Schopenhauer sustenta que os catedráticos de filosofia não são, em regra, autênticos filósofos porque estão obrigados a representar o papel de «sábios», com respostas para tudo, e isso impede-os de levar a cabo a investigação livre da verdadeira filosofia, desprendida de interesses económicos e de prestígios institucionais:
«Descobrimos aqui em primeiro lugar que, desde sempre, muito poucos foram os filósofos que foram também professores de filosofia e, proporcionalmente, ainda menos os professores de filosofia que foram também filósofos. Podíamos dizer por consequência que, do mesmo modo que os corpos idioeléctricos não são condutores de electricidade, os filósofos não são professores de filosofia. Em verdade, para o que pensa por si mesmo esta tarefa estorva-o mais do que qualquer outra. Pois a cátedra de filosofia é de certo modo um confessionário público, onde um faz a sua profissão de fé coram populo (em presença do povo). Ademais, em ordem à aquisição autêntica de uma compreensão fundamental e profunda, quer dizer, em ordem a chegar a ser de verdade sábio, quase não há nada que seja mais contraproducente que a obrigação perpétua de parecer sábio, esse alardear de supostos conhecimentos ante uns alunos ávidos de aprender, esse ter à mão respostas para todas as perguntas imagináveis» (Arthur Schopenhauer, Sobre la Filosofía de Universidad, Editorial Tecnos, Madrid, pag. 46-47).
E mostra que há uma rede de solidariedades pessoais entre os professores catedráticos e os agregados que cria um corrupto aparelho de propaganda de prestígios e índices de saber aparente:
«Con los filósofos académicos de nuestros días las cosas van sin duda más aprisa. No tienen tiempo que perder: es suficiente que un profesor cualquiera proclame, ante los colegas importantes de la universidad más próxima, que la doctrina de su compañero constituye la culminación de la sabiduría humana, finalmente lograda. Enseguida se convertirá en un grande filósofo, pasando a ocupar sin más preámbulos el lugar que le corresponde en la historia de la filosofía, es decir, en la que un tercer colega está preparando para la próxima exposición» (Schopenhauer, ibid, pag 63)
O que vale o saber universitário institucional dos catedráticos, agregados e outros? Muito menos do que aquilo que aparenta. A entrada para o cargo de catedrático faz-se por cooptação: são os poucos que já lá estão que decidem sobre o valor da tese de doutoramento e, em regra, não permitirão que esta derrube as torres de prestígio que construiram para si mesmos...
Aliás, não são os melhores professores de filosofia quem faz os programas de filosofia, os testes nacionais de exame, os manuais. São aqueles que, mercê do seu activismo teórico - em muitos casos marcado por inépcia - e da sua capacidade de promoção mediática - ora porque se constituiram em associação ou sociedade de professores de filosofia, ora porque contactaram na hora certa o editor X ou Y ou o funcionário do Ministério da Educação ligado ao Departamento de programas ou de avaliação de exames - conseguem conquistar lugares-chave. E em Portugal, um país de clientelas seculares, onde a «cunha» e o telefonema simpático que abre uma porta do poder ao "esperto" são comuns, mais se acentua o triunfo dos incompetentes que passam por «filósofos inovadores».
Como obstar a isto? É quase impossível. Só através de um largo movimento de crítica pensante, que inclui a publicação em papel ou na internet de numerosos artigos mostrando as falácias e insuficiências teóricas dos autores dos programas, manuais e exames nacionais de filosofia, é possível reduzir ou mesmo apagar a deletéria influência dos medíocres e dos pseudo-pensadores (licenciados, mestres e doutores) que, pretensamente críticos e organizados em rede, possuem no número vasto dos seus adeptos e iniciativas «filosóficas» a arma para triunfarem socialmente.
© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
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