O "Routledge dictionary of philosophy» diz o seguinte:
«Os deterministas moderados (soft determinists), de longe o maior grupo em tempos recentes, dizem que as nossas acções são, de facto, causadas mas não estamos, portanto, menos livres do que devíamos estar, porque a causação não é um constrangimento ou compulsão sobre nós. Enquanto as nossas naturezas e escolhas forem efetivas como itens na cadeia causal, o facto de elas próprias serem causadas é irrelevante e não as impede de ser o que são» ("The Routledge Dictionary of Philosophy, page 146, fourth edition).
Comecemos por apontar um erro no texto que acabamos de ler: os deterministas moderados não dizem que (todas) as nossas acções obedecem ao determinismo - «estão causadas», expressão de que não gosto por ser ambígua - mas sim que uma grande parte das nossas acções (exemplo: comer, beber, dormir, vestir roupa, andar, etc) obedecem ao determinismo neurofisiológico e não são livres. Escrever que «as nossas acções são causadas mas continuamos livres» é um contra-senso. Entrar no automóvel e guiá-lo é uma acção determinada ou uma acção livre? Segundo o Routledge Dictionary é ambas as coisas. Nuvem de Confusão! No mesmo aspeto e ao mesmo tempo, não podem dar-se os contrários (princípio da não contradição). Dizer que «o facto de as nossas naturezas e escolhas serem causadas (determinadas, não livres.).. é irrelevante» é um contrasenso. Se são determinadas, não são livres. Há aqui falta de poder de análise.
E o Routledge prossegue:
«Os deterministas moderados são compatibilistas. Os indeterministas podem ser ambas as coisas, mas são habitualmente incompatibilistas.»
«Uma dificuldade com o indeterminismo é que a mera ausência de causação parece não ser suficiente. Se as nossas ações não são mais do que intrusões aleatórias no esquema causal das coisas como podemos ser responsável por elas mais do que se forem causadas? Os indeterministas são, por vezes, denominados libertarianos. Mas mais estritamente, os libertarianos são aqueles que postulam uma entidade especial, o self, que usa o corpo para intervir de fora, por assim dizer, na cadeia causal dos acontecimentos, mas é, em si mesmo, imune à influência causal.» (Routledge Dictionary of Philosophy, page 146).
Há evidentemente, aqui uma confusão: segundo este dicionário, no indeterminismo «as nossas ações não são mais do que intrusões aleatórias no esquema causal das coisas» o que radica no «eu» (self), exterior aos determinismos, autor dessas acções. Mas isto é exatamente o determinismo conjugado com livre-arbítrio, isto é, o «determinismo moderado», um compatibilismo. Se o self está fora da cadeia causal dos acontecimentos, esta é admitida pelo libertismo. Logo este e o «determinismo moderado» são o mesmo. Está-se num jogo de palavras, no relvado das incoerências teóricas...O Routledge Dictionary desliza como a faca sobre a manteiga das imprecisões teóricas, dos equívocos.
O problema que os filósofos analíticos, e outros como Nietzschze, não conseguem conceber é que a articulação entre os acontecimentos do passado do presente e do futuro não é uma cadeia determinista contínua mas uma série de cadeias deterministas, descontínuamente articuladas entre si, uma das quais é accionada, rotativamente, a cada momento pelo livre-arbítrio dos homens ou pelo fator acaso que perpassa na natureza biofísica.
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