Pensador da tradição contra-revolucionária, Frederico Nietzschze (1844-1900) desenhou da mulher um retrato curioso, com pinceladas psicológicas de grande originalidade que espantaram Sigmund Freud.
Segundo o pensamento citado abaixo, o amor paterno seria, aparentemente, uma peculiaridade da espécie humana e, implicitamente, estaria ligado ao papel produtivo do homem, num século XIX em que a grande maioria das mulheres trabalhava em casa sem salário e era o homem quem trazia dinheiro para casa depois de laborar na fábrica, na mina, na pesca, no escritório, na loja ou no armazém:
«72- As Mães. Os animais têm da mulher uma opinião diferente daquela que pertence aos humanos; a fêmea é para eles o elemento produtivo. Ignoram o amor paterno; encontra-se neles alguma coisa parecida com o afecto que se pode ter pelos filhos de uma amante e com o hábito que se ganha deles. Nas fêmeas os filhotes satisfazem um apetite de domínio, de propriedade; eles ocupam-nas, elas compreendem-nos inteiramente, são parceiros de conversa; tudo isso é o amor materno, comparável ao amor do artista pela sua obra. A gravidez torna as fêmeas mais suaves, mais pacientes, mais receosas, mais submissas; do mesmo modo a gravidez intelectual cria o carácter contemplativo que se aparenta com o das mulheres; os contemplativos são as mães masculinas. Nos animais o belo sexo é o dos machos.» (Nietzschze, A gaia ciência, Guimarães Editores, Pág. 92; a letra negrita é por mim colocada).
É interessante notar a comparação entre as mulheres grávidas e os intelectuais masculinos: ambos os géneros estão grávidos, elas de crianças, eles de ideias; a contemplação dos intelectuais ou espera do nascimento de ideias e teses equipara-se à gravidez feminina, e torna as pessoas mais suaves, pacientes, submissas. De facto, os intelectuais, em regra, controlam as suas reacções espontâneas de mau humor ou afrontamento verbal com alguém, o que não sucede com muitas pessoas comuns de reacções primárias. O intelectual é mais suave nas suas reacções do que o manual porque os seus neurónios activos, forjando representações dilatórias, esvaziam a explosão imediata de violência: veja-se, por exemplo, a diferença entre as manifestações de rua dos professores espanhóis, indignadas mas pacíficas, e as manifestações de rua de operários dos estaleiros navais espanhóis, frequentemente deslizantes para violência física contra a polícia.
Nietzschze escreveu ainda, revelando um carácter algo misógino, alertando contra o feminismo que triunfaria na segunda metade do século XX:
«232- A mulher quer emancipar-se: e para isso começa a esclarecer os homens sobre a mulher em si isto constitui um dos piores afeamentos da Europa. Pois quanta coisa não se revelará nestas tendências desajeitadas do cientifismo e auto-desnudamento femininos! A mulher tem tantas razões para ficar envergonhada: na mulher há tanto de pedantismo, de superficial, doutrinário, de presunção mesquinha, de pequenez desenfreada e imodesta analise-se o seu convívio com crianças! o que, no fundo, até agora, só o medo do homem refreou e reprimiu. ( )»
«Desde a origem, nada é mais estranho, mais avesso, mais odioso à mulher do que a verdade a sua grande arte é a mentira, o que mais lhe interessa é a aparência e a beleza. Confessemo-lo, nós homens: nós honramos e amamos na mulher precisamente essa arte e esse instinto: nós que temos uma vida difícil, e para nos alijarmos, gostamos de nos juntar a seres sob cujas mãos, olhares e tolices ternas, a nossa seriedade, o nosso peso, a nossa profundidade quase nos aparecem como uma tolice. Finalmente pergunto: jamais uma mulher concedeu profundidade a um cérebro de mulher, justiça a um coração de mulher?» (Nietzschze, Para além do bem e do mal, Guimarães Editores, Págs 154-155; a letra negrita é posta por mim).
A tradição contra-revolucionária vê na mulher uma criatura graciosa, superficial, centrada na beleza e nas aparências, tal como o deus Apolo concebido por Nietzschze, com uma função reprodutora e conservadora de mãe, esposa, por um lado, e uma função hedónica de amante devotada ou concubina, por outro lado. No entanto, para a tradição machista, a faceta de racionalidade e espírito geométrico atribuída por Nietzsche ao deus Apolo não seria característica principal do modo de ser feminino.
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