Quinta-feira, 28 de Maio de 2020
Libertismo é uma propriedade do determinismo moderado, não é uma corrente autónoma

 

A noção de libertismo é confusa no «Dicionário Oxford de Filosofia» de Simon Blackburn e nos manuais e provas de exames de filosofia do ensino secundário. Simon Blackburn escreveu:

 

«Libertismo. Esta posição advoga que o compatibilismo (determinismo moderado) é apenas uma fuga e que há uma noção mais substantiva e real de liberdade que pode ainda ser preservada em relação ao determinismo (ou ao indeterminismo).»

(Simon Blackburn, Dicionário de Filosofia, Gradiva, Lisboa, 2007, pág 256).

 

O libertismo tal como Blackburn o define - a total liberdade isenta de pressões do determinismo - só pode existir no nível dos anjos e dos demónios, puros espítritos que não sofrem os dilemas que a matéria, o mundo corporal impõem.  Não existe libertismo distinto de determinismo biofísico com livre-arbítrio (determinismo moderado) excepto o indeterminismo biofísico com livre-arbítrio (exemplo: a lei da gravidade não funciona sempre, sou livre de me atirar de um prédio de 10 andares ao solo rezando previamente a Deus). Libertismo é a existência de livre-arbítrio humano, é um género, não uma espécie, é  um predicado comum a determinismo moderado e a indeterminismo biofísico (moderado) com livre-arbítrio. Libertismo não é uma corrente mas uma propriedade de duas correntes.

 

Só a miopia dos filósofos analíticos actuais como Simon Blackburn, Proudfoot ou Lacey aceita a quádrupla divisão das correntes da ação humana em determinismo radical, determinismo moderado, libertismo e indeterminismo. Não há aqui uma arrumação dialética de ideias mas uma confusão: o libertismo é um indeterminismo na medida em que é livre-arbítrio, por isso é idiotice separá-lo do indeterminismo ainda que, na qualidade de livre-arbítrio, faça também parte do determinismo moderado.  E o que é indeterminismo na visão de Blackburn e discípulos? Escreve Blackburn:

 

«Indeterminismo. Concepção segundo a qual alguns acontecimentos não têm causas, limitam-se a acontecer e nada há no estádio prévio do mundo que os explique. Segundo a mecânica quântica, os acontecimentos quânticos têm esta propriedade.»

(Simon Blackburn, Dicionário de Filosofia, Gradiva, pág 226).

 

Sem rejeitarmos esta definição, vemos que ela está mal posicionada, incompleta. Falta desdobrá-la em duas correntes: o indeterminismo biofísico sem livre-arbítrio - exemplo: começa a nevar com abundância em um dia de verão com a temperatura a 35º C e as pessoas não têm livre arbítrio, escolhem por instinto - e o indeterminismo biofísico com livre-arbítrio,isto é, libertista - exemplo: começa a nevar com abundância em um dia de verão com a temperatura a 35º C e as pessoas decidem racionalmente o que fazer, usam o livre arbítrio.

 

Por aqui se vê a mediocridade filosófica que impera no ensino da filosofia. Blackburn é um erudito confuso. As universidades foram tomadas por pensadores de segunda e terceira categoria que se multiplicam como metástases.

 

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Sexta-feira, 5 de Dezembro de 2014
Teste de Filosofia do 10º B (Dezembro de 2014)

 

 

.Mais um teste de Filosofia do 10º ano da escolaridade, em final do primeiro período lectivo do ensino secundário em Portugal. As leis da lógica dialética, que figuram neste teste,  são ignoradas pela generalidade dos autores de manuais escolares e, no entanto, estão contidas, virtualmente, no ponto 1.2 do programa de filosofia do 10º ano «Quais são as questões da filosofia?» e no ponto 1.3 «A dimensão discursiva do trabalho filosófico».  Por que razão a grande maioria dos docentes lecionam aos alunos os princípios da lógica formal (identidade, não contradição e terceiro excluído)  e não leccionam as leis da lógica dialética (uno, devir, contradição principal, etc) geradas no taoísmo, em Heráclito, Hegel, Marx, Althusser?  Porque não sabem lógica dialéctica, deixando-se submergir, no seu limitadíssimo saber, pela maré sectária da chamada filosofia analítica com a sua lógica proposicional .

Agrupamento de Escolas nº 1 de Beja
Escola Secundária Diogo de Gouveia , Beja
TESTE DE FILOSOFIA, 10º ANO TURMA B
5 de Dezembro de 2014.            Professor: Francisco

 

I

«Realismo axiológico não é exactamente o mesmo que objectivismo axiológico visto que este último também se pode incluir no irrealismo axiológico. Nas cosmologias de Heráclito e de Platão múltiplas aparências empíricas correspondem a uma mesma essência e em ambas se verifica a lei do salto qualitativo.»

1) Explique, concretamente, este texto.

 

2) Defina determinismo com livre-arbítrio («moderado»), determinismo sem livre-arbítrio («radical»), indeterminismo (biofísico) com livre-arbítrio e fatalismo determinista e aplique a estas quatro correntes a lei da contradição principal, lei que deve também definir.

 

3) Defina e aplique a lei dialéctica da síntese à sua vida pessoal. como estudante adolescente em Beja, e às matérias da Biologia, da Química, da História Social e Política, do Desporto.

 

4) Relacione, justificando:

A) Filosofia, Dogmatismo, Cepticismo, Subjectivismo.

