Domingo, 23 de Agosto de 2015
Pequenas reflexões de Agosto de 2015

 

 

.Eis algumas reflexões, umas vulgares, outras menos vulgares, que me ocorrem durante este Agosto de 2015.

 

O VAZIO DA VIDA - Como a vida é vazia - tudo desaparece, nada permanece eternamente excepto o nosso eu psíquico - temos de a encher de coisas e actividades a cada momento para ir passando o tempo: trabalho de fábrica, escritório, vendas ou escola, escrita de comentários no «Facebook», telefonemas e mensagens SMS, compras no supermercado, viagens, almoços e jantares de amigos, erotismo com a pessoa amada ou outra, frequência de cursos secundários ou universitários, arrumação da casa, escrita de poemas ou diários de notas pessoais, compra de livros, de casas, terrenos agrícolas e automóveis, espectáculos de futebol e tourada, frequência de salas de cinema, de bailes, de praias, de bares, de missas, de comícios de partidos políticos, de salões de esteticista, feitura de tatuagens ou operações de cirurgia estética, etc. Isto é feito à espera da morte, «esquecendo» que ela nos espera dentro de poucos ou muitos anos e tudo relativiza, faz do que parecia importante algo inútil e sem valor.

 

AMAMOS AS MULHERES porque a vida é um imenso vazio como uma enorme vagina.

 

TALVEZ OS ASTROS APRISIONEM DEUS NAS SUAS ÓRBITAS MATEMÁTICAS e Deus não possa agir sobre nós como quereria ou como nós lhe pedimos.

 

O VERDADEIRO AMOR é juntar-se com uma pessoa ou casar com ela sem sentir paixão, «sem sentir nada por ela», e fazer tudo para manter ou tornar essa pessoa feliz como se fosse nosso dever. Casar por interesse é bom, nestas circunstâncias. Não esperas que o amor surja de início, ele pode vir depois.

 

O VERDADEIRO AMOR VAI ALÉM DO SUTIÃ, DAS CALCINHAS E ATÉ DA PROFUNDIDADE VAGINAL. É metafísico mas ergue-se a partir do físico, treina-se no «ginásio» das carícias e contrações musculares.

 

O AMOR É UM PROBLEMA ESTOMACAL E NÃO SÓ - Se não alimentares a pessoa amada com gaspacho, sopa de legumes, tostas de queijo, fruta, iogurtes, açorda de bacalhau, gelados de chocolate e baunilha, etc, ou se ela não se alimentar a si mesma, com posses próprias do seu trabalho, destes e de outros alimentos, não há amor. Porque o amor é um «automóvel» que funciona a «gasolina» de alimentos vegetais e animais.

 

AMO IMENSO AQUELA MULHER porque mal a conheço. Se a conhecesse bem, amá-la-ia um pouco menos. Ou talvez nem a amasse.

 

«NÃO PODES AMAR-ME, NÃO ME CONHECES» diz-me uma mulher jovem e bela. Erro: amo-te exatamente porque não te conheço. Amar é uma idealização que só depois desce ao contacto físico.

 

AMO O TEU ROSTO MAIS QUE O TEU CORPO . Pois se o teu corpo andasse sozinho, sem cabeça, talvez eu nem reparasse nele. Mas se a tua bela cabeça de mulher voasse, de olhos abertos e sorrindo, sozinha, sem corpo, eu repararia nela e amá-la-ia.

 

UM SIMPLES BEIJO DE AMOR VALE MAIS DO QUE ESTAR NO FACEBOOK. O amor é mais importante que comunicar com um público, anónimo ou não, no Facebook. Quem não tem Facebook será mais realizado no amor do quem anda no Facebook, projectando o seu ego e alargando a sua rede de audiência? O FACEBEIJO não será melhor que o FACEBOOK ( LIVRO DE ROSTO)? A realidade física é melhor que a metafísica.

 

NINGUÉM TE AMA, NEM OS TEUS FAMILIARES. TU É QUE ÉS INGÉNUO OU INGÉNUA E AMAS. Este é um mundo de mónadas, pessoas-átomos fechados em si mesmas, que só comunicam entre si por interesse.

 

SE ENCONTRASSE A MINHA NAMORADA OU ESPOSA EM ACTO SEXUAL ERÓTICO COM UMA LÉSBICA, seria capaz de lhe perdoar, em princípio. Mas se a encontrasse com um homem na cama ou no carro em carícias íntimas terminaria logo a minha relação com ela. Orgulho masculino...Um homem que penetra uma mulher deixa, geralmente, no interior dela a sua marca, o seu sémen, o que, para nós, os Genuínos Machos Alquímicos é uma conspurcação - se se trata da nossa namorada ou esposa. Gostamos de mulheres virgens ou muito pouco usadas porque são espiritualmente mais íntegras do que as que experimentaram muitos parceiros. Ora uma lésbica não conspurca dessa forma o corpo da nossa amada, em princípio... Claro que dou razão a muita gente no aspecto em que a traição é condenável. Deve-se usar da sinceridade com o amado ou a amada.

 

 

A RELAÇÃO MULHER-HOMEM INVERTEU-SE. Reflexão da minha amiga F: «Nós as mulheres sofremos séculos de opressão masculina, de maus tratos, e a situação está a mudar. Há 50 ou 100 anos era a mulher que queria casar, «prender» o homem que era un Don Juan, livre de compromissos, machista. Agora, é o contrário: eles os homens é que querem casar, fixar a mulher pelo compromisso de fidelidade e nós, mulheres, queremos ser livres, desfrutar namoros, sexo, com este ou com aquele, a oferta é grande e a sociedade é mais liberal e aberta, a podridão é maior, a perda de valores é quase total. Os homens feminizaram-se - o exemplo é o dos metrossexuais que se depilam, cuidam das unhas, sobrancelhas, etc., como as mulheres - e as mulheres masculinizaram-se.»
E virando-se para mim, F. diz: «Francisco, nasceste na sociedade errada, no país errado. Porque defendes a liberdade de um homem se vestir de mulher em público sem ser gay e sem ser apontado como gay, a liberdade de a mulher vestir como quiser e a sociedade portuguesa é retrógrada, frustrada e procura esmagar os dissidentes da moral católica e conservadora reinante».

 

DENTRO DE MIM HÁ UMA MULHER. E há, obviamente, um homem, másculo, viril, que se sobrepõe a ela e a vigia e, de vez em quando, a deixa pôr uma cabeleira loira e envergar um vestido vermelho diante do espelho e a deixa sair à rua no carnaval - é talvez a mulher Escarlate, de que falava o sacerdote gnóstico Aleister Crowley, mas interiorizada. O resultado disto é um comportamento rigorosamente heterossexual. E daí, vem algum mal ao mundo? Estou a ser mais sincero que tu, não estou?

 

 

ADMIRO-ME TANTO A MIM MESMO (ISTO É: ADMIRO TANTO O DEUS E A DEUSA QUE ME HABITAM) QUE GOSTARIA DE CASAR COMIGO MESMO. Mas como isso é demasiado egocêntrico, amo uma mulher jovem e bela, ela mesma incarnação e prolongamento da Deusa que me habita.

