismo, só podemos dizer que gerou a democracia contemporânea baseada no sufrágio universal e gerou-a sobretudo pela via do protestantismo, que contestou a inquisição e o papado romano.
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