 B) Esfera dos valores espirituais na teoria de Max Scheler, por um lado, e Reminiscência em Platão e Eidos em Aristóteles

 

CORRECÇÃO DO TESTE, CUJA COTAÇÃO MÁXIMA DO TOTAL DAS RESPOSTAS É 20 VALORES

 

1) O realismo axiológico é a doutrina que sustenta que os valores éticos, estéticos, científicos, etc, são qualidades que existem em si e por si mesmas antes de haver humanidade ou independentemente desta. É o caso da doutrina de Platão que é também um objectivismo axiológico porque sustenta que cada valor - o Bem, o Belo, o Justo, etc - é o mesmo para todas as pessoas. Mas realismo (ontologia) não é o mesmo que objectivismo (sociologia, consenso entre todos ou quase todos). Os números 1,2,3,4,5 e as operações como 1+5= 6 ou 28: 7=4 , por exemplo,  são fenómenos objectivos mas podem ser reais (fora de nós) ou irreais (frutos da nossa imaginação). O irrealismo axiológico defende que os valores são invenções das mentes humanas não existem fora destas mas podem ser objectivos isto é comuns a todos como os números que são valores matemáticos, os mesmos para todas as mentes humanas  (VALE TRÊS VALORES). Na doutrina de Heráclito, múltiplas aparências empíricas como nuvem, montanha, cão, árvore, homem, etc, são uma única essência oculta, isto é, o fogo ou arquê. O salto qualitativo nesta doutrina opera-se segundo a lei da transformação da quantidade em qualidade: a acumulação lenta de formas no seio do caos original que é fogo puro, origina (salto de qualidade) o cosmos, universo hierarquizado com céu, terra, montanhas, animais, etc. Na doutrina de Platão, cada arquétipo ou essencia invisivel e inteligível corresponde a múltiplas aparencias empíricas, como por exemplo: o arquétipo árvore está, de certo modo oculto, por milhões de árvores do mundo sensível da matéria. A lei do salto qualitativo na doutrina de Platão verfifica-se em vários aspectos: a prática da ascese ou ascensão da alma ao mundo inteligível, estando vivo o corpo, faz-se através da filosofia - meditamos sobre o Bem ou o Belo presente nas leis, nas acções e nas pessoas -  até se operar um salto qualitativo - apreendemos o arquétipo de Bem e de Belo, com a noese. (VALE TRÊS VALORES).

 

2) Determinismo com livre-arbítrio (vulgo: determinismo moderado) é a teoria segundo a qual, na natureza, as mesmas causas produzem sempre os mesmos efeitos e o homem dispõe de liberdade racional de escolha (livre-arbítrio). Exemplo: um homem decide, racionalmente, atirar-se do alto de um avião em páraquedas, sabendo que se sujeita ao determinismo na lei da gravidade, que o faz cair para a Terra. Determinismo sem livre-arbítrio (vulgo: determinismo radical) é a teoria segundo a qual, na natureza, as mesmas causas produzem sempre os mesmos efeitos e o homem não dispõe de liberdade racional de escolha (livre-arbítrio). Exemplo: movido por uma força irracional, sem liberdade de escolha,  um homem atira-se do alto de um arranha-céus, sujeitando-se determinismo na lei da gravidade, que o faz cair para a Terra e morrer esmagado. Indeterminismo com livre-arbítrio  é a teoria segundo a qual, na natureza, as mesmas causas não produzem sempre os mesmos efeitos e o homem não dispõe de liberdade racional de escolha (livre-arbítrio). Exemplo: beber água nem sempre faz funcionar os rins, às vezes paralisa-os (indeterminismo) e um grupo de pessoas ingere água por motivo de uma sede abrasadora, por  decisão livre e meditada. Fatalismo determinista é a teoria segundo a qual tudo na vida está predestinado segundo leis fixas, infalíveis, de causa efeito, como os movimentos dos planetas no Zodíaco escrevendo o destino de cada um e os homens não dispõem de livre-arbítrio. Exemplo: tudo estava e está predestinado, incluindo que Hitler escapasse com vida no atentado à bomba de 20 de Julho de 1944 e em outros e  há explicação racional, determinista, nos astros, para esses «acasos» predestinados. A lei da contradição principal estabelece que um sistema de múltiplas contradições (em rigor deveria dizer-se: contrariedades; exemplo: a contrariedade entre a URSS e os EUA, a contrariedade entre a França e a Espanha, etc.) pode ser reduzido a uma só grande contradição, formada por dois grandes blocos ou pólos, denominada contradição principal. Assim, no caso das quatro correntes acima definidas a contradição principal pode ser a que opõe as correntes deterministas (determinismos com e sem livre-arbítrio, fatalismo determinista) às correntes indeterministas (indeterminismo com livre-arbítrio) (VALE CINCO VALORES).