 

O CASAMENTO HETEROSSEXUAL É O PRIMEIRO PASSO PARA A HOMOSSEXUALIDADE EM ACTOS. Os homens casam, muitas vezes, com as mulheres da sua vida. Mas com o passar dos anos cansam-se delas: conhecem a sua forma de fazer amor, as suas rotinas, os seus defeitos, todos os casamentos se desgastam e nasce em quase todos os homens o desejo de experiências sexuais selvagens, incomuns, nomeadamente a homossexualidade. E assim, conforme estudos sociológicos demonstram, a esmagadora maioria dos clientes de travestis prostitutos ou gays não travestis que vendem o corpo são homens casados: advogados, juízes, engenheiros, arquitectos, médicos, funcionários públicos, directores ou gestores de empresas, etc. Ter as mulheres como coisa certa, conquistada, leva muitas vezes a desejar o oposto, o fruto proibido, a relação sexual gay.

 

Disse a revista norte-americana Star , em um número de Março de 2015 que os actores Tom Cruise de 51 anos, e John Travolta de 61, casado há 24 anos com Kelly Preston, mantêm uma relação amorosa há quase trinta anos. Uma fonte próxima do casal terá mesmo dito à "Star" que "John Travolta tornou-se obcecado por Tom Cruise depois de ver o filme Negócio Arriscado, em 1983" e indica ainda um sítio secreto onde os dois se encontram. Cansaram-se das mulheres. O casamento preparou e fomentou esse cansaço, propiciando a passagem ao mundo gay. Desconfiemos dos casamentos. São fachadas, apenas úteis à educação dos filhos, à sobrevivência económica ou ao apoio fraterno na doença e na solidão.

 

OS HOMENS NÃO PASSAM DE MULHERES a quem uma super máquina genética retirou os seios grandes capazes de dar leite, os ovários e a vagina substituindo esta por um pendente chamado pénis ancorado em bolsas testiculares. Psiquicamente, há em cada homem uma alma feminina (a ANIMA) a par da alma masculina (o ANIMUS) sendo esta última a dominante no caso dos heterossexuais.

 

COMO PODERIA DEUS, O CRIADOR, CONDENAR A HOMOSSEXUALIDADE se dotou todos os homens de rabo e o rabo é, além de orgão excretor, um orgão que induz à função homossexual masculina, latente em todos os homens?

 

TROÇAS DO JOSÉ CASTELO BRANCO CHAMANDO-LHE «BICHA» MAS ELE TEM MAIS CORAGEM DO QUE TU - José Castelo Branco (8 de Dezembro de 1962, Tete, Moçambique), o andrógino do jet set lisboeta, foi violado aos 8 anos de idade pelo namorado de uma prima sua, de 26 anos de idade, em Moçambique. E se a ti, que és heterossexual (no comportamento visível) e que possuíste poucas ou muitas mulheres, te tivesse acontecido o mesmo quando criança? Não serias efeminado como o Castelo Branco? Mas confessa: tu, o heterossexual, o machão, tens, ao menos às vezes, secretas fantasias gays no plano mental. Mas do mesmo modo que não tens a coragem de te vestires de mulher e de assim te exibires em público, nem mesmo no carnaval, (o Castelo Branco tem mais coragem que tu, despreza o riso alarve da maioria) também não tens a coragem de admitir os teus pensamentos homossexuais que inevitavelmente derivam de teres rabo, hormonas femininas, etc. És talvez um «paneleiro mental», ocasional ou não, que troça dos paneleiros que se assumem com coragem...

 

NÃO AMAMOS OS AMIGOS DE FORMA PERMANENTE: são apenas «brinquedos» falantes e sorridentes que ouvem as nossas histórias e dão opiniões, que nos convidam para festas de aniversário, que nos acompanham em almoços ou idas a bar, ou nos resolvem um problema de computador ou nos levam o filho ou a filha de boleia para Lisboa, Moura, Serpa ou Faro. É tudo política pessoal, fazer valer o nosso interesse sobre o dos outros, de maneira amável...

 

O AMOR PAIXÃO É UMA ESPÉCIE DE «ERVA», DE HAXIXE INOFENSIVO QUE TE DÁ ALEGRIA, SE ÉS CORRESPONDIDA/O. Mas não queiras saber o que há para além do amor-paixão que te dá um cosmos perfeito tu.ela ou tu-ele: caos, caos e mais caos.

 

OS PAIS NÃO AMAM OS FILHOS: SENTEM-SE RESPONSÁVEIS POR ELES. É discutível chamar a isto amor.

 

PAULO SALVADOR, DEFENSOR DO CARNIVORISMO - Em cada telejornal de horário nobre da TVI, surge o programa «Mesa Nacional» feito pelo jornalista Paulo Salvador: este mostra restaurantes espalhados por todo o país e os pratos de carne e peixe que são característicos desses estabelecimentos. É uma defesa cerrada do carnivorismo, baseado na matança de porcos, vacas, frangos, galinhas, perdizes, codornizes, douradas, chernes, pescadas, sardinhas, carapaus, cavalas, salmões, atuns, robalos, bacalhaus, etcPaulo Salvador é réu perante um ideal Tribunal de Defesa dos Direitos dos Animais. A compaixão budista está ausente dele e dos seus amigos: há que matar e comer animais. E nós, os cristãos, católicos ou não, comemos sem remorso a carne dos animais, como comemos o «corpo de Cristo» (canibalismo simbólico). Não passamos de pequenos criminosos, assassinos de espécies animais. E o papa Francisco? Se come carne como pode estar em contacto com o Senhor Supremo?

 

A SITUAÇÃO DE ESCRAVATURA DE ROMENOS NO ALENTEJO. Controlados por sub-empreiteiros mafiosos que os trazem de autocarro da Roménia para trabalhar por uns meses no Alentejo, há alguns milhares de romenos na nossa região a viver e trabalhar em condições degradantes. São Matias, Baleizão e Cuba são algumas das localidades onde se concentram. Vivem, muitas vezes, 10, 20 ou 30 numa mesma casa que alugam, chegando ao ponto de arrancarem o soalho da casa no inverno para fazerem fogueiras que os aqueçam. Eis um exemplo da escravatura a que se submetem: um agricultor que os contrate indirectamente para a apanha da azeitona paga ao sub empreiteiro 40 euros ao dia por trabalhador mas este último só recebe 15 euros por dia, ficando o sub empreiteiro com 25 euros de mais valia roubada a cada operário. Impressionante. Fazem mal os agricultores que colaboram com a mafia romena. Deveriam pagar directamente ao trabalhador. Não admira que se multipliquem assaltos a automóveis, casas, armazéns, etc. O escravo esfomeado precisa de comer. Quem põe fim à exploração capitalista-esclavagista dos imigrantes romenos e outros no Alentejo?

 

SÃO MAIS AS PESSOAS QUE DESPREZAMOS DO QUE AS QUE AMAMOS. Esta é uma triste e inevitável realidade humana. Que te importam a ti os desempregados, os esfomeados, os doentes? Importam só na teoria, em abstracto. E poderia ser de outro modo?

