Desde a mais remota antiguidade, as grandes filosofias identificaram no universo os dois princípios basilares, o masculino e o feminino, o solar e o lunar, o activo e o passivo. Mas não existe absoluta unanimidade entre os diversos esoterismos. Há algumas contradições entre as tabelas de contrários próprias da filosofia hermética, em particular, e, por exemplo, a filosofia do taoísmo.
Vejamos a tabela de contrários do TAOÍSMO:
YANG YIN
Masculino Feminino
Sol Lua
Dilatação Contracção
Fogo Água
Verão (velho yang) Inverno (velho yin)
Primavera (jovem yang) Outono (jovem yin)
Vermelho Azul
Movimento Repouso
Som Silêncio
Alto Baixo
Solve ou dissolve Coagula
Espírito Matéria
Multiplicidade Unidade
Circunferência Centro
E agora vejamos uma, entre outras, tabela de contrários da alquimia:
MASCULINO FEMININO
Enxofre Mercúrio
Corpo Sólido, Alma Espírito
Sol Lua
Coagula Solve
Calor, Secura Frio, Humidade
Vermelho Branco, Azul
Athanor (Forno) Retorta
Na tabela alquímica, vemos, por exemplo, o princípio masculino, o ácido, ligado ao estado sólido, corporal, à coagulação, a qual, na tabela do taoísmo, é um estado yin, feminino, material. O feminino é, no taoísmo, mais material e concentrado que o masculino mas sucede o inverso na alquimia em que o mercúrio filosófico, feminino, espécie de orvalho de prata, quinta-essência, espírito universal acima dos quatro elementos (fogo, ar, terra, água), é mais volátil e disperso que o enxofre e o salitre (nitrato de potássio empregue na fabricação da pólvora), símbolos do princípio masculino. Note-se que alma, na coluna da esquerda, significa alma vital (epitimia e tumus, na teoria de Platão), isto é, força que anima o corpo individual e é distinta de espírito. Este último pode ser tomado em duas acepções: como quintaessência, éter ou mercúrio filosófico, luz superior; como nous ou razão intuitiva em Platão, intelecto agente em Aristóteles, transindividual que apreende directamente Deus e os arquétipos ou formas eternas.
O mercúrio (feminino, na especulação alquímica) é, como se sabe, o único metal que na natureza se encontra no estado líquido, o que dá ideia da sua fluidez, e tem como número atómico 80, ao passo que o enxofre (masculino, na visão da alquimia) é um não metal, de número atómico 16, que à temperatura ambiente, se encontra no estado sólido. Os alquimistas visavam «casar o Sol e a Lua», dissolver o enxofre e coagular o mercúrio a fim de obter o lapis, a pedra filosofal burilada.
A ÁRVORE DAS SEFIRÓS DIVIDIDA EM TRÊS COLUNAS
Consideremos a tábua de contrários representada na árvore da Vida, da Kabalah judaica, árvore das Sefirós (esferas, indicadas por números, 2,4, 7 no pilar da direita e 3,5,8 no pilar da esquerda) a que a maioria dos alquimistas ocidentais concedeu importância:
PILAR DA ESQUERDA PILAR DA DIREITA
OU DA SEVERIDADE OU DA MISERICÓRDIA
Binah (Inteligência)- nº3 Hocmah (Sabedoria)-nº 2
Geburah (Justiça) - nº 5 Chesed (Misericórdia)-nº 4
Hod (Magnificência)-nº 8 Netzach (Vitória) - nº 7
Falta, nesta tábua de contrários, colocar o pilar central, síntese dos outros dois, que é o seguinte:
Kéther (Coroa)-nº 1
Tiferet (Beleza) -nº 6
Yesod (Fundamento)-nº 9
Malkuth (Reino na matéria)- nº 10
A TÁBUA DE CONTRÁRIOS DOS PITAGÓRICOS
Há outras tábuas de contrários que resumem o dualismo primordial, como a de Pitágoras de Samos e da sua escola, que Aristóteles descreve assim:
Limite Ilimitado
Ímpar Par
Unidade Pluralidade
Direita Esquerda
Macho Fêmea
Em repouso Em movimento
Recto Curvo
Luz Obscuridade
Bom Mau
Quadrado Rectângulo
(Aristóteles, Metafísica, Livro I, 986 a, 20-25)
Há, nesta tábua, algumas incoerências, ao menos aparentemente. Por que razão o macho ou princípio masculino se identifica com o repouso e a fêmea ou princípio feminino com o movimento? Isto contraria o taoísmo, segundo a qual o masculino é activo e movimento e o feminino é passivo e repouso, embora pareça coincidir com a filosofia alquímica na medida em que esta postula que o feminino é o mercúrio filosófico, volátil, sempre em movimento, e o masculino é o enxofre, sólido. Afigura-se, ademais, ser misoginia classificar como «mau» o princípio feminino e como «bom» o princípio masculino.
TÁBUA DE CONTRÁRIOS DE ARISTÓTELES
Aristóteles procedeu à seguinte Divisão de contrários em duas colunas, num escrito perdido, que se supõe denominando Peri enantiön na lista de Diógenes Laercio:
O que é O que não é
Unidade Pluralidade
Mesmo Diverso
Semelhante Dissemelhante
Igual Desigual
Repouso Movimento
Em «Metafísica», Aristóteles confirma esta divisão:
«Ademais, a segunda coluna dos contrários é privação e todos eles se reduzem a O que é e o que não é, Unidade e Pluralidade, por exemplo, o Repouso pertence à Unidade e o Movimento à Pluralidade. » (Aristóteles, Metafísica, Livro IV, 1004b) .
«Como expusemos gráficamente em Divisão dos contrários, ao Uno pertencem o Mesmo, o Semelhante e o Igual, enquanto que o Diverso, o Dissemelhante e o Desigual pertencem à Pluralidade.» (Aristóteles, Metafísica, Livro X, 1054a,).
Esta tábua de contrários aristotélica peca por ser mais formal, mais abstracta do que as tábuas de contrários da alquimia e do taoísmo: não sabemos em que colunas iria Aristóteles inserir os pares fogo-água, enxofre-mercúrio, dilatação-contração, etc.
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