 

3) A lei da tríade diz que um processo dialéctico se divide em três momentos: a tese ou afirmação, a antítese ou negação e a síntese ou negação da negação, sendo a síntese não a soma das duas anteriores mas um resumo, um termo intermédio e convertendo-se em tese de um novo processo. Na minha vida de estudante, a tese é o assistir às aulas e concentrar-me no estudo, a antítese o ir à praia tomar banho ou tocar viola com o meu grupo de amigos, a síntese é o viajar na internet entre sites de ciência ou filosofia escolar e conversações lúdicas em chats. Na Química, a tese é o protão, a antítese o electrão e a síntese o protão ou ainda a tese é o ácido, a antítese é a base (alcalí) e a síntese o sal (neutro). Na História Social e Política, a burguesia é a tese, a classe operária é a antítese, e os produtores independentes ou os sindicatos a síntese. No Desporto o avançado ou atacante é a tese, o defesa é a antítese e o médio é a síntese. (VALE TRÊS VALORES)

 

4) A)  A filosofia é o conjunto das interpretações livres, reflexivas e especulativas ( metafísicas) sobre o mundo, a vida, o homem. É simultaneamente afirmação e interrogação, acto e  fruto de meditação. Há dogmatismo, isto é, doutrina que sustenta haver certezas, terreno seguro de conhecimento, na generalidade das filosofias: na de Platão, é dogma a afirmação de que há mundo inteligível dos arquétipos e reminiscências na alma; na de Hegel, é dogma a lei da tríade. Há algum grau de cepticismo em grande parte das filosofias, sendo cepticismo a corrente que duvida de tudo o que é invisível, impalpável, especulativo(duvida dos átomos, dos deuses, do Big Bang, da teoria de Darwin, etc.). Há em diversas filosofias, como por exemplo no existencialismo, subjectivismo, isto é, corrente que sustenta que a verdade e os valores variam de pessoa a pessoa, conforme a subjectividade ou gosto íntimo de cada um. (VALE TRÊS VALORES).

 

4) B) A esfera dos valores espirituais em Max Scheler engloba os valores éticos (bem, mal, justo, injusto), estéticos (belo, feio), filosóficos (verdade, falsidade) e os valores de referência das ciências empíricas (verdade e falsidade utilitárias) e do direito (legal, ilegal, etc.). Parte destes valores existem, na teoria de Platão, no Mundo Inteligível de Platão como arquétipos ou essências perfeitas e imóveis: o Bem, o Belo, o Justo, o Triângulo, o Círculo, o Número - e reproduzem-se nas reminiscências, que são as vagas  recordações que as almas trazem desse mundo superior do Mesmo para o Mundo da Matéria ou do Outro. O eidos em Aristóteles é a forma comum ou essência de entes. Os valores filosóficos de verdade e erro dizem respeito a essências (eidos) como Deus, mundo, alma, bem, belo e os valores científicos de verdade e erro dizem respeito a essências (eidos) como número, ar, água, ferro, cobre, fogo, etc, (VALE TRÊS VALORES).

 

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Sábado, 29 de Novembro de 2014
Teste de Filosofia do 10º C (Novembro de 2014)

 

 Eis um teste de Filosofia do 10º ano da escolaridade, em final do primeiro período lectivo do ensino secundário em Portugal. As leis da lógica dialética, que figuram neste teste,  são ignoradas pela generalidade dos autores de manuais escolares e, no entanto, estão contidas virtualmente no ponto 1.2 do programa de filosofia do 10º ano «Quais são as questões da filosofia?» e no ponto 1.3 «A dimensão discursiva do trabalho filosófico».  Por que razão a grande maioria dos docentes lecionam aos alunos os princípios da lógica formal (identidade, não contradição e terceiro excluído)  e não leccionam as leis da lógica dialética (uno, devir, contradição principal, etc) geradas no taoísmo, em Heráclito, Hegel, Marx, Althusser?  Porque não sabem lógica dialéctica, deixando-se submergir, no seu limitadíssimo saber, pela maré sectária da chamada filosofia analítica com a sua lógica proposicional .

 

:Agrupamento de Escolas nº 1 de Beja
Escola Secundária Diogo de Gouveia , Beja
TESTE DE FILOSOFIA, 10º ANO TURMA C
26 de Novembro de 2014.            Professor: Francisco Queiroz

 I

 

“Nalguns casos, a filosofia em acto é ciência em potência e vice-versa. As percepções empíricas originam os conceitos mediante a lei do salto qualitativo. É costume dizer que a metafísica se situa na transcendência mas as essências, na visão de Aristóteles, são metafísica na imanência. »

 

1) Explique concretamente este texto.

 

2) Defina determinismo com livre-arbítrio («moderado»), determinismo sem livre-arbítrio («radical»), indeterminismo (biofísico) sem livre-arbítrio e fatalismo indeterminista e aplique a estas quatro correntes a lei da contradição principal, lei que deve também definir.

 

3) Defina e aplique a lei dialéctica da luta de contrários à sua vida pessoal. como estudante adolescente em Beja, e às matérias da Biologia, da Química, da Matemática, do Português.
 

4)   Relacione, justificando:

 

A) Proté Ousía, Forma Eterna (Eidos) e Hylé, em Aristóteles, e lei da tríade.
     

B)  Esfera dos valores espirituais na teoria de Max Scheler, e Mundo do Mesmo em Platão.