 

www.filosofar.blogs.sapo.pt
f.limpo.queiroz@sapo.pt

 

© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)

 



publicado por Francisco Limpo Queiroz às 12:33
link do post | comentar | favorito

Terça-feira, 29 de Abril de 2014
Equívocos no manual da Santilhana «O projecto desafios, 11º ano de Filosofia», (Crítica de Manuais Escolares- LVI)

 

Alguns equívocos enformam o manual do professor «O projecto desafios, 11º ano de Filosofia», da Santilhana Editores, de Faustino Vaz e Marta Brites, com revisão científica de Adriana Silva Graça e João Cardoso Rosas.

 

 

O VERDADEIRO CONHECIMENTO IMPLICA CRENÇA?

 

Sobre a definição da filosofia analítica àcerca do conhecimento como  «crença verdadeira justificada» diz o manual:

 

CRENÇA

«Este requisito é óbvio. Não é concebível termos conhecimento de factos em que não acreditamos. O conhecimento não pode ser-nos atribuido se não acreditarmos nos factos em questão. Esse é um dos méritos do sujeito que tem uma relação com o mundo bem-sucedida. No entanto, por mais esperançada que seja a crença, se não for verdadeira e se para ela  não tivermos uma justificação adequada, não é um caso de conhecimento». (Faustino Vaz e Marta Brites, «O projecto desafios, 11º ano de Filosofia», revisão científica de Adriana Silva Graça e João Cardoso Rosas, Santilhana Editores, página 154).

 

«Não é concebível termos conhecimento de factos em que não acreditamos», dizem os autores. Ora, ao contrário dessa posição, não acreditar nos factos em questão é, muitas vezes, uma forma superior de conhecimento. O céptico descrê porque conhece intuitivamente que muitos juízos são pura fantasia. Tanto a crença como a descrença - que é uma crença negativa - são ingredientes do conhecimento. Por isso, é redundante e, em muitos casos erróneo, dizer que o conhecimento implica crença. Porque a crença implica um certo distanciamento entre o sujeito e o objecto - daí o «ver para crer» - ao passo que o conhecimento pleno é a pura adesão do sujeito ao objecto, acto no qual a crença se dissipa.

 

Em Platão, a crença é a pistis, que faz parte da doxa ou opinião. Ao nível da episteme (raciocínio científico) ou da noese (apreensão intuitiva do arquétipo) não há crença, há certeza. A certeza é inimiga da crença. Crer em Deus é não ter a certeza absoluta da Sua existência ou dos Seus predicados. Conhecer é estar com as coisas sem crença, é ter intimidade intelectual ou sensorial com essas coisas, materiais ou espirituais.

 

Quando se diz que o conhecimento é crença verdadeira comete-se um erro de paralaxe filosófica.

 

FALTA DE CLAREZA SOBRE ARGUMENTO DE ANALOGIA

Diz o manual:

 

«Consideremos o seguinte argumento por analogia:

 

«Argumento 7

1)  De há muitos anos a esta parte que o verão é a época do ano em que está mais calor, há mais turismo e a economia portuguesa melhora.

 

2) Este verão também há mais calor e mais turismo.

    Logo, a economia portuguesa melhora.»

 

(Faustino Vaz e Marta Brites, «O projecto desafios, 11º ano de Filosofia», revisão científica de Adriana Silva Graça e João Cardoso Rosas, Santilhana Editores, página 120).

 

Crítica minha: o argumento acima não é de analogia mas sim uma dedução de base empírica. A conclusão está implícita na premissa. Os autores não compreendem bem o que é a analogia. Um bom exemplo desta é a seguinte inferência: «O homem é análogo a uma árvore: os pés equivalem às raízes, as pernas e o tronco equivalem ao tronco da árvore, os braços correspondem aos ramos e a cabeça à copa».

 

 

www.filosofar.blogs.sapo.pt

f.limpo.queiroz@sapo.pt

 

 

 

© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)



publicado por Francisco Limpo Queiroz às 07:35
link do post | comentar | favorito

Quinta-feira, 4 de Abril de 2013
Conhecimento não implica crença

A filosofia analítica declara que o conhecimento é «uma crença verdadeira justificada». Ora, o conhecimento não é crença, não inclui a crença: o conhecimento é a apreensão de um objecto material, ideal ou lógico por uma consciência de um sujeito. A crença é colateral ao acto de conhecimento. Na verdade, só há crença na medida em que há dúvida, desconhecimento. Os católicos ou os judeus crêem em Deus porque não O conhecem, nem estão certos de que existe: desejam que Ele exista a fim de encontrarem paz e conforto. O céptico não é menos crente que o dogmático. O céptico crê que é impossível conhecer se há vida após a morte física, se os quarks e leptões existem realmente, se o amor a outrém existe, em si mesmo, ou se é apenas uma modalidade do amor próprio.

 

O que os crentes religiosos conhecem é uma ideia de Deus, uma descrição desta entidade, real ou meramente imaginária. Não conhecem Deus - a menos que reduzam este à mente superior de cada um, observada internamente. A crença implica fé. Mas o conhecimento dispensa a fé, porque, em si mesmo, é uma apropriação, um contacto intelectual ou empírico-intelectual com a verdade material ou ideal.

 

Na crença existe distância. No conhecimento, há fusão, anulação da distância. O conhecimento é uma adesão indiscutível, que está além da hesitação da crença.

 

 

f.limpo.queiroz@sapo.pt

 

© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)



publicado por Francisco Limpo Queiroz às 19:55
link do post | comentar | favorito

Quarta-feira, 12 de Outubro de 2011
Equívocos de Orlando Vitorino sobre a relação pensamento-conhecimento

Orlando Vitorino, (1922- 14 de Dezembro de 2003), filósofo português discípulo de Álvaro Ribeiro e José Marinho,  escreveu:

 

«Uma abissal, mas significativa divergência, assim se observa: na filosofia clássica, representada por Aristóteles, o pensamento precede o conhecimento, que dele resulta; na filosofia moderna, representada por Kant, o conhecimento é anterior ao pensamento e constitui seu conteúdo e objecto.» (Orlando Vitorino, Exaltação da filosofia derrotada, pag 86, Guimarães Editores; o negrito é posto por mim).

 

Parece haver um certo magma de confusão neste pensamento de Orlando Vitorino. Só os sensistas ou sensacionistas defendem que o conhecimento (empírico) é anterior ao pensamento. Ora, Kant não é um sensacionista: para ele, as sensações não fornecem, por si sós, conhecimento, precisam de ser elevadas, via imaginação ao intelecto que delas forma os conceitos empíricos. Por exemplo, é a partir da percepção empírica do fenómeno cavalo, obtida na sensibilidade, que o entendimento constrói o conceito empírico de cavalo.

 

Como é possível afirmar que, em Kant, o conhecimento é anterior ao pensamento? É um absurdo. Kant não é um empirista mas um empiro-racionalista. Kant admite o conhecimento a priori mas este é sempre um pensamento, um juízo, não há conhecimento anterior a pensamento. O conhecimento inicia-se com a experiência, mas em conjugação com o intelecto a priori. O conhecimento é pensamento a priori ou é pensamento a posteriori vitalizado pelas sensações:

 

«Se porém todo o conhecimento se inicia com a experiência, isso não prova que todo ele derive da experiência. (...) uma questão ... vem a ser esta: se haverá um conhecimento assim, independente da experiência e de todas as impressões dos sentidos. Denomina-se a priori esse conhecimento e distingue-se do empírico, cuja origem é a posteriori, ou seja, na experiência.» (Kant, Crítica da Razão Pura, pag 37,  Fundação Calouste Gulbenkian; o negrito é colocado por mim).

