O consequencialismo é toda e qualquer teoria ética segundo a qual o factor decisivo da acção moral não é a intenção, abstractamente considerada, o procedimento, a norma, mas sim o resultado, a consequência da acção.
Por exemplo: «Se para matar a fome a crianças abandonadas é indispensável entrar numa quinta ou num chalé de gente rica para roubar alimentos, leva-se a cabo essa acção e dá-se os alimentos às crianças, tendo por consequência a sobrevivência destas.» O importante foi a consequência da nossa acção ( salvar as crianças) e não o método, a causa eficiente (roubo com invasão de propriedade privada).
Existe incoerência na definição de consequencialismo, entre os autores mais reputados na ética. Por exemplo, Pedro Galvão, que recolhe os pontos de vista de diversos teóricos renomados nessa área, escreveu:
«O consequencialismo é a perspectiva normativa segundo a qual as consequências das nossas opções constituem o único padrão fundamental da ética. Esta perspectiva corresponde a um conjunto muito abrangente e diversificado de teorias da obrigação moral, do certo e do errado, e não há um acordo perfeito quanto às condições que uma teoria tem de satisfazer para ser classificada como «consequencialista». (O egoísmo ético, por exemplo, nem sempre é considerado uma versão de consequencialismo.) No entanto, as teorias consequencialistas mais puras exibem seguramente três características importantes. Em primeiro lugar, aplicam-se directamente a actos individuais. Em segundo lugar, prescrevem a maximização do bem, isto é, afirmam que os agente morais estão sob a obrigação permanente e ilimitada de dar origem aos melhores estados de coisas ou situações. Em terceiro lugar, pressupõem uma teoria do valor que resulta numa avaliação dos estados de coisas em termos estritamente impessoais.» (Pedro Galvão, www.galvao.no.sapo.pt/ consequencialismo, transcrito em 30 de Janeiro de 2006; o negrito é posto por nós).
Em seguida, Galvão caracteriza um «consequencialismo das regras», noção contraditória com a que acabou de explicitar porque desloca o centro de gravidade da avaliação moral da consequência para a causa, para o método de acção e portanto, deixaria de ser um consequencialismo:
«A segunda estratégia consiste em advogar uma versão indirecta de consequencialismo. Em vez de aplicar directamente o seu padrão normativo a actos, o consequencialista pode eleger outro tipo de ponto focal - por exemplo, regras, motivos ou traços de carácter. O consequencialismo das regras, cujo representante mais influente é talvez R. B. Brandt (1979), é a opção mais frequente. Segundo esta perspectiva, o estatuto moral de um acto depende da sua conformidade a regras, de tal maneira que um acto é errado se, e apenas se, estiver em desacordo com as regras morais correctas.» (Pedro Galvão, www.galvao.no.sapo.pt/ consequencialismo, transcrito em 30 de Janeiro de 2006).
Esta segunda definição de «consequencialismo das regras» aplica-se perfeitamente à ética de Kant. No entanto, Kant é classificado por estes "especialistas" da ética como um «não consequencialista». Isto, a nosso ver, traduz uma confusão intelectual, própria do espírito hiper-analítico e hipo-sintético que caracteriza a grande maioria dos catedráticos de Filosofia nas universidades de todo o mundo. O imperativo categórico em Kant é ou não consequencialista, visa ou não implementar uma acção geradora de tal ou qual consequência? Sem dúvida, sim. Consequencialismo não se opõe a deontologismo. O próprio Stuart Mill é deontologista e consequencialista. E Kant é-o também, sob outra forma.
(Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
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