 

CORRECÇÃO DO TESTE DE AVALIAÇÃO (COTADO MAXIMAMENTE PARA 20 VALORES)

 

1) Aquilo que hoje é  filosofia, isto é, interpretação especulativa do mundo, em acto, ou seja, na realidade presente, é ciência em potência, isto é, no futuro previsível. Assim aconteceu com a filosofia atomista de Demócrito e Leucipo na antiguidade grega: converteu-se em ciência detalhada nos séculos XIX e XX, desenvolvendo as noções de protão, electrão, neutrão, núcleo, órbitas e outras. Inversamente, uma ciência em acto, como por exemplo, a vacinação pode vir a reduzir-se a uma mera filosofia no futuro - em potência - quando se descobrir que a «imunização não existe, é uma tentativa de falsear a lei biológica de causa-efeito, lei que inclui o facto de que vírus ou toxinas inoculados no organismo humano prejudicam sempre este criando anticorpos» (VALE DOIS VALORES). A percepção empírica, isto é, um conjunto de sensações visuais, auditivas, tácteis, etc - exemplo: ver uma árvore - origina o conceito, isto é, a ideia de uma classe de coisas - exemplo: a ideia de árvore, que se tem de olhos fechados - através da lei do salto de qualidade que teoriza que a acumulação gradual e lenta, em quantidade, de um certo factor num fenómeno gera, em dado instante, um salto nítido de qualidade nesse fenómeno: vejo um pinheiro, depois um sobreiro, depois uma macieira e abstraindo (salto qualitativo) nasce em mim o conceito ou ideia de árvore (VALE DOIS VALORES). Diz-se que a metafísica, isto é, o reino das essências (formas) ou entes invisíveis, impalpáveis, que está além do mundo físico visível e palpável se situa na transcendência, isto é no Além - no Mundo Inteligível, acima do céu visível, em Platão - mas Aristóteles sustentou que as essências ou formas eternas estão inerentes aos objectos físicos (exemplo: a essência cavalo existe apenas em todos os cavalos físicos, reais) por isso são metafísica (formas imóveis, além da phisis ou região do movimento) na imanência, isto é, dentro das coisas físicas (VALE DOIS VALORES).

 

2) Determinismo com livre-arbítrio (vulgo: determinismo moderado) é a teoria segundo a qual, na natureza, as mesmas causas produzem sempre os mesmos efeitos e o homem dispõe de liberdade racional de escolha (livre-arbítrio). Exemplo: um homem decide, racionalmente, atirar-se do alto de um avião em páraquedas, sabendo que se sujeita ao determinismo na lei da gravidade, que o faz cair para a Terra. Determinismo sem livre-arbítrio (vulgo: determinismo radical) é a teoria segundo a qual, na natureza, as mesmas causas produzem sempre os mesmos efeitos e o homem não dispõe de liberdade racional de escolha (livre-arbítrio). Exemplo: movido por uma força irracional, sem liberdade de escolha,  um homem atira-se do alto de um arranha-céus, sujeitando-se determinismo na lei da gravidade, que o faz cair para a Terra e morrer esmagado. Indeterminismo sem livre-arbítrio  é a teoria segundo a qual, na natureza, as mesmas causas não produzem sempre os mesmos efeitos e o homem não dispõe de liberdade racional de escolha (livre-arbítrio). Exemplo: beber água nem sempre faz funcionar os rins, às vezes paralisa-os (indeterminismo) e um grupo de pessoas ingere água por motivo de uma sede abrasadora, sem decisão livre e meditada. Fatalismo indeterminista é a teoria segundo a qual tudo na vida está predestinado segundo forças do capricho, incompreensíveis, e os homens não dispõem de livre-arbítrio. Exemplo: tudo estava e está predestinado, incluindo que Hitler escapasse com vida no atentado à bomba de 20 de Julho de 1944 e em outros e não há explicação racional, determinista, para esses «acasos» predestinados. A lei da contradição principal estabelece que um sistema de múltiplas contradições (em rigor deveria dizer-se: contrariedades; exemplo: a contrariedade entre a URSS e os EUA, a contrariedade entre a França e a Espanha, etc.) pode ser reduzido a uma só grande contradição, formada por dois grandes blocos ou pólos, denominada contradição principal. Assim, no caso das quatro correntes acima definidas a contradição principal pode ser a que opõe as correntes deterministas (determinismos com e sem livre-arbítrio) às correntes indeterministas (indeterminismo sem livre-arbítrio, fatalismo indeterminista) (VALE CINCO VALORES).

 

3) A lei dialéctica da luta de contrários diz que cada ente ou fenómeno se compõe de um par de contrários que lutam entre si e constituem uma unidade instável que é a essência e o motor de desenvolvimento desse ente ou fenómeno. Na vida de estudante, a luta entre a consagração ao estudo das disciplinas escolares e comparência nas aulas, por um lado, e a diversão extraescolar e faltas às aulas, por outro lado. Na Biologia, a luta entre as células procariontes, que carecem de membrana nuclear e as células eucarióticas, que possuem essa membrana, a luta entre assimilação e a desassimilação nos organismos, a luta entre genótipo e fenótipo. Na Química, a luta entre ácidos e bases, electrões e protões, metais e não metais. Na Matemática, a luta entre números negativos e números positivos, entre multiplicação e divisão, etc. No Português, a oposição entre prosa e poesia, substantivo e adjectivo, voz activa e voz passiva. (VALE TRÊS VALORES).

 

4) A) A lei da tríade diz que um processo dialéctico se divide em três momentos: a tese ou afirmação, a antítese ou negação e a síntese ou negação da negação, sendo a síntese não a soma das duas anteriores mas um resumo, um termo intermédio e convertendo-se em tese de um novo processo. Aplicando à teoria de Aristóteles temos o seguinte: as formas eternas ou eidos são a tese, a hylé ou matéria-prima universal ( eis uma imagem imperfeita da hylé: uma espécie de nevoeiro que não existe e espera condensar-se nas formas eternas) é a antítese e a proté ousía ou substância primeira, coisa individualizada, é a síntese já que nasce da união do eidos e da hylé (VALE TRÊS VALORES).