 

«Podemos, contudo, reduzir a juízos todas as acções do entendimento, de tal modo que o entendimento em geral pode ser representado como uma faculdade de julgar. Porque, consoante ficou dito, é uma capacidade de pensar . Ora pensar é conhecer por conceitos.»(Kant, ibid, Livro I, 1ª Secção,pag 103)

 

 

E Aristóteles não faz o pensamento anteceder o conhecimento: são simultâneos. Ainda que pudessemos admitir que o raciocínio (um pensamento) antecede por milésimas de segundo, o conhecimento, não podemos esquecer a intuição noética, o pensamento instantâneo que nos fornece as essências ou formas eternas:

 

«A ciência é conhecimento racional e, por sua vez, o conhecimento racional dá a conhecer a coisa e a sua privação» (Aristóteles, Metafísica, Livro IX, 1046 b, 5-10).

 

«Assim, pois, a respeito das coisas que são uma essência, e que são actos, não é possível errar, mas antes captá-las ou não». (Aristóteles, ibid, Livro IX, 1051 b, 30-35).

 

Ora a captação de uma essência é simultamente pensar e conhecer. Não há um pensar anterior ao conhecimento, em Aristóteles, se excetuarmos Deus que pensa sobre si mesmo e desconhece o cosmos. As formas eternas não são um pensamento vivo nem são matéria, porque o pensamento é acto de uma inteligência, divina, astral ou humana. São as ideias não pensantes, as formas inteligíveis mas não inteligentes, o pensamento não humano, por assim dizer, congelado, fixo. As essências de cavalo e montanha subsistirão mesmo que não haja nenhum homem para as apreender ou conceber.

 

 

 

www.filosofar.blogs.sapo.pt
f.limpo.queiroz@sapo.pt

 

© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)



publicado por Francisco Limpo Queiroz às 14:17
link do post | comentar | favorito

Quarta-feira, 2 de Fevereiro de 2011
Incoerências de "Filosofia em directo" de Desidério Murcho

O mediático tradutor e autor de manuais escolares de filosofia, o luso-brasileiro Desidério Murcho, no seu recente livro "Filosofia em directo", posto à venda em conjunto com a edição do jornal «Público» de 27 de Janeiro de 2011, explana em 96 páginas o que entende ser a natureza e os problemas da filosofia. O livrinho divide-se em nove capítulos: 1. Democracia; 2. Liberdade; 3. Autonomia; 4. Valor; 5. Sentido; 6.Realidade; 7. Contingência; 8. Raciocínio; 9. Verdade.

 

O livro é pouco esclarecedor sobre o que é a filosofia. Ausência de um quadro geral de referência à ontognoseologia e suas correntes fundamentais: realismo, idealismo, fenomenologia. Desidério evita a rocha de contornos bem marcados destas definições.. Não é o seu forte. Ausência de referência aos grandes contributos trazidos pelo rio da tradição filosófica: a matematização do mundo na filosofia pitagórica e galilaica; a formalização arquetípica do mundo nas filosofias de Platão, Aristóteles e da escolástica; a racionalização do mundo, em versão idealista de Kant, e em versão realista de Hegel e Marx; a sensorialização e insubstancialização do mundo por Hume, Mach, Avenarius, Russell, etc. Nada disto nos é referido. Sempre a velha preocupação de Desidério Murcho que faz lembrar os historiadores revisionistas que eliminam factos históricos: apagar a tradição filosófica, a filosofia que jorrou até nós pelas escadarias dos séculos, desde a Antiguidade.

 

PROCLAMAR O CEPTICISMO E APLICAR O MAIS ESTREITO DOGMATISMO

 

 Analisemos, com exemplos,  o tipo de argumentação desenvolvida por DM neste livro:

 

«Evolução

 

«Quem tiver a ideia de que a evolução biológica seria o fundamento do valor, comete igualmente dois erros. Primeiro, considera erradamente que o facto de termos certas preferências, explicáveis em termos de selecção natural, é razão suficiente para as aceitar. Isto é uma incompreensão dupla. Por um lado, as nossas preferências não são harmoniosas: temos de raciocinar arduamente para decidir entre elas - a evolução não decide por nós, qual Deus benevolente. Por outro, a origem biológica de uma preferência não lhe dá uma prerrogativa especial - a vontade que uma pessoa tem de fazer sexo com outra é obviamente biológica, mas nem por isso a outra está obrigada a aceitar.»

«Em segundo lugar, quem põe a teoria da evolução no lugar ocupado pelo Deus judaico-cristão, comete o erro biológico de crer que a evolução tem uma direcção ou propósito; nós teríamos então o dever de obedecer a este propósito da evolução, como se fosse um Deus. Mas a evolução biológica não tem qualquer propósito ou direcção. E, mesmo que o tivesse, daí não se concluiria que teríamos o dever de lhe obedecer. » (Desidério Murcho, Filosofia em directo, pag 48, Fundação Francisco Manuel dos Santos; o negrito é posto por mim).

 

Em primeiro lugar, Desidério não distingue, com clareza, valor, de preferência. O valor é um farol e a preferência um caminhar para esse farol.

 

Em segundo lugar, o facto de que «as nossas preferências não são harmoniosas: temos de raciocinar arduamente para decidir entre elas» não invalida que possa haver um pólo dominante na génese dos valores- e que esse polo seja a constituição biológica- e pólos dominados - a sociedade, a consciência moral e religiosa, etc. Também a teoria psicanalítica de Freud considera uma fonte genética dos valores, o id ou infra-ego, com o princípio do prazer, sem embargo dos conflitos que o super-ego, portador dos valores sociais, vindos de fora do indivíduo, causa ao reprimir o id.  Em suma, a desarmonia entre as preferências de valores não impede que a génese destes possa estar no instinto biológico. O argumento de que «a vontade que uma pessoa tem de fazer sexo com outra é obviamente biológica, mas nem por isso a outra está obrigada a aceitar.» é confuso, falacioso porque não se cinge ao conflito de preferências no seio do mesmo indivíduo mas recorre a uma vontade externa, a de outro.

 

Em terceiro lugar, Desidério Murcho, calçando as botas ferradas de um dogmatismo pouco filosófico, define a sua posição eliminando as outras, sem argumentar com fundamento. Ele opõe-se ao vitalismo ou ao biologismo teleológico, com uma petição de princípio: «a evolução biológica não tem qualquer propósito ou direcção porque é um substituto para a ideia de Deus.»

Falta demonstrar esta afirmação metafísica. A virtude filosófica de Desidério, se a possuir, e não fôr um sectário de uma corrente parcelar,  deveria ter a humildade de apresentar as duas teses que se opõem nesta matéria delicada e brumosa.

