John Locke foi um filósofo de grande precisão nas intuições inteligíveis e nos raciocínios. Definiu conceitos físicos como solidez e impenetrabilidade de maneira muito clara, fazendo o primeiro anteceder ontologicamente o segundo:
«A ideia de solidez recebemo-la pelo nosso sentido do tacto; surge da resistência que qualquer corpo opõe a que outro ocupe o espaço em que se encontra. Não há nenhuma outra ideia que recebamos mais constantemente por meio da sensação. (...) E os corpos que manejamos na nossa vida quotidiana fazem-nos perceber que, enquanto estão nas nossas mãos, impedem, por uma força invencível, que se aproximem as partes das nossas mãos que os apertam. Ora, o que impede desse modo a aproximação de dois corpos quando se movem para o outro, é o que eu chamo solidez. (...) Mas se alguém pensa que será melhor chamar-lhe impenetrabilidade, tem o meu consentimento. Unicamente me pareceu que o termo solidez é o mais adequado para exprimir essa ideia, não só porque se emprega vulgarmente nesse sentido mas também porque encerra em si algo mais positivo do que o termo impenetrabilidade, que é negativo, e talvez, simples consequência da solidez. »
(John Locke, Ensaio sobre o entendimento humano, volume I, pag 137, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa; o negrito é colocado por mim).
É interessante notar que Locke hesita em identificar a solidez com a impenetrabilidade embora reconheça a extrema proximidade entre estas duas noções. É a impenetrabilidade dissociável, em certa medida, da solidez? Ou são a mesma coisa? Se se trata do primeiro caso, o juízo «os corpos sólidos são impenetráveis» é um juízo sintético, na terminologia de Kant: o predicado acrescenta algo novo ao sujeito. Se se trata do segundo caso, é um juízo analítico, na terminologia de Kant: o predicado nada acrescenta ao sujeito, é uma formulação tautológica deste.
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