 

4) B) A esfera dos valores espirituais em Max Scheler engloba os valores éticos (bem, mal, justo, injusto), estéticos (belo, feio), filosóficos (verdade, falsidade) e os valores de referência das ciências empíricas (verdade e falsidade utilitárias) e do direito (legal, ilegal, etc.). Parte destes valores figuram no Mundo do Mesmo ou Mundo Inteligível de Platão como arquétipos ou essências perfeitas e imóveis: o Bem, o Belo, o Justo, o Triângulo, o Círculo, o Número (VALE TRÊS VALORES).

 

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Terça-feira, 19 de Fevereiro de 2013
Teste de filosofia do 10º ano de escolaridade ( 2º período lectivo)

 

Eis um teste de filosofia, o primeiro do segundo período lectivo, que não usa o terreno pantanoso das perguntas de resposta múltipla que é típico dos sectários da filosofia analítica, pobres em pensamento.  

 

Escola Secundária Diogo de Gouveia , Beja
TESTE DE FILOSOFIA, 10º ANO TURMA C
14 de Fevereiro de 2013. Professor: Francisco Queiroz

 

I

«O imperativo categórico de Kant é formal e autónomo e é distinto do hedonismo sensualista de Aristipo de Cirene. O templo cristão da Idade Média foi construído segundo o princípio da correspondência microcosmo-macrocosmo e implicava uma certa mística, incluindo a gematria da Cabala, e talvez a reminiscência de arquétipos

 

1) Explique concretamente este texto.

 

II

 

2) Relacione, justificando:

 

A) Realismo crítico e racionalismo.
B) Dualismo antropológico no estoicismo e dualismo no taoísmo.
C) Ética utilitarista de Stuart Mill e determinismo com livre-arbítrio (determinismo moderado).

III

3) Disserte sobre o seguinte tema:

 

“As quatro causas de um ente segundo Aristóteles, os quatro arquês e a cosmogénese segundo Pitágoras de Samos ”.

 

 

 

CORRECÇÂO DO TESTE, COTADO PARA UM TOTAL DE 20 VALORES

 

1) O imperativo categórico, verdadeira lei moral, gerada no eu racional ou numénico, é formal, ou seja abstracto, porque apresenta a seguinte formulação: «Age como se quisesses que a tua acção fosse uma lei universal da natureza». Dá-se apenas a forma (equidade, agir de igual modo com todos) mas não o conteúdo concreto. Por isso deixa a cada pessoa autonomia para preencher o seu imperativo categórico pessoal. É, pois, autónomo. É diferente do hedonismo sensualista de Aristipo de Cirene uma vez que este postulava que o maior bem é o prazer dos sentidos (comer, beber, entregar-se ao sexo, etc) e o mal é a dor, a privação de bem-estar. O agir por dever em Kant, opõe-se ao agir por prazer sensual, em Aristipo. (ESTAS FRASES VALEM TRÊS VALORES). O templo cristão da Idade Média era um microcosmo (pequeno mundo organizado) que reflectia o macrocosmo (o grande universo): por isso a catedral medieval tinha a forma de um homem (Cristo) de braços abertos. A abside correspondia à cabeça de Cristo e estava voltada para Oriente, onde nasce o Sol símbolo de Cristo. O altar corresponde ao coração e o transepto aos braços abertos. As naves ao tronco e pernas de Cristo. Assim o que está em baixo (o templo) é espelho do que está em cima (um gigantesco corpo de Cristo atravessando o universo).  Isto implica mística ou seja união íntima com a divindade. E comportava a gematria, uma disciplina da Kabalah judaica, que faz corresponder letras a números (exemplo: A=1, B=2, C=3, D=4). Por exemplo, sendo o nome de Cristo em grego equivalente ao número 888, o eixo que liga a base do altar à cúpula da catedral de Troyes mede 88 pés e 8 polegadas - medida intencional. A construção do templo na medida em que incorporava cilindros, prismas e outros poliedros era talvez uma reminiscência, isto é, uma vaga lembrança dos arquétipos de cilindro, de prisma e outros existentes, segundo Platão, num mundo acima do céu visível chamado mundo inteligível ou das formas puras. (VALE QUATRO VALORES).

 

2) A) Realismo crítico é a teoria gnosiológica segundo a qual há um mundo de matéria exterior ao espírito humano e este não capta esse mundo como é. Descartes, realista crítico, sustentava que as cores, os cheiros, os sons, sabores, o quente e o frio só existem no interior da mente, do organismo do sujeito, e que o mundo exterior é apenas composto de formas, movimentos e tamanhos. Isto é racionalismo, pois esta teoria afirma que a razão é a principal fonte de conhecimento, negando uma parte das percepções empíricas.(VALE TRÊS VALORES).

 

2) B) O dualismo antropológico no estoicismo, filosofia baseada na aceitação do destino e no lema «Aguenta e abstèm-te», consiste em dividir o ser humano en 2 polos: o eu racional ou guia interior, que consegue dominar as paixoes e filosofar; o eu animal ou corpo, fonte das paixões da ambição, da cólera, dos prazeres da carne.