 

Poderia ter a liberalidade de citar, por exemplo, Bergson, que defende finalidade na evolução biológica:

 

«Em resumo, se nos exprimíssemos em termos de finalidade, diríamos que a consciência, depois de ter sido obrigada, para se libertar a si própria, a cindir a organização em duas partes complementares, vegetais e animais, procurou uma saída na dupla direcção do instinto e da inteligência. Não a encontrou com o instinto, e não a obteve, do lado da inteligência, senão através de um salto brusco do animal ao homem. De forma que, em última análise, o homem constituiria a razão de ser de toda a organização da vida no nosso planeta.» (Henri Bergson, A evolução criadora, pag 169, Edições 70).

 

Mas o mesmo tradutor que afirma que não há qualquer finalidade na evolução biológica contradiz-se ao escrever:

 

«Como sabemos então que sabemos seja o que for? Se estamos a perguntar como podemos garantir que sabemos quando cremos que sabemos, a resposta simples é nunca. Mas se raciocinarmos de maneira cuidadosa, podemos - cooperando cognitivamente com os nossos semelhantes - tomar medidas que diminuam o erro e aumentem o acerto.» (Desidério Murcho, Filosofia em directo, pag 88, Fundação Francisco Manuel dos Santos).

 

Há uma evidente inconsistência entre esta posição céptica e a posição dogmática acima expressa na tese de que «não há qualquer finalidade ou direcção na evolução biológica e esta não é a fonte dos valores». Se afirma que nunca podemos ter a certeza de nada, como pode garantir que estão errados os que sustentam que a vida orgânica é dotada de sentido e finalidades? É nesta caldeira de incoerência que ferve o pensamento de Murcho.

UMA PSEUDO-REFUTAÇÃO DO IDEALISMO 

 

Visando refutar o idealismo ontológico material e o cepticismo de que deriva, escreve DM:

 

«Declarar que todas as nossas convicções são ilusórias, precisamente porque não podemos excluir a hipótese do sonho, é fazer duas confusões.»

«Primeiro, não pode ser verdadeiro que todas as nossas convicções são ilusórias, porque nesse caso também a convicção de que todas as convicções são ilusórias seria ilusória; e se esta convicção for ilusória, então as outras convicções não serão ilusórias.Por outro lado, se insistimos que só esta convicção não é ilusória, teríamos de explicar o seu carácter de excepção. Se estamos convictos de que todas as nossas convicções são ilusórias, não é coerente estar convicto de que essa convicção em particular não é ilusória.» (Desidério Murcho, Filosofia em directo, pag 70, Fundação Francisco Manuel dos Santos; o negrito é posto por mim).

 

O idealismo material e o cepticismo não afirmam que todas as certezas são ilusórias: a ilusão é o carácter de quase todas, excepto o dogma base de que a realidade material é ilusória (idealismo) ou duvidosa (cepticismo). Desidério Murcho classifica de incoerência esta dualidade que, no fundo, é a dualidade observador-observado, máquina fotográfica/ fotos da paisagem. Não há nenhuma incoerência na doutrina idealista, ao nível racional: não há que explicar o carácter dogmático de excepção da tese «tenho a certeza de que toda a matéria e os entes dela formados são ilusão». É um axioma. Corresponde à divisão sujeito-objecto, que continua a existir no idealismo: o objecto material é aparência, o eu psico-espiritual é a realidade. O eu cognoscente é real para os idealistas, os entes materiais são ilusões, percepções corpóreas tridimensionais. Logo, não é possível aplicar os mesmos critérios de certeza e ilusão a estes dois níveis ontológicos.

 

A essência íntima das coisas é inexplicável: a explicação é sempre uma articulação de entidades em si mesmas incognoscíveis, no todo ou em parte. A pretensão de DM explicar tudo é anti filosófica: é um desvio logicista. Há mais mundo para além da lógica e da retórica. O inexprimível, o inefável, o alógico, existem. Há um intuir originário que está para além do "explicar", intuir esse que compreende mas não discursa, não explica. Lao Tse dizia: «Aquele que fala não sabe/ Aquele que sabe não fala.» Desidério raciocina mecanicamente na base do «8 ou 80», sem meio termo. Exige que, se há convicções ilusórias, todas as convicções sejam ilusórias - é a falácia da composição. O pensamento de Desidério é excessivamente linear, de superfície. Falta-lhe profundidade.

 

 

A CONFUSÃO SOBRE O QUE É VERDADE E SOBRE O QUE É CONHECIMENTO

 

Os equívocos de Desidério estendem-se às noções de verdade e conhecimento:

 

«Em suma, a verdade não é o mesmo que verificação ou confirmação. E também não é uma adequação entre o pensamento e a realidade, se por adequação entendermos uma cópia. A verdade é o que ocorre quando as nossas convicções representam correctamente a realidade. Nunca temos maneira de garantir a correcção da representação, mas nada se conclui daí excepto a nossa falibilidade. E o que torna as nossas representações verdadeiras ou falsas é a realidade.»(Desidério Murcho, Filosofia em directo, pag 94, Fundação Francisco Manuel dos Santos; o negrito é de minha autoria).

 

A verificação é o acto de encontro com a verdade. Portanto não é exacto dizer que verdade não é o mesmo que verificação: enquanto acto de descoberta (aletheia) a verdade coincide com a verificação, que é o abrir da verdade; enquanto objecto em si, interno ou externo, a verdade é diferente da verificação, do mesmo modo que actualização (passagem da potência ao acto) difere de acto. 

  Ademais, não é apenas a realidade que torna as nossas representações verdadeiras ou falsas: é também o aparelho interno cognoscente, isto é, os nossos orgãos dos sentidos e a nossa inteligência. Um cego não pode ver a relva verde que a realidade da paisagem diante de si lhe oferece.

 Sobre o conhecimento, escreve: 

 

«Quando confusamente se fala de conhecimento falso, o que está em causa é falar de algo que parece conhecimento, mas não é; e do mesmo modo que o dinheiro falso não é dinheiro, também o conhecimento falso não é conhecimento. Consequentemente, se a Terra não está imóvel, nunca se pôde saber que a Terra estava imóvel - apesar de muita gente ter tido a convicção de que sabia tal coisa.».»(Desidério Murcho, Filosofia em directo, pag 81, Fundação Francisco Manuel dos Santos).

 

Ao contrário do que afirma DM, dinheiro falso é dinheiro... sem validade legal. Certamente, no século XII, a generalidade das pessoas não conhecia, intelectual ou científicamente, que a Terra estava imóvel - conhecia, sensorialmente, a imobilidade da Terra - mas conhecia a teoria de que a Terra é imóvel. Mas hoje ninguém conhece factualmente que a Terra se move - para conhecer é preciso vê-la a mover-se. Hoje conhece-se, intelectualmente - um conhecimento indirecto, susceptível de dúvida - que a Terra gira em torno do seu eixo ao mesmo tempo que gira em volta do Sol. E nada impede que esta teoria seja falsificada, desmentida no futuro. Desidério Murcho fala como se a verdade nesta matéria estivesse conquistada de uma vez por todas. Não está.

Há, de facto, um conhecimento de verdades e de falsidades. O conhecimento não é apenas uma relação entre o sujeito e o objecto exterior, factivo ou factual. Não é apenas um conhecimento de verdades. É também uma relação entre a mente percepcionante e a representação (imagem sensorial, ideia, juízo) que nela se forma.

