Para desfazer dúvidas de que a História da Filosofia é, em grande parte, filosofia - tese que os cérebros antidialécticos, congelados no frigorífico da lógica proposicional parecem não ser capazes de assimilar - vamos exemplificar.
Tomemos a História da Filosofia , do filósofo espanhol Julian Marías, já publicado há décadas, em 1959.
HISTÓRIA DA FILOSOFIA
Eis um excerto de história da filosofia desse livro, excerto que não é filosofia mas história:
«Este cidadão ateniense (Epicuro) nasceu em Samos, donde havia emigrado o seu pai. Foi para Atenas em fins do séc. IV, no ano 366 fundou a sua escola ou comunidade num jardim. Parece que era uma personalidade notável, tendo exercido um extraordinário ascendente entre os seus adeptos.» (Julian Marías, História da Filosofia, Edições Sousa e Almeida, pag 109).
FILOSOFIA
Eis um excerto de filosofia dentro deste livro:
«Epicuro opina que o prazer é o verdadeiro bem; e além disso disso é o prazer que nos indica o que convém e o que repugna à nossa natureza. Rectifica, pois, as ideias de hostilidade anti-natural em relação ao prazer, ideias essas que invadiam grandes zonas da filosofia grega. Parece à primeira vista que o epicurismo é o contra-pólo da Stoa; mas as semelhanças não são mais profundas do que as diferenças. Em primeiro lugar, Epicurismo exige que o prazer se revista de condições especiais: tem de ser puro, sem mistura de dor ou desagrado; tem de ser duradoiro e estável; tem de deixar, por fim, o homem dono de si, livre, imperturbável. Com isto eliminam-se, quase totalmente, os prazeres sensuais a fim de se dar lugar a outros mais subtis e espirituais, e, antes de mais nada, à amizade e aos prazeres do trato. Excluem-se, na ética epicurista, as paixões violentas porque arrebatam o homem.» (Julian Marías, História da Filosofia, Edições Sousa e Almeida, pag. 110).
Isto não é filosofia? É óbvio que é. Explana ideias filosóficas como «o prazer é o verdadeiro bem» mas «o prazer autêntico deve ser duradoiro, estável, em primeiro lugar a amizade e o convívio amável.» Quem quer que leia isto, desde que entenda o sentido das frases, filosofa, inevitavelmente.
Poderão alguns objectar que Julian Marías não é Epicuro, está a interpretar este. Estamos de acordo. Mas o texto de Marías é filosófico. Cabe-nos compará-lo com os pensamentos originais de Epicuro para verificar se reproduziu, se restaurou a filosofia do grego antigo ou se a adulterou gerando outra filosofia.
© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)
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