O dualismo no taoísmo pode ser visto segundo vários ângulos: o Tao, mãe e ritmo do universo, desdobra-se em duas ondas contrárias, Yang (luz, calor, verão, vermelho, crescer) e Yin (escuridão, frio, inverno, azul, diminuir); o agir, que é próprio dos ambiciosos, dos políticos e dos que se consagram ao estudo livresco, e o não agir, que é próprio do sábio contemplativo e do camponês que segue o ritmo da natureza, isto é, o Tao. (VALE TRÊS VALORES).

 

2) C) A ética utilitarista de Stuart Mill tem como pilar primeiro o princípio da maior felicidade, isto é, propiciar a felicidade à maioria das pessoas envolvidas numa situação, mesmo prejudicando uma minoria de pessoas, e como pilar segundo, os bons princípios da tolerância e do respeito para com o próximo e a qualidade superior de certos prazeres do espírito (música, literatura, ciências, etc). Supõe, como seu suporte metaético, o determinismo com livre-arbítrio isto é, a doutrina que sustenta que as mesmas causas produzem sempre os mesmos efeitos, na natureza biofísica (determinismo) e ao mesmo tempo, os homens dispõem de livre-arbítrio, isto é, de capacidade de escolha livre após reflexão. (VALE TRÊS VALORES).

 

3) Há 4 causas de um ente, segundo Aristóteles: formal (a forma do ente), material (a matéria-prima de que é formado o ente) eficiente (aquele ou aquilo que gerou ou fabricou o ente) e final (a finalidade do ente). Na doutrina de Pitágoras de Samos, há quatro princípios (arquês) de todas as coisas que configuram a cosmogénese (nascimento do cosmos) do seguinte modo: do vazio surge um ponto (número um); o ponto desdobra-se em dois que afastando-se formam uma linha recta (número dois); da recta sai um ponto que projectando-se sobre ela segundo infinitas rectas gera um plano (este é o número três); do plano sai um ponto que, projectando-se segundo três linhas rectas sobre esse plano, gera o tetraedro ou pirâmide de três lados (esta é o número quatro). Estes números-figuras, combinando-se entre si, formam todos os objectos do universo (árvores, planícies, animais, homens, etc). A soma dos quatro números figuras essenciais dá 10, o número divino ou tétrade. (VALE QUATRO VALORES).

 

 

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Quinta-feira, 1 de Dezembro de 2011
Confusões do "Routledge Dicionary of philosophy" sobre libertismo/libertarianismo e indeterminismo

O "Routledge dictionary of philosophy» diz o seguinte:

 

 «Os deterministas moderados (soft determinists), de longe o maior grupo em tempos recentes,  dizem que as nossas acções são, de facto, causadas mas não estamos, portanto, menos livres do que devíamos estar, porque a causação não é um constrangimento ou compulsão sobre nós. Enquanto as nossas naturezas e escolhas forem efetivas como itens na cadeia causal, o facto de elas próprias serem causadas é irrelevante e não as impede de ser o que são» ("The Routledge Dictionary of Philosophy, page 146, fourth edition).

 

Comecemos por apontar um erro no texto que acabamos de ler: os deterministas moderados não dizem que (todas) as nossas acções obedecem ao determinismo - «estão causadas», expressão de que não gosto por ser ambígua - mas sim que uma grande parte das nossas acções (exemplo: comer, beber, dormir, vestir roupa, andar, etc) obedecem ao determinismo neurofisiológico e não são livres. Escrever que «as nossas acções são causadas mas continuamos livres» é um contra-senso. Entrar no automóvel e guiá-lo é uma acção determinada ou uma acção livre? Segundo o Routledge Dictionary é ambas as coisas. Nuvem de Confusão! No mesmo aspeto e ao mesmo tempo, não podem dar-se os contrários (princípio da não contradição). Dizer que «o facto de as nossas naturezas e escolhas serem causadas (determinadas, não livres.).. é irrelevante» é um contrasenso. Se são determinadas, não são livres. Há aqui falta de poder de análise. 

E o Routledge prossegue:

 

«Os deterministas moderados são compatibilistas. Os indeterministas podem ser ambas as coisas, mas são habitualmente incompatibilistas

«Uma dificuldade com o indeterminismo é que a mera ausência de causação parece não ser suficiente. Se as nossas ações não são mais do que intrusões aleatórias no esquema causal das coisas como podemos ser   responsável por elas mais do que se forem causadas? Os indeterministas são, por vezes, denominados libertarianos. Mas mais estritamente, os libertarianos são aqueles que postulam uma entidade especial, o self, que usa o corpo para intervir de fora, por assim dizer, na cadeia causal dos acontecimentos, mas é, em si mesmo, imune à influência causal.» (Routledge Dictionary of Philosophy, page 146).

 

Há evidentemente, aqui uma confusão: segundo este dicionário, no indeterminismo «as nossas ações não são mais do que intrusões aleatórias no esquema causal das coisas» o que radica no «eu» (self), exterior aos determinismos, autor dessas acções. Mas isto é exatamente o determinismo conjugado com livre-arbítrio, isto é, o «determinismo moderado», um compatibilismo. Se o self está fora da cadeia causal dos acontecimentos, esta é admitida pelo libertismo. Logo este e o «determinismo moderado» são o mesmo. Está-se num jogo de palavras, no relvado das incoerências teóricas...O Routledge Dictionary desliza como a faca sobre a manteiga das imprecisões teóricas, dos equívocos.