 

O conhecimento tem duas vertentes: a objectiva, isto é, a do referente ou objecto a conhecer; a subjectiva, isto é, a do símbolo, representação do objecto. O conhecimento do átomo ou dos quarks e leptões - exceptuando os átomos maiores, visíveis a microscópio - é a relação da mente com uma imagem conceptual nela elaborada. Parece que Desidério não questiona a existência de leptões. Ele respeita, venera a ciência instituída. Mas e se os leptões não existirem? Ser-se-á forçado a dizer que não havia conhecimento dos leptões, foi tudo uma fantasia. De facto, não se conheciam os leptões mas um conceito símbolo de tais supostas entidades.

 

É ERRADO O RACIOCÍNIO QUE SE AFASTA DO ÓBVIO?

DM escreve ainda:

 

«Erramos ao raciocinar sobretudo quando nos afastamos do óbvio e do simples. Quem não sabe raciocinar proficientemente, não vê o que há de errado com o raciocínio "Há uma causa de todas as coisas porque todas as coisas têm uma causa" , mas facilmente vê o erro do raciocínio "Há uma mãe de todas as pessoas porque todas as pessoas têm uma mãe". (Desidério Murcho, Filosofia em directo, pag 85, Fundação Francisco Manuel dos Santos; o negrito é posto por mim).

 

De facto, há vezes em que erramos no raciocínio ao afastarmo-nos do óbvio e do simples - por exemplo, é óbvio o raciocínio que diz´«Vacinar é infectar o sangue com vírus e toxinas, logo vacinar é mau para a saúde» . Mas há muitas outras vezes em que geramos um raciocínio profundo, ao afastar-nos daquilo que é óbvio ao senso comum. A teoria da relatividade de Einstein, contra o óbvio da teoria do espaço tridimensional feito de linhas rectas e planos, sustenta que o espaço é ondulatório, irregular, e encurva na proximidade de grandes massas.

ANDAMOS SÉCULOS A SUBSTITUIR O RACIOCÍNIO POR DEUS, PELA AUTORIDADE OU PELA OBSERVAÇÃO?

  

DM escreve ainda, como se tivesse descoberto o santo Graal da filosofia:

 

«O raciocínio está no centro da estrutura epistémica de seres falíveis. No entanto, a tentação ao longo dos séculos tem sido fingir que podemos abandonar o raciocínio paciente envolvido nos controlos e ajudas permanentes, substituindo-o por Deus, pela Autoridade ou pela Observação ou Experimentação. Mas não há fuga do raciocínio porque mesmo que Deus ou alguma autoridade nos fale, temos de raciocinar para concluir com base na observação ou na experimentação. E no raciocínio, como em tudo o resto, podemos cometer erros, porque somos falíveis.»(Desidério Murcho, Filosofia em directo, pag 84, Fundação Francisco Manuel dos Santos; o negrito é posto por mim).

 

Não faz sentido dizer que só o raciocínio está no centro da nossa estrutura epistémica. O centro do processo de conhecimento é triplo: raciocínio, intuição inteligível e intuição sensível. Que é o raciocínio sem a intuição inteligível? Um esqueleto descarnado. As intuições inteligíveis de números 3,7,8 e 18 é que permitem estruturar o seguinte raciocínio: « Se 3 adicionado de 7 perfaz 10, e dez adicionado de 8 dá 18, então 3 mais 7 mais 8 tem como resultado 18».

 

O raciocínio aristotélico «Há dois princípios, a forma e a matéria-prima, logo a combinação dos dois produz o composto, o ente individual» necessita previamente das intuições, inteligíveis ou sensíveis, de forma, matéria, composto, ente, indivíduo. O raciocínio sem as intuições ou conceitos que o musculam é vazio, é uma estrutura formal sem conteúdos. Há raciocínios metafísicos, antimetafísicos, etc, formalmente correctos que não conduzem necessáriamente à certeza. Porque esta só as intuições, sensíveis ou não, a fornecem. Ora o que DM faz é desprezar o papel fulcral da intuição inteligível (ideia, conceito) e  ignorar o carácter alógico desta.

 Quanto mais fala em raciocínio,menos DM raciocina!  Quanto mais brande a espada da lógica e do falibilismo, menos pensa!

 

 

A DISTINÇÃO SUBJECTIVO-OBJECTIVO NÃO EXISTE?  EXISTE, EM UM SENTIDO, NÃO EXISTE, EM OUTRO

 

DM sustenta ainda que subjectividade e objectividade não se distinguem, afirmando, com razão, que o que é subjectivo não é necessariamente errado ou incorrecto:

 

 «Tal como o consenso não implica a verdade, também a ausência de consenso não implica que o que está em causa é meramente subjectivo»(...)

 «A distinção entre objectividade e a subjectividade esconde geralmente uma confusão: pensar que da dificuldade de chegar a consenso se conclui que nenhuma convicção é genuinamente verdadeira, no mesmo sentido em que as verdades objectivas o são. ».»(Desidério Murcho, Filosofia em directo, pag 93-94, Fundação Francisco Manuel dos Santos; o negrito é posto por mim).

 

 Há uma certa nuvem de confusão nesta argumentação.Desidério Murcho não define com precisão o que entende por subjectivo, parece não se aperceber do desdobramento de sentidos deste termo. A distinção subjectivo e  objectivo não existe, de facto, quanto ao conteúdo substancial das nossas representações, isto é, objectivo e subjectivo não se distinguem epistemicamente - exemplo: eu posso estar perfeitamente certo, com toda a razão objectiva, ao defender, isolado, contra a «comunidade científica» que "a passagem de um planeta em 26º do signo de Sagitário causa, em regra, desaires para o PSD" - mas a distinção subjectivo-objectivo existe enquanto distinção numérica, por sim dizer, sociológica: o subjectivo é o pensamento singular, de um só indivíduo, o objectivo é o pensamento comum de muitos indivíduos.  

 

É POSSÍVEL PROVAR QUE DEUS NÃO É O FUNDAMENTO DO DEVER? ARBITRÁRIO OPÕE-SE A RAZOÁVEL?

 

DM desenvolve ainda o seguinte raciocínio sofístico contra a ideia de Deus como fundamento do dever: 

 

«Quem pensa que sem Deus, tudo seria permitido, considera que as nossas preferências não são suficientes para fundamentar o dever. Mas considera que as preferências de Deus o são. Interpretada literalmente, a ideia é implausível. Se a minha preferência, depois de passar pelo crivo do pensamento prudencial cuidadoso, não fundamenta o dever, a preferência de Deus ainda menos o poderia fazer. Se a minha preferência por beber água não me dá uma razão para beber água, a preferência de Deus não pode dar-me uma razão para a beber. Isto porque ou a preferência de Deus pela água é arbitrária, e nesse caso não me dá razão alguma para beber água precisamente por ser arbitrária, ou é razoável, e nesse caso é por ser razoável que me dá uma razão para beber água e não por ser uma preferência de Deus.» (Desidério Murcho, Filosofia em directo, pag. 44-45, Fundação Francisco Manuel dos Santos; o negrito é colocado por mim).

