Os erros de hiper-análise - fragmentar, dissociar em partes isoladas ou duplicar artificialmente uma ideia ou essência una - atravessam toda a história da filosofia ocidental.
Platão equivocou-se em certa medida ao distinguir entre crença verdadeira ou opinião verdadeira (alethès doxa), por um lado, e conhecimento ou ciência (epistéme) , por outro lado, dizendo que só o segundo possui Logos (Razão).
Atente-se nos argumentos desenvolvidos neste excerto do «Teeteto» (as palavras em itálico correspondem a outra tradução que não a da Inquérito):
«SÓCRATES- Então, quando há juízes que se acham justamente persuadidos de factos que só uma testemunha ocular, e mais ninguém, pode saber, não é verdade que, ao julgarem esses factos por ouvir dizer, depois de terem formado deles uma opinião (crença) verdadeira, pronunciam um juízo desprovido de ciência (conhecimento), embora tendo uma convicção justa, se deram uma sentença correcta? »
«TEETETO- Com certeza. »
« SÓCRATES- Mas, meu amigo, se a opinião (crença) verdadeira dos juízes e a ciência fossem a mesma coisa, nunca o melhor dos juízes teria uma opinião correcta sem ciência (conhecimento). A verdade, porém, é que se trata de duas coisas diferentes.»
«TEETETO- Eu mesmo já ouvi alguém fazer essa distinção, Sócrates; tinha-me esquecido dela, mas voltei a lembrar-me. Dizia essa pessoa que a opinião (crença)verdadeira acompanhada de razão (Logos) é ciência e que, desprovida de razão, a opinião (crença)está fora da ciência (conhecimento)e que as coisas que não é possível explicar são incognoscíveis ( é a expressão que empregava)e as que é possível explicar são cognoscíveis». (Platão, Teeteto, Editorial Inquérito, Lisboa, 1990, pags. 158-159).
O exemplo que constitui o argumento de Platão para distinguir entre crença/opinião verdadeira e conhecimento/ciência é falacioso: os juízes raciocinaram bem e sentenciaram bem, com base em um testemunho do crime, que ignoram ser falso, e isso seria a «opinião verdadeira» mas não o «conhecimento» porque lhes teria faltado.. o Logos(Razão).
De facto, se reflectirmos, o Logos não faltou aos juízes, ao contrário do que Platão, pela voz de Teeteto, sustenta: faltou-lhes sim, a Empeiria (a Experiência Sensorial Directa) do crime. Os juízes tiveram conhecimento da versão da testemunha; não tiveram conhecimento das circunstâncias reais em que se deu o crime. Contudo, pensaram bem, de um ponto de vista lógico ideal. Obtiveram o conhecimento de um cenário, teoricamente possivel, mas que não teve lugar, e da correspondente sentença.
Dizer que o conhecimento é a adição do Logos à crença verdadeira é, ao menos neste exemplo, um erro do pensamento mecanicista, hiper-analítico. O Logos está presente, com gradações diversas, em todas as formas de pensamento. Decerto a distinção «crença verdadeira» (alethès doxa) e «ciência» (epistéme) tem fundamento se consideramos a primeira como o realismo natural (exemplo: o tampo desta mesa é liso) e a segunda como o realismo crítico (exemplo: o tampo desta mesa parece liso mas não o é, está cheio de espaços vazios entre os átomos, imperceptíveis à vista e ao tacto).
Se Platão errou ao exemplificar acima a distinção entre conhecimento de opinião verdadeira, como não haveríamos de esperar estas enormes confusões dos Manuais de Filosofia em voga que dizem enormidades analíticas como os postulados «acreditar e saber são coisas distintas» e «saber e conhecer não é o mesmo»?
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