 

O problema que os filósofos analíticos, e outros como Nietzschze, não conseguem conceber é que a articulação entre os acontecimentos do passado do presente e do futuro não é uma cadeia determinista contínua mas uma série de cadeias deterministas, descontínuamente articuladas entre si, uma das quais é accionada, rotativamente, a cada momento pelo livre-arbítrio dos homens ou pelo fator acaso que perpassa na natureza biofísica.

 

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Domingo, 6 de Maio de 2007
As diversas teorias sobre o livre-arbítrio e a necessidade (Crítica de Manuais Escolares-XVIII)

A posição oficial de diversos teóricos da ética é a de que há quatro posições sobre o livre-arbítrio e determinismo ou necessidade: determinismo radical, determinismo moderado, indeterminismo e libertismo.

Assim no manual  português "A Arte de Pensar, Filosofia 10º ano" plasma-se o seguinte:

 

«...Determinismo radical. Esta posição defende que o livre-arbítrio é incompatível com um mundo regido por leis, onde os acontecimentos (incluindo as acções) se sucedem em cadeias causais tais que da ocorrência de uma certa causa se segue necessariamente a ocorrência de um dado efeito, sem que possamos interferir nessas ocorrências (mesmo que tenhamos consciência delas) e sem que as leis que regem as relações causais  estejam minimamente na nossa dependência. Em resumo: como o determinismo é verdadeiro, não somos livres.»

«...Determinismo moderado. O determinista deste tipo aceita a ideia de que o mundo é regido por leis e a ideia de que os acontecimentos estão causalmente relacionados. No entanto, para ele isto é compatível com o livre-arbítrio humano...»

«...Indeterminismo. O indetermista defende que alguns acontecimentos não têm causas - apenas acontecem e é tudo. ... Se fores indeterminista podes alegar que a tua acção foi aleatória. Mas terás de argumentar que o teu arremesso de pedras a vidros é como um acontecimento quântico, o que não será tarefa fácil e não te salvaguardará de seres responsabilizado pelo que fizeste: é que o mundo até poderá conter ocorrências aleatórias, mas não está demonstrado que a tua acção seja uma delas.»

«...Libertismo. O libertista pensa que o dilema do determinismo que vimos atrás, é um falso dilema: as escolhas dos agentes não são causalmente determinadas nem aleatórias. A alternativa consiste em conceber as nossas acções como produto de deliberações racionais e responsáveis que têm o poder de alterar o curso dos acontecimentos no mundo. O agente pode dar início a cadeias causais novas, o que é suficiente para que seja responsabilizável pelas suas acções.»

(Aires Almeida, António Paulo Costa, Célia Teixeira, Desidério Murcho, Paula Mateus, Pedro Galvão, A arte de pensar, Filosofia, 10º ano, 1º volume, Didáctica Editora, Lisboa, Março de 2003, pags 82,83).

 

Esta divisão, que espelha a posição de John Searle e de outros teóricos da ética, como Simon Blackburn, é, a meu ver, inconsistente, confusa.

Em primeiro lugar, há uma duplicação da mesma definição, segundo a qual há simultaneamente livre-arbítrio e determinismo: ora é classificada de determinismo moderado, ora de libertismo. Isto mostra a falta de clareza dos autores do manual e dos teóricos que os inspiram. O libertismo está oculto na segunda posição baptizada de determinismo moderado, compatível com o livre-arbítrio, e o determinismo está oculto na quarta posição, baptizada de libertismo. Não é verdade que o determinismo moderado coexiste com o livre-arbítrio (libertismo) em que as nossas acções são «um produto de deliberações racionais e responsáveis»?  E não é verdade que o libertismo ou exercício do livre arbítrio " que pode dar início a cadeias causais novas" se compagina com o determinismo (lei infalível da natureza: a sucessão das quatro estações do ano, a transformação da semente de trigo em haste com espiga, o ter sono todas as noites, o acordar todas as manhãs, o sentir fome e sede ao cabo de algumas horas sem alimento, etc)? Não há libertismo como corrente autónoma. Libertismo é livre-arbítrio, é uma  propriedade comum ao determinismo moderado e ao indeterminismo biofísico moderado (exemplo: neva num dia quente de verão e escolho sair de casa ou ficar em casa).

 

Em segundo lugar, indetermismo é nebulosamente definido como inexistência de causas: «o indetermista defende que alguns acontecimentos não têm causas - apenas acontecem e é tudo». Ora indetermismo não implica que não haja causas, mas sim que não haja determinismo, isto é, que as mesmas causas não produzam sempre os mesmos efeitos, nas mesmas circunstâncias. A física quântica não negou a noção de causa: singularizou a causa, individualizou-a, como um novo nominalismo neomedieval, sustentou que a espécie de causas A não gera sempre a mesma espécie de efeitos B, está envolta na névoa da imprevisibilidade.

 

Há um indeterminismo causalista (o «caos» dos acontecimentos é gerado pelo livre-arbítrio humano, que é causa livre - isto é, causa não causada - ou pelo «capricho da natureza», que é causa livre, ou por deuses ou outras forças metafísicas, que são causas livres) e há um indeterminismo acausalista (nada é causa de nada, há apenas irrupção sincrónica e diacrónica, fortuita, de entes e acontecimentos). Mas nem o manual «Arte de Pensar» nem o famoso John Searle se terão apercebido desta distinção, ao que parece, interpretando o termo indeterminismo como sendo o que defino como indeterminismo acausalista.