 

Neste estilo "light", saltando de ramo em ramo na árvore da retórica do "bem falar", se desenvolve a vazia argumentação de Desidério Murcho. Por que razão Deus ou deuses não poderiam fundamentar o dever? Não é implausível haver deuses, embora seja indemonstrável, empiricamente falando. A natureza biocósmica não nos revela que haja Deus ou deuses mas não nos proibe de pensar que existam. Por que razão a preferência de Deus por eu beber água não pode ser razoável? Por que razão a razoabilidade não pode brotar do próprio Deus? Em Hegel, a ideia absoluta ou Deus é absolutamente racional, razoável, apesar de inicialmente arbitrária, encarna em natureza e nas leis biocósmicas desta. Pode Desidério refutar Hegel, de modo inquestionável e vencedor? Não pode. Na metafísica pura, ateus, teístas, panteístas e panenteístas terçam armas, isto é, argumentos, sem que se possa descortinar, objectivamente, quem tem razão.

 

Arbitrário opõe-se sempre a razoável? Não. É outra confusão de Desidério Murcho. Eu posso conduzir arbitráriamente um automóvel sem destino fixo, dormindo aqui ou acolá, mas isso é razoável pois não ultrapasso a velocidade de 90 quilómetros por hora e levo os documentos, o dinheiro e a roupa suficiente para realizar essa viagem de uma ou várias semanas. A máxima de cada indivíduo é arbitrária, segundo Kant: depende do livre arbítrio de cada um. Mas o facto de ser arbitrária - por exemplo, a máxima: «Divulga a toda a gente as virtudes medicinais das tisanas de tília, hipericão, erva de são roberto, malva e outras» é arbitrária, escolhi-a mas outros escolherão outras máximas - não impede que seja razoável. Razoável, isto é, racional, prudente e experimentado, opõe-se a irrazoável, não a arbitrário.

 

 

www.filosofar.blogs.sapo.pt
f.limpo.queiroz@sapo.pt

 

© (Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)

 



publicado por Francisco Limpo Queiroz às 14:32
link do post | comentar | favorito

Terça-feira, 1 de Agosto de 2006
Conhecimento não implica justificação (ainda a prova 714 do Exame Nacional de Filosofia)

 

O grupo III do Exame Nacional de Filosofia 714, de Julho de 2006 em Portugal, é tributário da defnição hiperanalítica, errónea, do conhecimento como «crença verdadeira justificada».

Vejamos o texto e as questões iniciais do grupo III  desse Exame:

 

«Para sabermos alguma coisa, não basta adivinharmos, mesmo que acertemos, por maior que seja a confiança que depositemos no nosso palpite. Então, além da crença verdadeira, que mais é necessário para termos conhecimento? Não será ter provas? Isto é, para termos conhecimento, não será necessário estarmos ligados à verdade daquilo em que acreditamos por razões ou provas que temos para acreditar? E essas razões ou provas não terão de ser adequadas para justificarem a nossa crença?»

D.Kolak e R.Martin, Sabedoria sem Respostas: uma Breve Introdução à Filosofia, trad.port., Lisboa, Temas & Debates, 2004, p. 51 (adaptado)

1. Considere o texto.

1.1. Qual é a definição de conhecimento discutida no texto?

1.2. «Então, além da crença verdadeira, que mais é necessário para termos     conhecimento? pergunta o autor.

Responda a esta pergunta, apoiando a resposta em um ou mais exemplos

Nos critérios de correcção da questão 1.2 deste Exame figura o seguinte:

-Para haver conhecimento, além de termos crenças verdadeiras, temos de ser capazes de justificá-las.

-Podemos ter crenças verdadeiras sobre algo, sem conseguirmos justificar tais crenças: por exemplo, quando jogamos às cartas, podemos acreditar que nos vai sair o ás de trunfo e isso acontecer de facto.

-Nesse caso temos uma crença verdadeira, mas não sabemos realmente que nos vai sair o ás de trunfo. (Comentário nosso: A frase é um absurdo, pois se há uma crença verdadeira, que apreende o objecto (verdade), sabemos realmente que nos vai sair o ás de trunfo...)

- Porém, podemos saber que nos vai sair o ás de trunfo por termos viciado as cartas nesse sentido: neste caso, a nossa crença além de verdadeira, é justificada.»

 

CONHECIMENTO NÃO IMPLICA, OBRIGATORIAMENTE,  JUSTIFICAÇÃO, AO CONTRÁRIO DO QUE SUSTENTAM OS AUTORES DA PROVA

 

Para haver conhecimento não tem que haver, necessariamente, justificação. O conhecimento é um fluxo de intuições sensoriais e intelectuais que se afirmam por si mesmas, isto é, possuem a dose de dogmatismo indispensável para nos colocar na posse de certezas. Por exemplo, a percepção do sol, da côr azul do céu, do sabor de um beijo não implica conhecer teoria nenhuma científica (heliocentrismo, astrofísica em geral, biologia humana, etc) mas tão somente sentir: não precisam de justificação.

 

O conhecimento é a certeza. É o contacto entre o sujeito humano e um objecto material, ideal ou de outra natureza, intrínseco ou extrínseco ao sujeito. Essa é a definição correcta. A justificação - conjunto de inferências para fundamentar, estruturar e consolidar o conhecimento obtido por intuição - vem, em regra, depois das intuições cognoscentes. Essa justificação não é condição do conhecimento: é um conhecimento suplementar que se adiciona ao conhecimento originário, intuitivo, destituído de justificação.

Se algum estudante escrevesse na prova de Exame de Filosofia o que aqui escrevo, seria penalizado, segundo os critérios de correcção...

 

E no entanto, senhores inquisidores da «filosofia analítica», gente da Arte de (Não) Pensar, a Terra da definição de conhecimento move-se!  Não está imóvel frente ao sol da «crença verdadeira justificada» com que nos quereis queimar os neurónios pensantes, usando as insígnias dos vossos barretes cardinalícios de mestres ou doutorados! Há mais e melhores definições de conhecimento além da vossa...

conhecimento erróneo, ilusório e conhecimento verdadeiro, empírico, empírico-racional, racional ou supra-racional.

 

Os mentores ideológicos desta prova -  isto é os autores do manual de Filosofia do 11º ano A arte de pensar, da Didáctica Editora,  Aires Almeida, Célia Teixeira, Desidério Murcho, Paula Mateus, Pedro Galvão - não  atingiram, sequer, a margem do rio do conhecimento filosófico, que é uma corrente holística indivisível , perspectivada desde vários ângulos em redor: não percebem que escravizar alunos e professores à definição, dada em 1963 pelo  filósofo norte-amercano de segunda categoria Edmund Gettier (n. 1927),  de conhecimento como «crença verdadeira justificada» é uma ditadura antifilosófica de sectários, de gente incapaz de pensar com profundidade.

Ora os testes de Exame Nacional de Filosofia têm de ser muito bem concebidos, com grande amplitude de pensamento e sabedoria, o que, seguramente, não foi o caso.

 

 

f.limpo.queiroz@sapo.pt

(Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz

 

 



publicado por Francisco Limpo Queiroz às 12:41
link do post | comentar | favorito

Segunda-feira, 6 de Fevereiro de 2006
É a filosofia mais «a priori» do que a ciência? (Crítica de Manuais Escolares-III)

 

À primeira vista, a filosofia «é» mais «a priori» -isto é, anterior à experiência, isenta de experiência - do que a ciência.

Assim pensam alguns autores como os do Manual de Filosofia do 11º ano português A Arte de Pensar que, no texto seguinte, fornecem uma distinção confusa entre a filosofia e a ciência (o negrito é nosso):

 

«O perspectivismo fraco apoia-se na diversidade de actividades cognitivas, que estudam diferentes aspectos da realidade. Assim, por exemplo, a filosofia procura a verdade sobre problemas de carácter mais básico e mais geral, consistindo num estudo a priori, enquanto a ciência procura também a verdade, mas sobre problemas de carácter empírico ou formal. A natureza dos objectos da filosofia e da ciência é, portanto, diferente. Temos resultados diferentes mas esses resultados são acerca de diferentes objectos.»

 

(Aires Almeida, Célia Teixeira, Desidério Murcho, Paula Mateus, Pedro Galvão, A arte de pensar, manual de Filosofia do 11º ano, Didáctica Editora, pag. 222-223).

 

Salta à vista um primeiro equívoco neste texto: o conhecimento a priori opõe-se decerto a empírico mas não se opõe a formal, pelo contrário, inclui este. A filosofia, pela lógica que lhe é inerente, possui uma forte dimensão formal. E não é verdade que a filosofia se abstenha de buscar a verdade sobre problemas de carácter empírico e que estes sejam exclusivo da ciência, como o texto quer fazer crer. Os problemas da legitimidade do aborto voluntário, da censura na internet e na imprensa em geral, da dicotomia capitalismo/ comunismo,  da industrialização versus preservação ecológica, etc, são problemas empíricos e filosóficos. Sustentar que a filosofia consiste apenas num «estudo a priori» é truncá-la,  reduzi-la a uma gramática do pensamento.

 

O conhecimento a priori é o conhecimento obtido sem recurso directo ou indirecto à experiência sensorial. Em princípio, a sua fonte preexiste à vida biológica: as ideias inatas postuladas por Descartes - segundo este, ao nascer, já teríamos gravados na nossa mente as ideias de alma, Deus, corpo, números, figuras geométricas - são conhecimentos a priori

Podemos, no entanto, admitir que enquanto se vive, isto é, enquanto nos banhamos permanentemente no mundo empírico, na experiência sensorial, exista no nosso espírito um compartimento escuro, hermeticamente fechado à experiência, no qual se processa o conhecimento a priori ( exemplo: conceber um triângulo, conceber que à diversidade de determinações subjaz uma unidade essencial). Seguramente, Kant partilhava este ponto de vista.

 

Kant escreveu (o negrito é nosso):

 

«A matemática fornece o exemplo mais brilhante de uma razão pura que se estende com êxito por si mesma, sem o auxílio da experiência.» (Kant, Crítica da Razão Pura, Fundação Calouste Gulbenkian, pag. 581).

«Assim, construo um triângulo, apresentando o objecto correspondente a um conceito, seja pela simples imaginação na intuição pura, seja, de acordo com esta, sobre o papel, na intuição empírica, mas em ambos os casos completamente a priori, sem ter pedido o modelo a qualquer experiência» (Kant, ibid, pag 580).

«O conhecimento filosófico considera, pois, o particular apenas no geral, o conhecimento matemático, o geral no particular e mesmo no individual, mas a priori e por meio da razão, (...)»

«É nesta forma que consiste, por consequência, a diferença entre estes dois modos de conhecimentos racionais e não é sobre a diferença das matérias ou objectos que repousa.» (Kant, ibid, 580)

 

Kant postula que tanto a filosofia como a matemática são conhecimentos à priori.

A filosofia não é, a nosso ver, mais «a priori» do que a lógica e do que a matemática, ciências formais. Definir filosofia como «conhecimento a priori» é defini-la como lógica e como dialética mas não como epistemologia ( a filosofia pensa sobre as noções de átomo, vacina, infraestrutura e superestrutura, id, ego e super-ego, etc) , ética, estética, gnosiologia.

A filosofia é, em larguíssima media, conhecimento a posteriori, obtido com base na experiência sensorial, articulado com conhecimento a priori. O seu objecto é rigorosamente o mesmo que o da ciência: a «realidade», «a verdade objectiva». Diferem apenas no grau de dogmatismo e de positividade.

 

 

(Direitos de autor para Francisco Limpo de Faria Queiroz)



publicado por Francisco Limpo Queiroz às 12:49
link do post | comentar | ver comentários (4) | favorito

mais sobre mim
pesquisar
 
Janeiro 2024
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3
4
5
6

7
8
9
10
11
12
13

14
15
16
17
18
19
20

21
22
23
24
25
26
27

28
29
30
31


posts recentes

Pequenas reflexões de Ago...

Equívocos no manual da Sa...

Conhecimento não implica ...

Equívocos de Orlando Vito...

Incoerências de "Filosofi...

Conhecimento não implica ...

É a filosofia mais «a pri...

arquivos

Janeiro 2024

Dezembro 2023

Novembro 2023

Outubro 2023

Setembro 2023

Agosto 2023

Julho 2023

Junho 2023

Maio 2023

Abril 2023

Março 2023

Fevereiro 2023

Janeiro 2023

Dezembro 2022

Novembro 2022

Outubro 2022

Setembro 2022

Agosto 2022

Julho 2022

Junho 2022

Maio 2022

Abril 2022

Março 2022

Fevereiro 2022

Janeiro 2022

Dezembro 2021

Novembro 2021

Outubro 2021

Setembro 2021

Agosto 2021

Julho 2021

Junho 2021

Maio 2021

Abril 2021

Março 2021

Fevereiro 2021

Janeiro 2021

Dezembro 2020

Novembro 2020

Outubro 2020

Setembro 2020

Agosto 2020

Julho 2020

Junho 2020

Maio 2020

Abril 2020

Março 2020

Fevereiro 2020

Janeiro 2020

Dezembro 2019

Novembro 2019

Outubro 2019

Setembro 2019

Agosto 2019

Julho 2019

Junho 2019

Maio 2019

Abril 2019

Março 2019

Fevereiro 2019

Janeiro 2019

Dezembro 2018

Novembro 2018

Outubro 2018

Setembro 2018

Agosto 2018

Julho 2018

Junho 2018

Maio 2018

Abril 2018

Março 2018

Fevereiro 2018

Janeiro 2018

Dezembro 2017

Novembro 2017

Outubro 2017

Setembro 2017

Agosto 2017

Julho 2017

Junho 2017

Maio 2017

Abril 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

Setembro 2008

Julho 2008

Junho 2008

Maio 2008

Abril 2008

Março 2008

Fevereiro 2008

Janeiro 2008

Dezembro 2007

Novembro 2007

Outubro 2007

Setembro 2007

Agosto 2007

Julho 2007

Junho 2007

Maio 2007

Abril 2007

Março 2007

Fevereiro 2007

Janeiro 2007

Dezembro 2006

Novembro 2006

Setembro 2006

Agosto 2006

Julho 2006

Maio 2006

Abril 2006

Março 2006

Fevereiro 2006

tags

todas as tags

favoritos

Teste de filosofia do 11º...

Suicídios de pilotos de a...

David Icke: a sexualidade...

links
blogs SAPO
subscrever feeds