 

Para uma boa divisão, só possível mediante o método dialéctico, há que recorrer à lei da contradição principal: um sistema de múltiplos pólos, contrários parcial ou totalmente entre si, é redutível a uma dualidade.

Eis, em oposição às incongruências de sistematização de John Searle e dos autores de «A arte de pensar»,  uma divisão correcta das teorias sobre livre-arbítrio e determinismo, da nossa autoria : fatalismo determinista, fatalismo indeterminista, determinismo biofísico sem livre arbítrio, determinismo biofísico com livre-arbítrio, indeterminismo biofísico com livre-arbítrio, indeterminismo biofísico sem livre arbítrio.

 

A contradição principal desta divisão é fatalismo versus não fatalismo, desdobrando-se este último em determinismo com ou sem livre-arbítrio e indeterminismo com ou sem livre arbítrio. O determinismo, considerado isoladamente, aparece como um termo intermédio: existe, totalitariamente, no polo do fatalismo, e sectorialmente (eles designam-no como determinismo moderado) no polo do não fatalismo.  

Vejamos, pois, a nossa divisão, lógica e clara:

 

1. DOUTRINAS FATALISTAS

 

A) Fatalismo determinista: teoria segundo a qual não existe liberdade alguma no mundo natural e no mundo humano, nem existe acaso, estando tudo predestinado, segundo leis necessárias de causa-efeito, de efeitos calculados ao milímetro. Exemplo: a astrologia determinista integral, segundo a qual as posições dos planetas, do sol e da lua determinam, em absoluto, em dias e horas predestinadas, as vidas individuais e a vida colectiva na Terra, as revoluções políticas, os sismos, os acidentes de avião, de barco, de comboio, de centrais nucleares, etc.

 

B) Fatalismo indeterminista: teoria segundo a qual não existe liberdade alguma no mundo natural, que se desenvolve irregularmente sem determinismos, nem no mundo humano, estando tudo predestinado, segundo impulsos da providência, de uma vontade que não obedece a leis necessárias. Exemplo: a Moira, o destino na concepção clássica trágica grega. Aqui há liberdade, reservada a potências inumanas, sobrenaturais, liberdade que pertence ao «autor» ou «autores» do destino.

 

2. DOUTRINAS NÃO FATALISTAS (LIBERTISTAS OU NÃO)

 

A) Determinismo biofísico sem livre-arbítrio: teoria aparentemente fatalista, mas de facto, não fatalista, segundo a qual as leis infaliveis de causa-efeito prevalecem em tudo, não só na natureza biofísica mas até no espírito humano que não tem livre arbítrio. No entanto, os factos não estão rigorosamente predestinados porque o factor acaso existe, no interior ou no exterior da malha do determinismo, e proporciona surpresas. Exemplo: "O aparecimento da vida humana embora propiciado por uma longa cadeia de causas e efeitos a funcionar ao longo de milhões de anos não estava predestinado, resultou do acaso, de uma combinação aleatória de células vivas.»

 

B) Determinismo biofísico com livre-arbítrio (ou Libertismo determinista): teoria segundo a qual existe livre-arbítrio, poder de escolher diferentes tipos de acção em dadas circunstâncias, em justaposição com o determinismo do mundo natural. Exemplos: «Sou livre de me alegrar ou entristecer, por sugestão mental, mas o meu corpo envelhece dia a dia inexoravelmente e não sou livre para o conseguir rejuvenescer por dentro»; «sou livre entre escolher ir ao ginásio ao fim da tarde, submeter-me ao determinismo dos aparelhos de musculação, ou ir comer e beber com um grupo de amigos, submetendo-me ao determinismo da mastigação e digestão dos alimentos.».

 

C) Indeterminismo biofísico com livre-arbítrio (Libertismo indeterminista): teoria segundo a qual existe livre-arbítrio humamo, que é causa de acções livres, e ao mesmo tempo não há leis necessárias na natureza física e psicofísica. Existe livre-arbítrio e acaso (liberdade na natureza). Exemplo: «Sou livre de me atirar do alto de um edifício ao solo e não é certo que me venha a esmagar ou ferir intensamente pois há indeterminismo geofísico, a lei da gravidade pode deixar de funcionar nesse local e momento.»

 

D) Indeterminismo biofísico sem livre-arbítrio : teoria segundo a qual não há liberdade humana mas o determinismo e a predestinação não existem, o presente nasce a cada instante de forma imprevisível, o indeterminismo rege a natureza física do universo e a natureza biológica do ser humano as quais anulam o livre-arbítrio deste. Exemplo: «A minha acção será sempre não livre, fruto das minhas necessidades biológicas e sociais e da evolução do universo em geral e a natureza é imprevisível no seu funcionamento, por exemplo, o azeite misturado com água pode não vir sempre à tona desta e a mistura de um ácido com uma base pode nem sempre gerar um sal».

 

Nesta divisão, o libertismo - existência de livre-arbítrio- assume duas formas: uma determinista, outra indeterminista. O conceito de libertismo não é fixo entre os teóricos da ética: alguns interpretam-no como defini indeterminismo com livre-arbítrio.

 

Esta divisão dialéctica é muito mais racional e clara do que as que construiram John Searle e os autores da «Arte de pensar».

 

 

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